O consagrado jornalista esportivo Luiz Mendes compareceu a todas as Copas do Mundo entre 1950 a 2002, na função profissional de narrador e comentarista de rádio. Em entrevista concedida ao projeto Vozes do Rádio, do Departamento de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social - Famecos/PUCRS, em 16 de maio de 2011, Luiz Mendes comentou sobre os erros cometidos pelo técnico Flavio Costa na convocação de jogadores para Copa de 1950:
VOZES - O senhor também tem várias histórias da Copa de 50. Alguma coisa marcou o senhor, alguma história pitoresca para contar para a gente?
LUIZ MENDES - Pitoresco da Copa do Mundo de 1950 só mesmo as coisas que disseram depois que terminou a Copa, quando a população do Rio toda passou a dizer que os jogadores não se esforçaram, foram mercenários. Inventaram histórias das mais negativas possíveis. Isso foi pitoresco porque mostrou a tendência do torcedor: quando ganha, é o melhor do mundo, quando perde, é o pior do mundo, seja lá quem for.
Outra coisa que aconteceu comigo é que eu me dava muito com o Flávio Costa, o técnico. Ele cometia muitos erros, eu via que ele cometia, e todo mundo via. Por exemplo, havia um zagueiro chamado Juvenal. Quando formavam a seleção gaúcha, o titular da seleção gaúcha era o Nena, do Inter, e o reserva era o Clarel, do Grêmio. Esse Juvenal não era nem convocado. Aí levaram ele para o Flamengo e seis meses depois ele foi titular, e o Nena foi reserva dele. E do Clarel nem se lembraram. Houve um protecionismo muito grande. É do Flamengo, então joga. É do Inter, não joga, é reserva. E assim por diante.
Sempre chamavam o Tesourinha porque não havia ninguém melhor do que ele na ponta direita. E ele começou a treinar mal. Aí o Flávio me chamou: "Você que é amigo do Tesourinha, vê o que que ele tem. Ele está machucado e não quer dizer". E ele não queria dizer mesmo, porque não queria perder de jogar a Copa. E em 1949, no Sul-Americano que o Brasil ganhou no Rio, ele foi o melhor jogador brasileiro. Fizeram até uma grande injustiça com ele. Sofreu um pênalti e ele vinha disputando um prêmio de 150 mil cruzeiros com o Jair Rosa Pinto, e os dois tinham sete gols. Quem fosse o artilheiro ganhava esse prêmio. Ele sofreu o pênalti e se prontificou a bater, aí o Flávio Costa mandou a ordem para o Jair bater. E ele, que sofreu o pênalti e queria bater, deixou o Jair bater, porque não podia dizer não. Bateu o Jair, fez o gol e ganhou os 150 mil. Ele foi injustiçado. Bom, "Você que conhece tanto o Tesourinha, vê o que ele tem, ele está com algum problema". Aí eu fui no quarto dele, lá em cima na concentração que tem na estrada da Gávea e perguntei "Tesoura, o que é que você tem? Você não está jogando o que joga". E ele nem me olhava na cara, ficava meio de lado assim, mas a certa altura ele disse assim: "Tenho uma dor muito grande no joelho". Aí eu desci, chamei o doutor e disse que ele tinha uma dor muito violenta no joelho. Aí tiraram radiografia, estava com o menisco fraturado. Um mês antes da Copa, quinze dias antes. E o Flávio cometeu um dos seus erros. Ele tinha de ir a São Paulo pegar um ponta chamado Cláudio, que era do Corinthians, e era muito bom. Depois do Tesoura, era o melhor. Primeiro botou o Alfredo Segundo, que era lateral, de ponta-direita. Depois, não deu certo, e ele botou o Maneca, que era meia-armador do Vasco. Depois não deu certo e ele botou o Friaça, que era centroavante do São Paulo. E terminou com o Friaça como titular, nenhum deles era ponta.
E botou o Juvenal de titular. Não escalou o Nilton Santos, que já era disparado o melhor lateral-esquerdo do mundo, não só do Brasil, não. Ele não gostava do Botafogo, e o Nilton Santos era o símbolo do Botafogo nessa ocasião. Não deu uma vez a camisa ao Nilton Santos para ele jogar. E perdemos a Copa. Mas fora de qualquer dúvida, essas coisas são pitorescas, embora negativas. Um treinador botar o Bigode para jogar no lugar do Noronha e do Nilton Santos é brincadeira. Era brincadeira, porque essa já não se repete porque, fora o Nilton Santos, todos os jogadores já passaram dessa para a melhor. Dizem que é melhor, eu não sei.