No dia 28 de agosto, Alecsandro tinnha acabado de ser substituído por Ricardo Gomes no decorrer do clássico contra o Flamengo. Menos de cinco minutos depois de sentar no banco, olhou para o lado e viu o treinador começar a passar mal. Ao perceber a seriedade, travou e não soube o que fazer. Aos poucos foi voltando e tentou ajudar a chamar a ambulância para o campo. O AVC (acidente vascular cerebral) sofrido por Ricardo o afetou. Mas agora, pouco mais de um mês depois, o medo passou, e a esperança tomou conta. Tanto é que na última semana, Alecsandro visitou o comandante e perguntou como andava a recuperação dos movimentos do braço direito. Ao ouvir que a fisioterapia estava surtindo efeito, pediu para ele continuar firme os trabalhos com um único objetivo: levantar a taça de campeão brasileiro.
- Na visita ele me disse que estava firme na fisioterapia e eu falei: "Continua até o fim para você levantar a taça com a gente"! Esse é o nosso grande objetivo. Toda situação difícil como essa gera um tipo de emoção e um incentivo a mais. Sempre temos de ganhar, mas queremos cada vez mais isso porque levamos uma certa alegria para que ele volte feliz - afirmou.
Peça importante na conquista da Copa do Brasil, Alecsandro viu de casa a conquista da liderança do Vasco após uma lesão muscular que o deixou fora de sete partidas. Agora, ele vai reconstruir seu caminho entre os titulares no próximo domingo quando irá enfrentar o ex-clube Internacional no Beira-Rio. Sincero, considera sua saída de Porto Alegre precoce. Mas ao mesmo tempo, admite que a adaptação ao Vasco foi surpreendente e maravilhosa.
Em bate-papo exclusivo com o GLOBOESPORTE.COM em seu condomínio, o camisa 9 fala sobre os motivos que o fizeram aceitar o desafio no Rio de Janeiro, sobre o maior jejum de gols de sua carreira, comenta a relação com a torcida vascaína e revela o sonho de conquistar seu primeiro Brasileiro para igualar o pai Lela, campeão com o Coritiba em 1985, e o irmão Richarlyson, tricampeão em 2006, 2007 e 2008 com o São Paulo:
- Faria com que nossa família entrasse para a história!
Confira abaixo a íntegra do bate-papo:
Como vai ser voltar ao Beira-Rio para enfrentar seu ex-clube?
Foram dois anos e meio jogando lá e vivendo um momento especial com títulos do nível da Libertadores, disputa de um Mundial... Só tenho a agradecer. Fiz amigos, ganhei mais prestígio no mundo do futebol e até mais dinheiro, já que a premiação era boa com cada vitória importante. Vai ser uma emoção diferente voltar ao Beira-Rio. Mas por respeito ao Vasco tenho de ir lá e vencer.
Sua saída acabou sendo conturbada mesmo após uma história tão vitoriosa. Como foi este processo?
Primeiro deixo bem claro que saí de lá porque eu quis. Foi uma opção minha. Ninguém queria a minha saída, do presidente ao treinador. Já tinha recebido outras propostas, até mesmo do exterior, mas sempre me seguraram. No dia que assinei a rescisão, ainda recebi um telefonema do Fernando Carvalho (ex-presidente do Internacional) dizendo que se ele estivesse no clube iria me segurar de qualquer jeito. Eu mesmo concordo ao dizer que minha saída foi precoce. Eu queria ter ficado mais tempo. Foi uma história bonita, mais de 60 gols marcados, títulos... Mas depois do Mundial as coisas não correram como eu esperava. A torcida escolheu alguns jogadores como culpados pela derrota para o Mazembe, e eu estava entre eles. Aí resolvi tomar a decisão.
Achava que poderia manchar tudo que construiu?
Exatamente. O jogador precisa perceber o momento em que seu tempo no clube chegou ao fim para evitar jogar tudo fora. Tem gente aí que vai e deixa o clube pela porta dos fundos, e eu não queria isso. Ao mesmo tempo achei que isso poderia acontecer. Tem de ter coragem para fazer isso. Foi muito difícil, mas achei melhor.
E por que o Vasco? Na época da sua contratação, o clube estava em crise, e a aposta era extremamente arriscada.
Mas foi exatamente nisso que eu pensei. Era a hora de encarar um novo desafio. É muito fácil você chegar em um clube que está ganhando tudo. Aí, quando vem uma nova conquista você é só mais um. Quando você vence em um clube em crise, fica marcado na história. O Vasco é um clube de uma grandeza histórica, mas não vinha sendo respeitado como deveria. Até mesmo pelos adversários. Nos últimos anos, vir jogar contra o Vasco em São Januário não era encarado como um grande desafio. Agora a história é outra e eu faço parte dessa mudança. Poderia ter dado errado? Claro. As chances eram grandes até. Mas você coloca a coragem na frente do medo, e isso vira um combustível.
Esperava que a adaptação fosse acontecer de maneira tão rápida? Pouco tempo depois o clube estava reerguido e campeão da Copa do Brasil...
Sinceramente não esperava. Por isso mesmo assinei contrato de três anos. Se soubesse que teria sido assim, assinava por um ano só e depois renovava (risos). Mas poderia ter sido mais rápido até. Se ganhássemos do Flamengo nos pênaltis na final da Taça Rio, com certeza teríamos sido campeões do Carioca.
Além do clima, o que mudou desde a sua chegada ao clube?
Uma coisa mudou e me deixa orgulhoso: o sentimento da torcida. No fim do ano passado, vim passar férias aqui no Rio de Janeiro e praticamente não via camisas do Vasco na rua. Hoje é diferente. Em todo canto a gente vê um vascaíno. São Januário está lotando em todos os jogos. É legal demais ver essa mudança.
Você volta ao time titular com um jejum de sete gols sem marcar nas costas. Como está lidando com isso?
Nunca tinha passado por isso. Realmente é bastante tempo. Mas mantenho a calma. Um dos ídolos que eu tenho é o Ronaldo. E lembro que ele já amargou um jejum de nove jogos quando estava no auge. É coisa de momento e isso pode acontecer com qualquer um. Mas ao mesmo tempo que vivo isso hoje, há alguns meses marquei dois gols nos jogos da final da Copa do Brasil contra o Coritiba, algo que nunca tinha vivido na minha carreira.
Esses fatos geraram uma reação diferente da torcida. Parte sempre esteve ao seu lado, mas ao mesmo tempo uma parcela pedia sua saída nos últimos jogos para a entrada do Elton. Como você analisa sua relação com os vascaínos?
A verdade é que torcedor é sempre difícil. É algo que acontece em todos os clubes. Sempre vai ter uma parte chata que xinga tudo e todos, que nunca está contente com nada e que só quer reclamar. Mas estes torcedores não tiram o brilho de quem sempre apoia e faz a festa bonita. Esse é o verdadeiro torcedor. Se eu pudesse, colocaria essa parcela chata lá no último andar do Engenhão onde ninguém escutaria. Vi uma declaração da Ivete Sangalo dizendo que a maior conquista dela é quando um fã vem beijá-la e chora. Se eu pudesse escolher gostaria apenas desses torcedores. Mas sei que não é assim. O que me deixa tranquilo é que o mesmo torcedor que xinga quando perco um gol é o que aplaude quando eu faço no outro jogo.
Acha que vai ter de reconquistar a torcida agora que está de volta?
Não vejo assim. Se fosse goleiro seria algo diferente. Mas para o atacante basta marcar um gol que tudo volta ao normal. O torcedor não entende de tática. Não sabe que quando você não marca pode estar ajudando o restante do time com uma movimentação. Mas falo uma verdade também: o torcedor não precisa entender isso. Sou a favor das cobranças e estou pronto para elas. Da mesma maneira que estou pronto para marcar caso tenha a oportunidade.
Em meio a tudo isso, o Vasco passou por um grande baque que foi o AVC do Ricardo Gomes. Você estava no banco bem perto. Como foi vivenciar todo aquele medo?
Tinha acabado de ser substituído e já estranhei quando vi o Ricardo vindo para o banco. Aí começou uma movimentação de celulares e ligações. Na hora ainda achei que ele estivesse trocando informações com o Cristóvão. Só que começaram a chegar os médicos, os massagistas, e percebi que era grave. E eu sabia do primeiro episódio na época do São Paulo porque meu irmão jogava lá. Aí vi o lado direito já paralisado e fiquei sem reação. Travei. Depois só ajudei a chamar a ambulância e comecei a rezar. Foi algo difícil, que poderia acontecer com qualquer um, mas que eu não quero nunca mais viver algo parecido.
O drama acabou servindo de incentivo?
Toda situação como essa gera um tipo de emoção. Não vamos vencer todas por isso, mas é claro que queremos homenageá-lo. E sabemos que as vitórias o deixam feliz. Então é isso que queremos.
Como o time recebeu a efetivação do Cristóvão Borges no comando?
A gente vê o Cristóvão, mas é como se a gente tivesse vendo o próprio Ricardo. A diferença é que um é preto e o outro é branco (risos). Como os dois trabalham juntos há muito tempo, a tranquilidade é a mesma. Em um momento como esse, o melhor é falar pouco e trabalhar muito de maneira simples. O Ricardo fazia isso, e o Cristóvão está fazendo. E ele merece o sucesso. Já falei isso para ele pessoalmente, e agora faço de maneira pública. Ele merece os parabéns. Conheço o Cristóvão há 10 anos e sei que ele é aquele auxiliar que nunca quis ser treinador. Já trabalhei com gente que até torcia contra o próprio técnico. No momento do drama, demos essa força para ele continuar. Mas a gente percebeu que ele só foi acordar na quarta rodada (risos). O susto foi grande, mas a experiência tem sido tão boa que agora pode até querer seguir uma carreira.
O título brasileiro bateu na trave para você com o Internacional em 2009. Agora você tem nova chance concreta de conquistar a competição e igualar seu pai e seu irmão. Já parou para pensar nisso?
Acho que entraria para a história, não é? Não me lembro de outras famílias com três membros campeões de títulos nacionais. Em 2009 fui vice e fiquei com o gostinho na boca. Uma oportunidade como essa faz o coração bater forte e nos dá ainda mais incentivo. Quem sabe a conquista não vem e eu ajudo a eternizar o nome da família Felisbino?
Fonte: GloboEsporte.com