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Marcos, goleiro do Palmeiras, diz que torce para o Vasco no Rio


Domingo, 26/06/2011 - 01:02

Marcão, goleiro do Palmeiras e pentacampeão, vai parar. Ele, que não quer se arrastar em campo, diz que este ano está bipolar. Tem dias que gosta da ideia da aposentadoria, mas também tem horas que se sente angustiado. Isso porque nunca teve um plano B, só queria ser goleiro do Palmeiras, o time do coração e pelo qual a mãe é fanática. Bem-humorado, o goleiro, ídolo até de torcidas rivais, comentou sobre a última temporada, momentos marcantes e o porquê não aceitou convite para atuar no exterior. O que ele vai fazer depois? Engordar muito e, claro, continuar no futebol.

Vai parar mesmo?

Em dezembro. Faço treinos diferentes e apenas um por dia. É para não forçar demais o joelho. Não adianta forçar no treinamento e ficar fora do jogo. Treinei hoje (dia 9), no frio e na chuva, e o joelho ficou estalando.

Pode parar antes?

Quero me acostumar com o fato de que vou ter de largar a única coisa que sei fazer. Sou apegado e procuro aproveitar os últimos treinos, jogar o número máximo de partidas. Mas sem colocar o time em risco se eu não tiver condições. Difícil jogar todo o Campeonato Brasileiro.

O que passa na cabeça?

Meu humor está mudando muito. Estou bipolar (risos). Em dias frios, como o de hoje, que tenho de cair no chão molhado, penso "graças a Deus que não farei mais isso". Ao mesmo tempo, faz 19 anos que jogo futebol e vou ter de mudar de profissão. O que quer que eu faça não vai chegar aos pés do futebol. É uma mistura de sentimentos. Fico tenso, melancólico, triste, feliz.

Já começou a chorar?

Ainda não, mas estou preocupado. Eu me saí bem no futebol, consegui meus objetivos e para continuar no esporte estou velho. Eu me questiono sobre o que vou fazer e se serei bom, me cobro muito.

E quem segura a sua onda?

Todo mundo acha que tenho condições de jogar mais. Mãe, mulher, cunhado, ainda mais quando vou bem numa partida. Daí escuto: "Pô, dá para jogar mais um ano". Mas tem mais de 70 partidas num ano! Treinei muito para conquistar meus objetivos e me machuquei muito por não ter limite. As dores incomodam e vou me irritando com coisas do tipo, atuar num campo duro. Dói tudo. Também sei que não estou 100%. Fico com receio que isso me prejudique no jogo. Olha: quero parar por cima. Aqui no Brasil a gente sabe que não é primeira impressão que fica e sim, a última. Não quero parar como um cara que se arrastou pelo campo.

O que achou da despedida do Ronaldo? Ele se arrastou?

Achei legal, digna para quem foi. Toda vez que um grande jogador para como ele ou como o Romário, por exemplo, ficamos tristes, né? Todo mundo gosta de um cara que joga bem, mesmo que seja no time adversário. E entendo o Ronaldo, que já tinha deixado de treinar. Já está com a vida estabilizada, tem projetos. Fiquei triste porque convivi com ele na Copa do Mundo (2002) e ele era fantástico. Gostaria de vê-lo mais tempo em campo.

Lembrou que sua hora está aí? Quer uma despedida da seleção também?

Ah sim! Já passou quando o Washington, o Coração Valente, se aposentou. Vi a coletiva dele no Fluminense e pensei: "Vixe, ano que vem sou eu!". Esta hora chega para todo mundo. Mas não tenho o mesmo moral que o Ronaldo. Só joguei 29 vezes pela seleção. Tive poucas convocações e também fiquei muito no banco. Titular mesmo, só na Copa (2002). Agora, se tivesse a conta bancária do Ronaldo, eu me aposentaria antes (risos).

É verdade que Felipão disse que não queria nem saber quem eram os goleiros, que você seria o titular dele em 2002?

Verdade... A seleção estava passando por um momento difícil e... não quero que pareça que estou reclamando, que acho que sou perseguido. Mas no Palmeiras você tem de provar que é muito, muito, mas muito melhor que alguém para ser convocado. E quando o Felipão assumiu a seleção, que quase ficou fora da Copa, sabia do meu potencial porque tínhamos trabalhado juntos no Palmeiras. Isso me ajudou porque o Dida e o Ceni estavam em fases brilhantes. A disputa era acirrada e joguei a Copa com esta cobrança.

O Rogério Ceni já disse que não teve a sorte de trabalhar com um técnico na seleção que tivesse sido seu treinador em clube...

Acho que o Ceni teve pouca chance na seleção. E eu também! Mesmo com o Palmeiras na Segunda Divisão (2003), tinha acabado de ser campeão mundial. Pensei: "pô, vou ficar pelo menos mais um ano de titular, um ano de crédito." Aí o Felipão saiu e entrou o Parreira. Joguei uma vez e fui para o banco. O Dida ficou como titular. Pô, tinha sido campeão do mundo. É que goleiro é cargo de confiança. Então, minha sorte foi o Felipão ter assumido a seleção. E meu azar, o Felipão ter saído. O Zetti, um baita goleiro, também não teve chance com o Taffarel. Já o Júlio César pegou uma boa fase, sem concorrente à altura.

Qual destes é excepcional?

São fases. Hoje, o Victor (Grêmio) e o Fábio (Cruzeiro) estão bem. Este negócio de "o melhor de todos os tempos" é a maior besteira do mundo. Só o Pelé, que é Pelé.

Como começou sua amizade com o Felipão?

Talvez eu tenha aprendido a conviver com ele mais rápido, quando chegou ao Palmeiras (1997). Nunca abusei do moral em nenhuma situação. Mesmo quando estava bem e ouvi cobras e lagartos do Felipão, abaixei a cabeça, escutei e fui treinar. Ele era o técnico! Se elogiou, agradeci. Sei o meu lugar. E ele sempre soube que podia confiar em mim porque jamais iria apunhalá-lo pelas costas. Posso não concordar com escalações, mas a tarefa é dele. Mas também, sou amigo dele assim... Nunca fui jantar na casa do Felipão nem ele na minha. É uma amizade de cumplicidade. Não gosto de misturar as coisas. Quer fazer marketing? Jogue bem!

Você se despede em ano em que o Palmeiras joga fora de seu estádio (em reforma). Mas com o Felipão...

No futebol, você não chega longe se as pessoas não te ajudarem. O Luxemburgo foi quem me deu a primeira oportunidade. O Zagallo me convocou para a seleção pela primeira vez. O Felipão, quando chegou ao Palmeiras, me colocou nos aspirantes, pois estava acima do peso. Ele gostava de mim e eu estava bem, daí pensei: "gaúcho desgraçado, quer me ferrar". No futebol é assim, sempre alguém quer te ferrar, nunca é você se ferrando sozinho. Não falei nada. Levei a sério os aspirantes e fui abaixando o peso. O Velloso se machucou (1997) e ele me chamou. Não me ferrou, me ajudou. É o que se faz com um filho.

Qual a maior qualidade dele?

Honestidade. Fala na cara. A gente toma dura no treino (risos), ele xinga, fala palavrão, arregaça com a gente, mas depois, no vestiário, já está brincando, não mistura as coisas. Trabalho é trabalho.

Goleiro troca muita camisa?

Sempre toquei, em todas as partidas. Não consigo levar para casa. Até porque não sei falar não... Algo como "já prometi esta". E na seleção também troquei muito. Inclusive com brasileiros, Ronaldinho, Ronaldo, Cafu... Da seleção de 2002, tenho o time completo.

Neste Brasileirão, a procura pela sua camisa aumentou? A da estreia ficou com o Maicosuel (Botafogo), que disse que era "a camisa de um campeão mundial"...

(risos). Aumentou! Já tem jogos para frente que os caras me ligaram para deixar reservada! Lúcio (Grêmio) é um deles. Dizem que querem a camisa do ano de despedida.

Onde guarda a coleção?

Em malas. Às vezes, quando um muito rival vai jogar uma final, saco a camisa do adversário e visto em casa (risos).

Tem camisas corintianas?

Várias! E ainda por cima tenho de arrumar para amigos que são corintianos e que me pedem. Toda vez, contra o Corinthians, o Andrés Sanchez me dá várias para distribuir.

De quem quer a camisa? Tem a do Neymar?

Putz! Não tenho nem do Neymar nem do Ganso. Está aí. Mas fico meio assim de sair correndo atrás dos caras para trocar a camisa. E também, se trocar com qualquer um tá bom, porque neste Santos todo mundo joga demais! O único cara que corri atrás mesmo foi o Jorge Campos, da seleção do México, numa Copa das Confederações (1999). Ele jogava com umas camisas incrementadas.

Sempre foi Palmeiras?

Fui influenciado. Meu pai, meu irmão mais velho e minha irmã mais velha são corintianos. Mas minha mãe e meu irmão acima de mim, palmeirenses. Torcia para o Guarani e meu irmão falou assim: "O Palmeiras é maior e é verde também!" Quando cheguei ao Palmeiras e vi o Velloso, quase desmaiei. Você não imagina como era difícil na minha cidade (Oriente, no interior de São Paulo), arrumar uma camisa do Velloso, quanto mais treinar com ele. Sempre torci pelo Palmeiras! Não se joga na Coca Cola e torce para o Guaraná Antarctica.

Tem vários!

Hoje tem, mas digo assim: se você é palmeirense e joga no Corinthians, tem de torcer pelo Corinthians. Graças a Deus eu sou palmeirense e jogo no Palmeiras, sempre joguei no Palmeiras e vou me aposentar no Palmeiras.

Quando chegou no clube, foi o Sérgio que te acolheu?

Foi um dos caras mais importantes da minha carreira. Me ajudou a não desistir. Eu morava no alojamento e quando estava frio, congelava. Quando era calor, os mosquitos mordiam. Pensava: "isso é vida?" Tinha horário para comer e se chegasse tarde, do treino em Pirituba, não tinha mais comida. Passava apertado e era bobão. Minha cidade tem cerca de cinco mil habitantes. Cheguei a São Paulo e fiquei três meses para ir ao shopping porque achava que tinha de pagar entrada (risos). O Sérgio me convidou para morar na casa dele quando estava em lua de mel (risos). Estou com um primo na mesma situação. Veio fazer teste e se passar vou arrumar um lugar legal para ele ficar.

Você só defendeu o Palmeiras por 15 anos. Mas teve a oportunidade de jogar no exterior, logo após o título mundial. No entanto, continuou no Palmeiras, rebaixado. Por quê?

A fase da Série B foi horrível pela pressão. Chegava para disputar um jogo na cidade, seja ela qual fosse, e parecia que era o Michael Jackson. Olha, é fácil falar te amo! Esta foi a oportunidade para eu provar (beija o escudo do time). Quando veio a proposta do Arsenal, optei pelo meu salário que era R$ 80 mil. Sei que é ótimo para os padrões brasileiros, mas era campeão do mundo! Hoje, qualquer um ganha R$ 200 mil. Ficava pensando em casa que, se eu não me adaptasse, poderia rescindir o contrato e voltar. Mas achava pilantragem. E tinha a coisa de largar o Palmeiras na hora que mais precisava. Esse momento me deu mais moral com a torcida do que se pegasse 50 penaltis do Marcelinho Carioca.

Lembra-se de algo engraçado?

Em Garanhuns, jogamos num campo que tinha cabrito. E antes da viagem vi a foto do lugar e falei que não poderíamos jogar num pasto. Era um jogo importante, contra o Sport. Quando cheguei na cidade tinha uma faixa assim: "aqui pode ser pasto mas a vaca da sua mãe não come aqui!" Fui aquecer perto do público e chovia tijolo! Para a torcida, a Série B foi péssima, mas para quem jogou foi motivo de orgulho.

Quando jogava num campo assim pensava no Arsenal?

Depois que decidi ficar, virei a página. Até hoje, não me arrependo. Além do dinheiro e de gostar do que se faz, você tem de ter raiz num lugar, para você ser lembrado. Não dá para jogar seis meses no Flamengo, um ano no Fluminense, três no Vasco... A hora que parar, vão falar: "É o Zezinho, lateral-esquerdo que jogou no Fluminense". E outro vai dizer: "Pô, não me lembro..."

Tem medo de ser esquecido?

Para mim este não é um problema. É difícil parar porque sou goleiro! Quero ser goleiro e só sei ser goleiro. É verdade quando dizem que o jogador morre duas vezes (a primeira na aposentadoria).

Você é querido por torcedores de outros clubes...

De vários. Muitas vezes dou autógrafo em camisa do São Paulo, do Corinthians, do Flamengo. É engraçado. Vou lá e meto a caneta, na boa!

Tem algum clube, de outro estado, pode ser do Rio, que gostaria de ter defendido?

Nunca pensei nisso. Mas no Rio sou Vasco. Também curto o Coritiba, no Paraná, apesar dos 6 a 0 (risos) na Copa do Brasil. Já tive proposta para ir para o Corinthians, mas não dava. Teria de comprar um caveirão para jogar lá. Sou muito identificado com o Palmeiras. Acho que hoje os jogadores ficam com medo de não acumular fortuna, sabem de histórias de caras que perderam tudo.

E por que se repetem? Gastam com carrão, joia, na noite?

(risos) Porque é jogador de futebol. E para isso não precisa ter estudado. Quando se ganha muito dinheiro, pira mesmo. Quer tudo. Eu estudei até o segundo colegial. Minha mãe me moía se não passasse de ano... E olha que pulei muito o muro da escola. Admito que tenho até uma invejinha destes caras (risos). Desmanchei com a minha namorada de seis anos e já comecei a namorar a minha atual mulher. Estamos juntos há 12. Fui calouro, hein! Não aproveitei as baladas (risos). É que sempre achei que centroavante e goleiro são profissões. O resto, posições. Se não fizer gol (atacante) e se não fechar o gol (goleiro) está ferrado. Sempre fui caxias e não tinha plano B. Tinha de ser um ótimo goleiro. Você acha que gosto de ligar a TV e ver todo mundo metendo o pau em mim?

E a história do cafezinho?

Qual a diferença de tomar energético, água ou café (risos)? Contra o The Strongest, da Bolívia, estava um frio desgraçado, a bola não vinha no gol. O Palmeiras pressionava. Aí pedi para o roupeiro pegar um cafezinho. Tampei o copo mas uma imagem da TV pegou a fumacinha. Os adversários ficaram putos porque eu estava tranquilão. No jogo de volta, os bolivianos queriam me matar. Nos gols, os caras sentavam na minha cara e faziam o gesto com a mão, como se estivessem tomando café. A torcida gritava: "Uh, cafezinho, uh cafezinho". Acredita que depois de três anos, com a seleção, voltei lá e os caras gritaram de novo?

A conquista da Libertadores em 1999, quando surgiu o apelido de São Marcos, foi o título mais importante no clube?

Para mim foi o da Série B, de 2003. Pela pressão, pelo período, pelo significado. Na Libertadores, era coadjuvante, tinha Paulo Nunes, Zinho, Júnior Baiano, César Sampaio, Arce... Um baita time. Na Série B, eu era "o cara", o mais cobrado.

E a fase mais difícil?

2007 foi a pior. Quebrei o braço três vezes no ano. Fiquei oito meses do ano engessado. Fazia fisioterapia e quando treinava, numa pancada, quebrava de novo. Achei que já tinha osteoporose (risos).

Conseguiu ganhar dinheiro? Investiu bem?

Consegui. Penso em dinheiro dentro dos meus padrões, do que vivo. Mas se comprar com o que vejo por aí, não. Mas também não sou um cara que ando com carro de R$ 500 mil, que usa correntão de ouro, relógio de R$ 30 mil. Não gosto e estaria ferrado. Vou parar ano que vem e em dezembro de 2012 já estaria sem nada (risos). Também não dou cartão de crédito para minha esposa (risos). Dou um dinheirinho e falo: "se acabar, acabou hein!" Ela diz que sou mão de vaca. Investi pouco também. Meu perfil no banco é conservador. Mas aumentei a propriedade da família (de 9 hectares para 900 hectares).

Você é certinho?

Sou nada (risos)... Já tive minhas épocas! Saía muito. Mas a fama atrapalha. Os torcedores pegam no pé. Se saia na quinta, depois de uma derrota na quarta... Nossa, um desrespeito. Então, comprei uma cobertura e faço churrasco lá. Ninguém vê, posso beber minha cerveja. O negócio é cumprir as obrigações. Claro que ninguém é santo. Mas também não me envolvo em confusão. Não vou sair sem minha mulher, né? Ainda mais agora que vou me aposentar. Imagina me separar e perder 50%? (risos).

O que fará logo de cara?

Eu me acostumei com as limitações. Não sinto falta, sabe? Mas tem duas coisas que vou fazer já a partir do primeiro dia de aposentado: não vou mais acordar antes do meio dia nem cumprir horários rígidos. Ah! E quero ficar muito gordo! Mas depois da despedida, hein! (risos). Não aguento mais comer frango com purê de batata. Agora, aposentado, imagina a mesa de jantar do Ronaldo? Ele tem bem mais dinheiro (risos). Também vou aproveitar mais a companhia dos amigos e da família.

E profissionalmente?

Tenho contrato com o Palmeiras por mais três anos quando parar. Sem cargo definido. É bom porque vou continuar no meio, vendo meus amigos. Mas não levo jeito para ser cartola, presidente. Também não quero mexer com dinheiro, contratação. Preparador de goleiros também acho que não vai rolar porque o Palmeiras tem um dos melhores do mundo... Sobrou... Bom, também não vou pintar o campo. Tenho certeza que temos um cara que pinta melhor do que eu (risos).

Você é um cara que fala mesmo, sem dó... Te ajudaria nessa fase?

Ou não. Acho que pegam no meu pé com esta coisa das declarações polêmicas. Normalmente analiso um jogo, não fico falando de coisas para frente. E, se perdemos de 6 a 0 para o Coritiba, não sei chegar na beira do campo e falar: "infelizmente, tivemos uma noite infeliiiiiz, mas vamos levantar a cabeeeeça e na próxima partida teremos tudo para somar três pontos (tom de texto decorado, típico dos boleiros)." Pô, o time jogou mal, tomou seis e como pode achar alguma coisa boa nisso? Fico mordido quando a gente perde... Minha mãe é tão palmeirense, tão palmeirense que na derrota ela fica ferrada. Daí, sento a lenha nestes vagabundos e sei que ela, ao menos, vai falar: "Aê filhão!"

Fonte: Extra online