Tamanho da letra:
Com a tranquilidade de Ricardo Gomes, Vasco joga para ser 1º do grupo
Domingo, 17/04/2011 - 12:20
De Paris, Ricardo Gomes trouxe a fluência no francês. De Bordeaux, o gosto pelo vinho. De Portugal, a consciência tática europeia em sua primeira passagem no exterior. Mas é do bairro da Muda, na Zona Norte, que ele traz desde a infância a personalidade tranquila com a qual deu novo rumo ao Vasco, que tenta neste domingo contra o Olaria, às 16h, no Moacyrzão, em Macaé, garantir a liderança do Grupo A da Taça Rio e chegar a dez jogos de invencibilidade.
A fala pausada, a expressão circunspecta e o tom de voz incapaz de alterações exageradas em qualquer circunstância à beira ou fora de campo chamam atenção de quem tem o primeiro contato com ele. Características, no entanto, presentes desde os tempos de garoto na Escola Municipal Friedenreich, que ficava entre o Maracanã e o ginásio do Maracanãzinho. Estripulias do menino, que sempre teve boas notas e destaque na escola, somente nas tentativas de pular o muro para jogar no gramado do então maior do mundo.
O sonho da criança não se realizou na época por causa da altura do muro. Mas o desejo de menino, que trocava as aulas de matemática pelas peladas de futsal no ginásio da escola primária, concretizou-se. Entre tantos colegas que tinham o mesmo sonho e com a serenidade de sempre e um bom futebol, é claro, Ricardo Gomes conseguiu a chance no Fluminense, depois de rodar clubes da região no futsal, como o Vila Isabel e o Grajaú. Apesar de se considerar apenas um zagueiro mediano, que teve muita sorte na vida:
- Melhor só se eu jogasse mais bola. Com a bola que eu jogava, tirei o máximo. Fui um zagueiro bom, mas nada demais.
Sorte ou competência, ou os dois, foi pelo tricolor que pisou pela primeira vez no gramado do Maracanã e conquistou o primeiro título: o Carioca de 83. Quem conviveu com o adolescente de 17 anos, recém-subido dos juniores, garante que nada modificava o semblante calmo do zagueiro.
- Ele e o Branco eram os moleques da base. O Ricardo com o jeitão caladão, mas sempre solícito. O Branco era o oposto, largadão, brincalhão. A gente treinava contra os juniores e via que ele sobressaía pela postura em campo. E foi assim no profissional - lembra o goleiro Paulo Victor, companheiro do zagueiro no Flu campeão dos anos 80, ressaltando que a calma não significa falta de comando. - Ele fala pouco, mas tem personalidade forte. Não precisa gritar com as pessoas, basta um olhar, e consegue se comunicar bem com os outros.
Longe dos arredores tijucanos onde foi criado, Ricardo Gomes seguiu o caminho do mundo do futebol no Rio: a Barra da Tijuca, garantia de mais privacidade. O que não foi motivo para afastá-lo das raízes da Zona Norte, na qual ficou parte da família e dos amigos, nem mesmo nas suas voltas pelo mundo e pelo Brasil. Agora, os laços estreitos com a região se revigoram nas dependências de São Januário, local em que antes entrava apenas como adversário.
- O clube não é novidade para mim. Joguei muito no ginásio e no estádio pelo Fluminense - disse o treinador em sua chegada ao Vasco.
Falta um grande título
Aonde quer que vá, a vida pacata é mantida, assim como o padrão de jogo que já conseguiu dar ao Vasco após 13 partidas no comando. Casado com Cláudia há 26 anos (conheceram-se na época do Colégio Pedro II, na Tijuca, de onde saíram pouco antes da sua ida para Portugal) e pai de dois filhos, Ricardo não abre mão de resguardar sua vida pessoal.
Quando o assunto é futebol ou vinho, fala com a propriedade de quem rodou o mundo em grandes clubes de Portugal e França e conheceu bem seus vinhedos. Como jogador ganhou o reconhecimento de ter sido um dos grandes zagueiros do Brasil, mesmo tendo tido a infelicidade de se contundir às vésperas da Copa de 94. Como técnico, reconhece que falta um grande título no Brasil. No currículo em casa, apenas uma Copa do Nordeste pelo Vitória.
Seja nas vias francesas, onde ganhou o apelido de "Monsieur", ou nas ruas da Zona Norte, conhecido apenas como Ricardo, o treinador não muda a postura que pode levar o Vasco a um título depois de oito anos. Levantar a voz só para gritar é campeão.
Fonte: Globo Online