Tamanho da letra:
|

Há 80 anos, Russinho inaugurava o marketing no futebol


Quinta-feira, 28/10/2010 - 11:10

1930. Russinho, centroavante do Vasco e titular da seleção brasileira, era eleito o craque Veado, o feito destacado pelas páginas de esportes dos principais jornais do país. Russinho, o louro franzino, esguio e veloz que intimidava os goleiros adversários conquistara o concurso da Grande Manufatura de Fumos e Cigarros Veado, concorrente da Souza Cruz e da Leite & Alves, então os maiores fabricantes de cigarros do pais. Promoção de vendas de grande sucesso, através de um cupom impresso no verso do maço do produto que deveria ser preenchido pelos torcedores, indicando o melhor jogador de futebol da temporada. Tamanho era o entusiasmo das torcidas que mesmo quem não fumava adquiria o produto e jogava o conteúdo fora. Russinho, segundo publicou a revista O Malho na época - tenho minhas dúvidas nessa conta - teria obtido três milhões de votos.

Relembro essa promoção que rendeu ao jogador o prêmio de um carro conversível da Chrysler, a propósito dos 70 anos de vida do Rei Pelé, transcorridos semana passada, e antes de entrar no assunto objeto deste artigo lembrar não uma promoção, mas o impacto sobre a torcida do lançamento pela Lacta, final da década de 30, do chocolate Diamante Negro, o nome calcado no prestígio de Leônidas da Silva, o craque consagrado na Copa da França em 1938. Raymond Thourmagem, da revista Paris Match, entusiasmado com as bicicletas de Leônidas deu-lhe o apelido que a imprensa mundial repercutiu e a Lacta licenciou mediante o pagamento de dois contos de réis. Dinheiro que dava para comprar um carro usado, a julgar pelos anúncios de carro novo da época, que podia ser adquirido a partir de três contos de réis.

Mencionei aqui duas bem- sucedidas ações de marketing da década de 30 em torno de craques de futebol apenas para comparar com as ações de licenciamento de imagem do Pelé que, nesse quesito, me parece mal assessorado, perdeu a majestade. Do ponto de vista do marketing, o Rei Pelé não sugere nem mesmo um príncipe, mas um jogador comum, e comum demais, que vulgarizou a sua imagem, com aparições na TV e nas revistas, promovendo produtos de segunda linha, alguns deles de imagem controvertida, os Vitasays da vida para não entrar no mérito. Ainda garoto, já consagrado como o melhor jogador do mundo, Pelé anunciava produtos de melhor qualidade do que aqueles que viria anunciar a partir dos anos 70. Produtos como o Biotônico Fontoura e as bicicletas Monark.

Mas sua imagem, é bom lembrar, já esteve vinculada em produtos do tipo Café Pelé, Empire, Colorado, Bolas Pelé, Confecções Carmelo, Chocolates Dulcora, Mirador e até o rótulo da caninha Pelé (justiça seja feita, ele recuou do contrato quando o produto já estava nos supermercados), sem falar em produtos e serviços regionais de marcas inexpressivas não condizentes com a áurea de um Rei. Não posso deixar de citar o patético comercial gravado pelo craque na década de 80 para a Francisco Xavier Imóveis: um roteiro machista que mostra o jogador recebendo um presente de natal, dentro da caixa tem uma linda mulher: a Xuxa, então a sua namorada.

A áurea de Rei sugeria roteiros mais adequados a sua imagem. Numa escala mundial. Do tipo telefonia móbile, grandes marcas de refrigerantes, cartões de crédito, automóveis, as grandes marcas esportivas, McDonald's... ícones do consumo em todo o planeta. Melhor do que ficar fazendo cara de trouxa na TV para recomendar aos brasileiros um produto contra a disfunção erétil.

Fonte: Coluna Nelson Cadena - Correio da Bahia