Jorginho comenta esquema tático de sucesso no Bayern de Guardiola

Ousadia e modernidade não remetem, necessariamente, a invenção ou ineditismo. No Bayern de Munique de Guardiola, que assombra pela obsessão por posse de bola e ataque, modernos são os conceitos: a compactação, a pressão sufocante no campo ofensivo para retomar a bola. Mas, na hora de se organizar para atacar, o time que está entre os mais modernos do mundo usa desenho tático que dominou toda a primeira metade do século passado: o 2-3-5.

Nos primeiros esquemas táticos de que se tem notícia, desde o fim do século XIX, a distribuição dos times lembrava pirâmides com a base na linha de ataque e o vértice na defesa. Ou seja, mais atacantes do que zagueiros. Tudo começou com o 1-2-7. Aos poucos, passando pelo 2-3-5 que o Brasil usou na Copa de 1950, pelo 4-2-4 da seleção de 1958, até o 4-3-3, o 4-4-2 ou o atual 4-2-3-1, a pirâmide foi se invertendo. Guardiola decidiu revirá-la do avesso. Os treinadores brasileiros observam com admiração o trabalho do espanhol e o jogo do Bayern. Mas ressaltam as condições especiais que cercam o time.

Na última terça-feira, quando tinha a bola no jogo contra o Olympiakos, o que significa 65% do tempo, o Bayern tinha os zagueiros Boateng e Badstuber tomando conta de um atacante grego que, eventualmente, ficava mais adiantado. À frente deles, jogava Vidal, com a companhia dos laterais Lahm e Rafinha, quase como meias interiores. No ataque, nunca formando uma linha rígida de cinco, mas compondo o setor com constante movimentação, estavam Robben, Müller, Lewandowski, Coman e Douglas Costa. No fim das contas, um 2-3-5. Mas com intensidade de século XXI e extrema mobilidade. Além de outras diferenças, como o posicionamento adiantado do time e a compactação.

- Ao longo da história, o futebol gera reações a estratégias bem-sucedidas. O aumento da habilidade dos jogadores fez surgirem esquemas com mais marcadores. Isto foi invertendo a pirâmide. Além do aumento da responsabilidade do jogo, da pressão, do peso de vitória ou derrota. Times se defenderam mais. Sem falar na evolução física. Hoje, há quatro ou cinco times de exceção, concentrando craques. Invariavelmente os advesários vão para trás - analisa o técnico do Flamengo, Oswaldo de Oliveira.

O 2-3-5 de Guardiola virou rotina no Campeonato Alemão, com domínio massacrante do Bayern. A média de posse de bola supera 65%. Pressiona no campo rival e faz as partidas acontecerem em apenas uma metade de campo.

Técnico do Fluminense, Eduardo Baptista lembra que tal desenho tático obriga o Bayern a ter defensores técnicos, com boa saída de bola. O que faz Guardiola, repetidamente, escalar um zagueiro de origem ao lado de um volante adaptado. O treinador tricolor adverte que, nos grandes clubes europeus, a disparidade em relação a muitos adversários se soma ao tempo para o técnico trabalhar:

- No Alemão, ele terá dificuldade em raros jogos. Mas enfrenta adversários com linhas próximas, que tentam dar pouco espaço. Para isso precisa de boa saída de bola, põe um volante na zaga. Só que implantar isso demanda tempo, estabilidade independente do resultado. Cobra-se inovação no Brasil, mas a realidade é outra. Elencos mudam, técnicos também, jogos são mais parelhos. E se você inova em um jogo e perde, é chamado de "professor pardal".

CÍCERO, 'VOLANTE ZAGUEIRO'

Baptista diz pretender fazer testes semelhantes contra pequenos no Estadual, quando imagina ser menos agredido. Sua opção para ser o "volante zagueiro" é Cícero. Assim, espera melhorar a saída de bola e enfrentar retrancas. Mas ressalva que, por vezes, seus times atacam num 2-3-5, com dois zagueiros atrás, um dos laterais junto aos volantes e os demais aprofundados.

O tempo é tema recorrente na argumentação dos treinadores brasileiros quando debatem sobre inovações táticas. Jorginho, do Vasco, ressalta as qualidades de Guardiola.

- Você junta estrutura, qualidade do elenco e um grande treinador - avalia.

O comportamento atual será tendência no mundo? Quanto aos conceitos de mobilidade e compactação, os técnicos concordam que sim. Quanto ao desenho tático, advertem que talvez seja propriedade de times de exceção.

- O Bayern não se expõe porque tenta roubar a bola entre cinco e oito segundos, no ataque. Caso contrário, faz linhas de quatro convencionais. Conversei com Bruno Labadia (técnico do Hamburgo) e ele disse: não há como competir. É um elenco incrível e um clube que busca no mercado os talentos surgidos na Alemanha - acrescenta Jorginho.

O esquema tático de Pep Guardiola

Fonte: O Globo Online