Representantes de mais de 20 clubes de todas as séries do futebol brasileiro participaram esta semana de dois dias de audiências públicas no Congresso Nacional para discutir a Medida Provisória 671, conhecida como MP do Futebol. Apoiados pela CBF e por federações estaduais, que também estiveram presentes, dirigentes e advogados de times de todo o país voltaram a criticar o texto editado em março pela presidente Dilma Rousseff e pediram mudanças aos parlamentares. Eles admitem a necessidade da renegociação das dívidas com a União - estimadas em um total de aproximadamente R$ 4 bilhões -, mas argumentam as contrapartidas exigidas são intervencionistas e exageradas.
As reuniões foram realizadas na comissão mista responsável por emitir um relatório sobre a MP que será levado para votação nos plenários da Câmara e do Senado. Na terça-feira, foram ouvidos os representantes de clubes das séries A e D. Nesta quarta, foi a vez dos times das séries B e C. Também foram ouvidos dirigentes de clubes que estão fora das quatro divisões nacionais e o coordenador de futebol feminino da CBF.
- Nenhum presidente quer fugir da responsabilidade, todos querem ficar em dia. Mas a medida confundiu dívida fiscal e tributos com moralização e intervencionismo. Isso não serve para solucionar nosso problema de agora. É preciso enxugar a MP - defendeu o presidente do Atlético-MG, Daniel Nepomuceno.
- Os clubes se uniram de uma forma que poucas vezes vimos para combater algo que é abusivo, busca atrapalhar ou modificar uma autonomia que está garantida pela Constituição. Dificilmente haverá adesão do jeito que está. A MP desvirtua a própria natureza do clube - afirmou o advogado do São Paulo, Gustavo Delbin.
As críticas dos dirigentes se concentram principalmente em três artigos da Medida Provisória. O quinto, onde são feitas exigências aos clubes que quiserem aderir ao refinanciamento como pagamento em dia de todas as obrigações trabalhistas e fiscais, contratação de auditoria independente, limitação de mandatos, proibição de antecipação de receitas de gestões futuras, limite de 70% do orçamento para gastos com futebol e obrigatoriedade de investimento em uma equipe feminina.
Outro artigo bastante criticado é o quinto, que prevê que os clubes que entrarem no refinanciamento só possam disputar competições organizadas por entidades que sigam uma série de regras como prestação de contas e demonstração contábil disponível na internet, limitação de mandatos, participação de atletas nos colegiados e rebaixamento de clubes inadimplentes.
Por último, o artigo oitavo também foi muito atacado pelos dirigentes. Segundo o texto, seria obrigatório que os clubes concentrassem todas suas operações financeiras em um único banco.
- Da forma como está colocada a medida, conseguimos as CNDs (Certidões Negativas de Débitos) e falecemos em seguida. Não há viabilidade de um clube de futebol, por mais necessitado que esteja, aderir a medida da forma como ela foi colocada. Além da violentíssima intervenção nos processos internos do clube. Não tem como criar interferências nas instituições que promovem os campeonatos - afirmou o presidente do Botafogo, Carlos Eduardo Pereira.
As condições do refinanciamento foi outro ponto criticado por alguns dirigentes. Eles alegaram dificuldades em muitos clubes para cumprir com os prazos e valores mínimos exigidos pela MP. De acordo com o texto, os clubes teriam um prazo de 120 a 240 meses (20 anos) para quitarem seus débitos, com descontos nas multas e nos juros. Nos três primeiros anos, também seriam concedidas condições especiais, com a possibilidade de parcelas mensais de no máximo 0,5% do faturamento anual da instituição.
- Da foram como está posta, a Portuguesa não teria condições de aderir. Não temos como pagar valor superior ao fluxo de caixa que conseguimos gerar. Hoje, nosso patrocínio depende basicamente da generosidade de alguns empresários. Verba de TV, não temos na Série C. Os jogadores da base, a gente tenta segurar, mas está difícil. Com esse refinanciamento proposto na MP, a Portuguesa provavelmente fecharia as portas - afirmou o presidente da Lusa, Jorge Manuel Gonçalves.
Parlamentares apoiam mudanças
As críticas dos dirigentes encontraram respaldo em boa parte dos parlamentares participantes da audiência, muitos deles, ligados a clubes de futebol.
- Todos os clubes da Série A assinaram um documento pedindo modificações na MP. ouvimos aqui clubes até da Série D e outros que estão fora das quatro divisões. Todos pediram para mudar. Então, é algo que peço a atenção de todos os nossos nobres parlamentares - afirmou o deputado Marcelo Aro (PHS-MG), que faz parte do conselho do Atlético-MG.
- Ouvimos muitos clubes, todos com o mesmo nível de críticas. Certamente, a MP não está agradando a ninguém. Temos aqui a oportunidade de negociar e alterar o texto. O relator tem a autonomia para alterar a matéria para um PLV que vai certamente atender dentro de uma negociação as ansiedades que estão sendo colocadas e também a posição do governo, que emitiu a MP - disse o deputado José Rocha (PR-BA), presidente do conselho do Vitória.
Ex-ministro do esporte, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) foi outro que admitiu a necessidade de alterações na MP, mas defendeu um meio termo em relação às demandas dos clubes e o texto editado pelo governo.
- Precisamos construir um ambiente de entendimento, não beligerante. Artigos colocados para fazer briga política com a CBF, nesse caso, eu não concordo. A minha defesa é de exclusão deles. Mas também não adianta aprovar um texto que passe lá na frente pelo constrangimento de ser vetado pela presidente e não resolver a questão - afirmou o deputado.
As audiências públicas para debate da MP na comissão mista seguem na próxima semana. Devem ser ouvidos representantes da CBF e de entidades de representação dos atletas, como o Bom Senso F.C.
Fonte: GloboEsporte.com