Fé e superstição movem o coração de dois protagonistas da final do Campeonato Carioca. Com estilos diferentes, Eurico Miranda, presidente do Vasco, e Carlos Eduardo Pereira, do Botafogo, se apoiam em crenças pessoais na esperança pelo título. Um duelo que evocará os rituais de cada um. De um lado o famoso charuto, marca registrada do vascaíno. Do outro, o ‘Dinoboy’, apelido dado ao antigo radinho de pilha do dirigente alvinegro. Objeto de poder ou amuleto, não importa. Só um vai celebrar a conquista da 114ª edição do campeonato mais charmoso do futebol brasileiro.
Na busca do primeiro título
Na semana que antecedeu a final, um radinho de pilha Aiwa de ondas curtas, fabricado no fim da década de 1980, foi lustrado e cercado de cuidados. Há 25 anos, Dinoboy se transformou em talismã e companhia inseparável do presidente do Botafogo, Carlos Eduardo Pereira, nos dias de jogos.
“Ele é de 1989, do gol do Maurício. Uma das grandes emoções da minha vida e o Dinoboy estava lá. Hoje, o Dino virou um pé de coelho. Botafoguense que se preze tem que ser supersticioso”, brinca o presidente, se referindo ao gol que acabou com um jejum de 21 anos sem títulos.
O divertido nome do talismã quem deu foi sua mulher, uma botafoguense de carteirinha. “Sempre questionei porque ele não comprava um rádio mais moderno. Ele sempre foi chegado às últimas novidades, mas tinha um rádio jurássico e, como havia o desenho do Vale Perdido, virou Dinoboy. Ele ouviu, gostou e riu muito”, entrega Rosemary Hissa, tão supersticiosa quanto o marido.
Com Dinoboy, Carlos Eduardo mantém viva uma tradição de família. “O radinho tem esse componente de ligação com a infância. Ganhei o primeiro do meu pai (Hugo Pereira), junto com a bandeira e uma almofada. Ele queria que eu fosse tão apaixonado pelo Botafogo quanto ele. E conseguiu”, diz, com os olhos brilhando.
Hoje, mais uma vez, o presidente vai se apegar em superstições, como todo bom botafoguense, para sair vitorioso do Maracanã. E ainda vestirá uma camisa de manga comprida por baixo da do clube. Uma homenagem ao time de 1962, que goleou o Flamengo por 3 a 0. “Desde então sempre uso manga comprida”, garante. Na hora do jogo vai colocar o radinho no ouvido e sintonizar até achar a frequência da emissora da sorte. “Começo sempre ouvindo uma. Dá uns 15 minutos e troco. No segundo tempo volto para a primeira. Escuto ao menos quatro estações diferentes. Mas se a coisa estiver boa, eu não mudo mais”, brinca.
Retorno à Colina
Eurico Miranda se fechou em copas às vésperas da decisão. Se diz magoado com a imprensa e evita entrevistas. Ansioso em levantar o primeiro troféu, após sua volta a São Januário, pensou milimetricamente em todos os detalhes para que o Vasco seja campeão.
Se o vigor já não é mais o mesmo, devido ao peso dos 70 anos, a mente continua ágil. Dificilmente algo lhe escapa. Não é à toa que seus partidários garantem que a ‘velha raposa felpuda’ está em forma.
Em forma e fiel a rituais. Em dia de decisão seus hábitos são os mesmos, entregam os amigos, que preferiram não se identificar. Devoto de Nossa Senhora de Fátima, Eurico começa o domingo na igreja, assistindo à missa.
Depois do almoço em família vai direto para o estádio. Sempre chega mais cedo para controlar tudo pelo telefone. Quer saber dos mínimos detalhes. Se as camisas estão arrumadas no vestiário, se o astral dos jogadores é bom, se o ônibus está no horário.
No camarote do Maracanã senta na última fileira, na cadeira da ponta, ao lado do vice de futebol José Luiz Moreira e do amigo Fernando Horta. Perto, os filhos Euriquinho, seu assessor, e Álvaro, coordenador da base. Já os netos circulam livres e muitas vezes caem em seu colo, o fazendo perder o ar sisudo.
Com um olho na TV, sem som, e outro no campo, ele desliza um legítimo charuto cubano entre os dedos. Um Cohiba, o melhor do mundo. É um atrás do outro. Entre uma baforada e outra, bebe goles generosos de refrigerante light. Às vezes, se isola no reservado para ver o jogo sozinho e esbravejar quando acha que o Vasco foi prejudicado.
Como no domingo passado, Eurico espera que a decisão de hoje termine igual. Ele vai descer para o vestiário, conversar com os jogadores e puxar o tradicional grito de ‘Casaca’ junto com outro que está entalado na garganta desde 2003 no Carioca: o de campeão.
Fonte: O Dia