Eles ainda atraem as atenções, são alvos de câmeras fotográficas e arrancam sorrisos no rosto de quem os vê. Mas permanecem órfãos. Dez anos após o fechamento do setor mais popular do Maracanã, os geraldinos se adaptaram à realidade, descobriram novas formas de continuar assistindo aos jogos no estádio, mas não conseguem disfarçar a melancolia ao falar da antiga casa.
— Não é a mesma coisa sem a geral. Não é pelo dinheiro. Lá era festa, alegria. Eu me sentia bem — recorda Maria de Lourdes Pereira, a “Vovó tricolor”, que deixa as lágrimas brotarem ao lembrar da antiga rotina que incluía chegar duas horas mais cedo no estádio, forrar o chão com uma bandeira do Fluminense e aguardar o início da partida comendo biscoito de polvilho.
Antes próximo ao campo, agora, somente atrás do gol. Com o local onde ficava a geral transformado numa das áreas mais nobres da arquibancada, os geraldinos migraram para os setores Norte e Sul, mais baratos — mas ainda assim longe do valor cobrado na geral, que custou R$ 5 na última final de Estadual da sua história (Fluminense x Volta Redonda).
— Hoje o Eurico me dá ingresso. No período do Dinamite, o pessoal das organizadas me colocava para dentro — diz como faz para entrar José Pedro Santos, o Mister M, que marca presença em todos os jogos do Vasco (no último, quarta-feira, expulsou um torcedor que vaiava Bernardo em São Januário).
Mas nem todos têm dinheiro ou conseguem uma forma de entrar. Os rubro-negros Antônio Barbosa (Valderrama) e Antônio Ramos (Índio da geral) vão para a entrada do Maracanã em dia de jogo pedir a alguém com direito à meia-entrada para comprar por eles.
— Também vamos para a fila de idosos. O funcionário sabe que ainda não temos 65. Mas quando vê que somos nós, às vezes, deixa entrar — conta Valderrama, que deixou o cabelo crescer nos anos 1970, inspirado no visual dos jogadores do Flamengo da época, e hoje não corta mais.
Sufoco na porta do estádio, mas reconhecimento no cinema. São eles os protagonistas do documentário “Geraldinos”, exibido esta semana no Rio e em São Paulo como parte do festival “É tudo verdade”. Na última quinta, eles estiveram na sessão de estreia do filme, que mostra como os grandes eventos da cidade mudaram o perfil do público de futebol.
— O filme mostra através dos geraldinos que foram expulsos do Maracanã um retrato do Rio de hoje, que exclui os menos desfavorecidos de seus bairros para se elitizar — afirma Renato Martins, diretor do documentário ao lado de Pedro Asberg.
Não à toa eles são protagonistas de filme. Afinal, o que não faltam são histórias para contar. Que o diga Edgard Roque. Mesmo sem fantasia, ele ganhou fama em setembro de 1982, quando invadiu o campo do Maracanã para esfriar o Fla-Flu, que já registrava 3 a 0 para os rubro-negros antes do intervalo.
— Mandei o Zico se afastar e reuni meus zagueiros. Se não faço aquilo o Flamengo teria dado uma goleada histórica — recorda o tricolor, que invadiu o jogo do Fluminense outras três vezes, sempre para evitar goleadas. — Quando está ganhando eu vou entrar para quê?
Histórias que não se perdem. Como a saudade.
Fonte: Extra Online