Um dos grandes ídolos do Vasco, Juninho Pernambucano completa 40 anos em janeiro de 2015. A idade acompanha a maturidade e o desafio de atuar como comentarista da TV Globo, emissora com a qual tem contrato até meados de 2016. Mas viver o dia a dia do mundo da bola faz falta ao ex-jogador que encerrou a carreira há menos de um ano. O atual compromisso profissional será cumprido, porém, virar técnico balança um dos principais cobradores de falta do futebol recente.
Juninho entrou em campo pela primeira vez desde que parou justamente no Maracanã. No último sábado (27), o Pernambucano participou do Jogo das Estrelas e atuou ao lado do anfitrião Zico. Cada vez mais identificado com os outros clubes cariocas por conta da nova função, ele conversou com a reportagem do UOL Esporte nos bastidores do evento e mostrou preocupação com o futuro do futebol do Rio de Janeiro.
Confira a entrevista completa:
UOL Esporte: Você completa um ano como comentarista em abril de 2015. A função profissional após pendurar as chuteiras está definida?
Juninho: Ainda sinto falta do futebol, mas gosto da função atual. Fui bem recebido nas coberturas da Copa do Mundo e do Campeonato Brasileiro. Fiz um contrato de dois anos com a emissora e darei o melhor até o final. Só não posso dizer que esqueci o futebol e não voltarei. Sonho em ser treinador. Hoje é mais difícil para um ex-jogador, pois são exigidos cursos para trabalhar na Europa. Não aceitam nem mais como assistente técnico. Não tenho essa formação. Talvez precise de um tempo para me preparar e decidir sobre isso. É uma história recente. Acompanho as competições e me vejo em campo apesar de saber que o tempo como atleta passou.
UOL Esporte: A tendência é atuar como técnico a partir de 2016?
Juninho: O futebol é uma tentação. É impossível esquecer completamente. É uma dúvida constante. Nunca tive uma proposta oficial. Surgiram contatos do Catar para ser treinador, mas nada com um projeto de longo prazo. Só posso ser técnico no Brasil, pois não tenho diploma. Não acho válido também isso. Vou esperar mais um pouco. Conversei com o Casagrande uma época. Ele ficou um longo período assim e quase foi treinador do Corinthians ou do São Paulo. Foi quando decidiu apenas comentar. Os jogadores que foram líderes se sentem um pouco no campo. Isso é natural. Espero decidir o mais rápido possível.
UOL Esporte: Você tem identificação com o Vasco, mas hoje trabalha nos jogos dos quatro grandes clubes do Rio de Janeiro. A preocupação aparentemente é geral por conta da crise financeira. Qual é a situação do futebol carioca?
Juninho: Estamos atrás no que sempre falamos. Não conseguimos pagar em dia e prometemos muito. Dos quatro clubes, um pode fazer boa campanha e já apagam os problemas. Sempre queremos o melhor para o Rio, mas chegamos numa situação bem difícil. Isso era questão de tempo. O que chama atenção é o fato de o futebol carioca não apresentar solução. Acabou o tempo de vencer uma Taça Guanabara e empurrar com a barriga. Os clubes não enganam mais.
UOL Esporte: Quais as principais falhas dos clubes cariocas?
Juninho: Não fizemos um centro de treinamento e não preparamos jogadores. Talvez o Fluminense tenha uma base melhor, mas não conheço a estrutura. Os profissionais ainda treinam nas Laranjeiras. O Vasco possui apenas São Januário e fica refém de lugar para trabalhar. O Botafogo depende do Engenhão e não conheço o CT do Flamengo. Perdemos muito tempo. Pode ser uma fase. Mas são muitos times na frente do futebol do Rio: Grêmio, Inter, Cruzeiro, Atlético-MG, São Paulo, Corinthians, Palmeiras... Nenhum clube carioca apresentou um projeto de estádio antes e durante a Copa do Mundo. Foram mais oportunidades perdidas.
UOL Esporte: Acha que as falhas dos clubes do Rio de Janeiro ficaram mais expostas por conta das crises recentes?
Juninho: O Campeonato Carioca ainda é considerado atrativo. Mas o futebol chegou ao momento no qual não se paga. Antigamente ninguém sabia que os salários atrasavam. É difícil enganar o jogador nos dias de hoje. Vi vários atletas de times menores dizendo isso no Vasco. Eles não sabiam que funcionava assim. Era preciso pegar ônibus para treinar. Era preciso esperar três meses para receber o pagamento de um. Falta estrutura. Uma boa gestão ganha jogo. O Fluminense tomou um susto com a saída da Unimed. É um bom teste para ver como as coisas vão ficar.
UOL Esporte: A diretoria do Flamengo tomou posse em 2013 e não escondeu a prioridade em pagar dívidas. O time conquistou um Campeonato Carioca e uma Copa do Brasil no período, mas brigou contra o rebaixamento no Campeonato Brasileiro por dois anos consecutivos. Como encontrar o meio termo e viabilizar novamente os clubes?
Juninho: É difícil encontrar um time médio que dê resultados. O Flamengo mudou com a chegada do Vanderlei Luxemburgo e o apoio da torcida. É o único jeito para tirar a diferença. Talvez seja melhor sofrer por alguns anos e voltar forte para conquistas. Esse parece o caminho. Mas quem tem coragem para fazer isso? Acho que o Flamengo faz o certo no momento. Claro que a torcida ficou desesperada com o risco de rebaixamento. Se o time não cair de divisão, o caminho da administração segue com mais facilidade. E no meio disso tudo é fundamental a redução salarial. Quantos jogadores no Vasco não tinham mercado e recebiam acima de R$ 100 mil? Vários. Nenhum clube aguenta isso. A reestruturação é necessária. Funciona assim também na Europa. O Lyon era um time médio e que se transformou em um dos maiores da França. A diretoria resolveu construir um estádio. O time atua com a base e sofre. Todo mundo criticou, mas as coisas estão melhorando.
UOL Esporte: A reestruturação de um clube pode levar anos. As torcidas são impacientes e cobram bastante. Como ganhar títulos com tantos problemas?
Juninho: Se nada disso acontecer você depende apenas de um grupo de pessoas com bom caráter. Foi o que ocorreu no Vasco em 2011. Tínhamos um elenco que se juntou e conquistou. Mas lógico que o mais fácil é sempre ter um cheque para contratar. Porém, isso parece cada vez mais raro no futebol atual.
UOL Esporte: O Botafogo vive aparentemente a pior situação financeira entre os cariocas. A diretoria do Vasco também tomou posse com a prioridade em cortar gastos. Como enxerga a atuação no mercado do clube no qual é ídolo? O que esperar para 2015?
Juninho: Não dá esperança de conquista, mas pode melhorar no futuro. O clube passaria por isso cedo ou tarde. A cada conquista você esconde um pouquinho dos problemas. E foram poucos títulos nos últimos anos. A situação do Vasco hoje é idêntica a do Botafogo. Acho que a diretoria trabalha com o futuro mesmo. Não tem como ser diferente. Mas é lógico que as contratações não dão esperança.
Fonte: UOL