Não há circo sem palhaços, acrobatas ou mágicos, nem sem o público a lotar a arquibancada. E quando há artistas e fãs, mas não arenas para desenvolver e mostrar o talento? É assim no Rio, onde a um ano e meio dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de agosto e setembro de 2016, a rotina dos artistas do esporte é a falta de locais para treinar e competir.
Quem quer ver atletismo não tem o Célio de Barros. E quem gosta de basquete não pôde, ao longo da semana, entrar no Tijuca. O Maria Lenk é pouco usado na natação, e o Júlio de Lamare está interditado há seis meses. O Centro Nacional de Tiro Esportivo (CNTE) está fechado, por falta de verbas do Ministério do Esporte. Autódromo e kartódromo já não existem mais, e Vasco e Flamengo não têm ginásios ou piscinas. No remo, as competições até acontecem na Lagoa, mas sem público, pois a arquibancada não existe mais.
Fechado a cadeado desde 9 de janeiro de 2013, o Célio de Barros — que foi estacionamento da Fifa na Copa — é onde treinavam diariamente atletas de todos os clubes. O passado por trás do presente e a falta de futuro emociona Robson Caetano, dono de dois bronzes olímpicos (1988 e 96).
— O Célio de Barros é minha vida inteira, 40 dos meus 50 anos. Fico muito triste — declara. — A história do esporte passa por aqui, e um povo sem história está perdido no tempo. Por aqui passaram grandes nomes, e Joaquim Cruz bateu o recorde mundial juvenil dos 800m, com 1m44s300.
Para ele, é revoltante que se tenha tirado um espaço de tantos jovens, sem nada em troca:
— Dá para acreditar que não há verba para reformar o estádio? Como medalhista olímpico que treinou aqui, apelo ao governador e ao prefeito.
O fechamento da pista motivou a criação da Associação de Ex-Atletas e Amigos do Célio de Barros, presidida por Solange do Valle, técnica e ex-atleta do Vasco. O movimento inclui a Federação do RJ e veteranos. Solange, de 62 anos, frequenta o local desde 1965, quando a pista era de carvão. Lá era possível treinar e competir, mas hoje provas e treinos são feitos na ciclovia do estádio.
Pela Associação de Veteranos, Maria Teresa Monteiro questiona quando e onde jovens poderão treinar para serem atletas de ponta. Técnico, Adalberto Rabelo protesta:
— O que as autoridades fizeram da modalidade-mãe das Olimpíadas, o atletismo, que no Rio está sem teto?
Atletas vagueiam pelo Rio
Aos 78 anos, a master Laura Chagas, velocista e saltadora, viu nascer aquele estádio.
— Estou aborrecida por vê-lo fechado, e a cúpula não nos diz nada, às vésperas de 2016.
Laura tem razão. O projeto desenvolvido pelo Consórcio Maracanã, responsável por reformar o espaço, foi aprovado pela Casa Civil do Estado, mas ainda está sob análise dos órgãos de licenciamento. Não existe uma data para o início das obras.
Sem espaço, atletas vagueiam pela Quinta, Campo dos Afonsos e Engenhão, mas neste, só quando o futebol do Botafogo não está treinando. Casos dos vascaínos Caio Henrique Ferreira, de 16 anos, Maria Vitória de Queiroz, de 14, e Ester Figueira, de 14.
— Aqui é meu berço, onde dei os primeiros passos no atletismo. O começo de tudo — diz o barreirista Caio.
Aos 14 anos, tanto Ester, que corre meio-fundo, quanto as velocista e saltadora Maria Vitória se sentem “sem-pista”.
— Isso atrapalha a todos nós que sonhamos ser medalhistas olímpicos. Mas não deixo esporte nem escola. Ainda bem que estudo no colégio dentro do Vasco — observa Vitória.
Vizinhos do Célio de Barros e parceiros de luta, estão os frequentadores do Júlio de Lamare, onde havia treinos e programa para idosos e deficientes.
— Foi fechado em maio, por causa da Copa, e nos prometeram reabri-lo em agosto, o que não ocorreu. Eram dez mil beneficiados — afirma Vania Magnólia Quedevez.
Amigos do Célio de Barros e do Júlio de Lamare falam forte. Mas os motores já silenciaram no kartódromo, em 1995, e no autódromo, em 2012. O autódromo é a sede do futuro Parque Olímpico. Aos 12 anos, Matteo Molo, campeão serrano de kart, diz que a falta de local de treino é muito ruim:
— Sem kartódromo, todo sábado tenho que ir até o kartódromo de Guapimirim. As despesas são bem maiores.
Piloto da Stock Car, Popó Bueno correu em Jacarepaguá no kart, F-Rio, F-Chevrolet:
— Mais que a Rio-2016 foi a especulação imobiliária que acabou com o autódromo. Prometeram um (novo circuito) em Deodoro, mas acreditar em palavra de político é muito complicado, né?
Fonte: Blog Radar Olímpico - O Globo Online