"A vitória da chapa de Eurico Miranda nas eleições vascaínas leva de volta o folclórico cartola ao posto do qual ele parece nunca ter saído: a presidência do clube. Anteontem, antes de chegar à sala de troféus de São Januário para esta entrevista exclusiva ao Estado, ele cumprimentou torcedores, posou para selfies e distribuiu ordens para os funcionários – que o atendiam prontamente mesmo sabendo que Eurico só toma posse no dia 1º de dezembro. “Tenho muito trabalho para fazer”, repetia."
Crítico da administração de Roberto Dinamite, Eurico considera “vergonhoso” o fato de o time ainda não ter conseguido o acesso à Série A, deu a entender que fará mudanças significativas no elenco e admitiu que vai dar ingressos a membros de organizadas. Evitou polêmicas, mas deixou no ar a possibilidade de fazer contratações de peso. “Nunca sonhei com jogador. Quando as pessoas acordavam, esse jogador já estava aqui”, gabou-se.
O senhor fala em “resgatar o respeito” do Vasco. Quando e como ele foi perdido?
O Vasco perdeu o respeito de uma forma continuada, cada vez maior a partir do momento em que eu saí e assumiu essa administração que ficou seis anos. Sua primeira consequência foi levar o Vasco para a Série B. O Vasco não é time de Série B.
Mas em sua última gestão o clube deixou de conquistar títulos de expressão...
Você está fazendo uma entrevista aqui comigo na sala de troféus. Passe e veja quantos foram conquistados na minha direção. Não é que deixou de conquistar. Claro que essas coisas podem ter ou não ter. Agora, eu posso enumerar alguns: três Campeonatos Brasileiros, Libertadores, Mercosul, e sete campeonatos cariocas, entre outros. Dos títulos recentes, 90% têm a minha participação. Não tenho o que falar.
Como o senhor avalia a gestão de Roberto Dinamite?
Absolutamente desastrosa, em todos os aspectos. Nós ganhamos a eleição agora, quando a ficha começar a cair é que veremos a responsabilidade que teremos de assumir. O quadro social depositou uma esperança muito grande em nós, e é evidente que vai cobrar. E a situação do Vasco é extremamente delicada, muito mais do que a gente pensa.
Como pensa em recuperar o orgulho do Vasco no futebol? Com que recursos?
Essas coisas não têm fórmula mágica. Essas coisas eu tenho de dizer assim: vou pregar um prego aqui e um acolá. A única coisa que posso dizer é que o Vasco vai deixar de ser mero participante. O Vasco vai disputar as competições para ganhar. Outra coisa: o Vasco comigo nunca caiu para a Segunda Divisão e jamais cairá. Não sou eterno, mas o Vasco é eterno. Então vou ter de deixar uma estrutura, e isso nunca mais vai acontecer. Essa vergonha, essa página negra na história do Vasco que foi descer para a Segunda Divisão. Duas vezes.
O clube tem jogadores em fim de contrato e o técnico Joel Santana em situação incerta. O que pretende fazer?
Eu não falo sobre isso por uma razão simples: o Vasco precisa consolidar sua volta à Série A. E falando alguma coisa agora eu poderia tumultuar esse retorno do Vasco à Série A. Mas claro que já sabemos 90% do que vamos fazer.
Joinville e Ponte Preta já confirmaram a classificação para a Série A, mas o Vasco ainda não. O que acha disso?
Vergonhoso! Vergonhoso! Por isso que falei em página negra. O fato de ter caído já é uma vergonha irreparável. Hoje era para o Vasco estar muito na frente deles todos, mas ainda não conseguiu a sua volta. É fruto de estar com time deficiente? Não. De equipe, o Vasco não tem nada de inferior para qualquer time da Série B. Diversos fatores contribuíram para que o Vasco ficasse assim. Atraso de pagamento, falta de estrutura...
Sobre essa questão financeira, o senhor vai tentar mudar a distribuição de cotas de TV?
Quando deixei o Vasco, ele recebia rigorosamente igual a outros quatro clubes: Flamengo, Corinthians, Palmeiras e São Paulo. Hoje é o sexto, sétimo. A forma como administraram o clube levou a que hoje o Vasco tenha uma condição secundária, E não falo de Segunda Divisão, mas de tratamento de segunda. Você tem oportunidade de estar aqui na sala de troféus, de ver a história do Vasco, uma história de conquistas. Vou lutar para que o Vasco volte a ter o tratamento que merece.
Como vai ser a sua relação com as torcidas organizadas?
Minha relação será como sempre foi: respeitosa. Se as torcidas organizadas tiverem o comportamento que devem ter, elas terão sempre a proteção do clube. A torcida organizada é de maior importância para fazer a festa, para promover. Agora, você não pode permitir a distorção, a violência, esses enfrentamentos que existem. Se isso acontecer, vai haver aquele corte natural.
O senhor pretender dar ingressos para as organizadas?
Se necessário for, eu não vejo problema nenhum. Agora, não é para passar para cambista. Precisa ser feita de uma forma organizada.
O que acha da constante presença do STJD no noticiário?
Tem havido alguns excessos, principalmente por parte da Procuradoria. O que não pode é tomar posições porque na tevê passou isso, a outra tevê colocou aquilo. Tribunal, no meu entendimento, deve procurar resolver as coisas sem aparecer muito. A coisa que eu mais vejo hoje é a procuradoria do tribunal permanentemente dando entrevista. Não é por aí. As coisas não podem acontecer com prejulgamento.
Com a sua experiência como dirigente no futebol, acha que alguém pode ter dado dinheiro à Portuguesa para se beneficiar?
Primeiro, que eu não acho nada. A última informação que tive é que o Ministério Público tinha algumas provas a serem apresentadas. A partir do momento que forem apresentadas posso tomar posição. Mas tomar posição sobre o que fulano acha, eu acho extremamente arriscado.
Pretende investir no estádio de São Januário?
Nós temos a intenção de até o final da nossa gestão executar o projeto de ampliação de São Januário. São Januário não é apenas um estádio, é um complexo esportivo. O que a gente está encontrando aqui é um abandono total. O ginásio foi palco de conquistas internacionais de basquete, futsal, e está lá abandonado. Em nosso parque aquático foi batido um recorde mundial 4x100 por um brasileiro. E agora a piscina está fechada. É isso que vamos começar a resgatar.
Como será sua relação com os outros clubes do Rio?
Sempre tive uma relação excelente com os clubes. Agora, às vezes você tem de entrar em choque. O adversário no Rio de Janeiro é o Flamengo. Dentro de campo é guerra. É matar ou morrer. Isso não tem o que discutir. Fora de campo não tem nada a ver. Parece que não tenho relação com eles, mas tenho certeza de que todos eles têm relação comigo.
Em sua nova gestão o senhor pretende fazer uma administração menos centralizadora?
O problema é o seguinte: as pessoas têm uma imagem distorcida de mim. Quando se fala em centralizador, não é que você faça as coisas. O centralizador é e vai continuar sendo assim. Eu só quero saber das coisas. Aqui, infelizmente, o que tem acontecido é história de marido traído. Se já foi traído, vai saber depois? Aqui o problema não é centralizar. Você não consegue fazer nada sozinho. A única coisa que você tem de saber é como as coisas acontecem. Não posso administrar o Vasco por e-mail, por WhatsApp, por telegrama, por telefone. Tenho de tomar conhecimento das coisas. Se isso é ser centralizador, vou continuar sendo.
Durante a campanha, o senhor recebeu apoio do Romário e oposição do Edmundo. Os dois jogaram juntos sob seu comando. A que atribui essa divergência?
Há uma diferença grande entre Romário e Edmundo, né? Para definir: o Romário é o Romário. O Edmundo é um rapaz que oscila. E de repente ele viu a oportunidade de ganhar dinheiro. Esse discurso barato de que é pelo Vasco... Não, ele viu uma oportunidade de transformar isso em negócio. Pessoas foram em cima dele: ‘você tem uma oportunidade, e podemos crescer juntos’. É tudo comércio.
Como é sua relação com Marco Polo Del Nero e o que espera da CBF sob seu comando?
É a melhor possível. Vou convidá-los (José Maria Marín, atual presidente, e Del Nero, que assume em abril) para a minha posse. Acho que eles têm obrigação de manter no mínimo uma relação institucional com o presidente do Vasco.
Tem alguma meta de título?
Vamos lutar para ganhar o primeiro título que a gente disputar. Não prometo que vamos ganhar. Mas vamos lutar.
E, para isso, sonha contratar algum jogador diferenciado?
Não é do meu estilo, nunca sonhei com jogador. Quando as pessoas acordavam, esse jogador já estava aqui.
O senhor já tem a equipe de administração formada?
Primeiro tenho de tomar posse. Quando tomar posse, tranquilo. Venho com gente que já conhece o Vasco, com intenção de ajudar o Vasco, de trabalhar pelo Vasco. O pessoal não gosta deste termo: ‘acima do profissional’. Não que o profissional remunerado seja bom ou ruim, mas hoje ele está aqui e amanhã está ali. O dirigente amador e competente está sempre aqui, e com um componente acima do profissional que é o amor que ele tem por este clube.
Fonte: Estadão