Filha adotiva de Barbosa lembra como conheceu o ídolo vascaíno

Quarta-feira, 09/04/2014 - 11:39
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Em um domingo de 1991, um homem esguio e elegante entrou em um quiosque, em Praia Grande, pedindo uma bebida: “Quero um birinaite”, apontou, exibindo os dedos tortos — maltratados pela bola — e mostrando a dose certa da amarga mistura de cynar e cachaça. A voz pausada e o carisma logo chamaram a atenção de Tereza Borba, que não reconheceu o cliente famoso. Mas o marido dela, José Mauro, não pensou duas vezes: “O senhor não é o Barbosa do Vasco?”. A inesperada referência a seus tempos gloriosos no Expresso da Vitória surpreendeu o ex-goleiro, cansado de ser apontado como o maior vilão da Copa de 50.

Nascia ali uma amizade que se aprofundou e ganhou laços de família. “O Barbosa adorou, porque todo mundo que o reconhecia cobrava a perda de 50. Meu marido, não. Ficou embasbacado em ver o ídolo de perto. A partir daí, todo dia ele passava no quiosque para conversar e contar histórias do Vasco”, relembra Tereza.

Aos poucos, o papo à beira do balcão foi esticado até a casa da família Borba, que virou um refúgio. “Ele foi bem acolhido aqui. As pessoas não o conheciam. Vivia praticamente no anonimato. Era apenas o negão gente boa, muito brincalhão”, conta Tereza. Ela acompanhava de perto a rotina do ex-goleiro: “Ele adorava caminhar na praia, ouvir música em casa. Gostava de bossa nova, samba de raiz, Nelson Gonçalves, Marlene e até fado. Às vezes, ia à cozinha e preparava um cozido e tanto. Só ficava triste quando lembrava da mulher e do passado.”

Quando Barbosa ficou sem lugar para morar, foi o casal Borba que o abraçou. “Nós o ajudamos a encontrar um apartamento com o dinheiro que o Vasco mandava. Aos poucos, a Tereza passou a organizar a vida dele. Ajudava nas compras do mercado, levava ao médico. Ele frequentava a nossa casa, viajava com a gente. Era da família”, ressalta José Mauro.

A forte relação entre Barbosa e Tereza aflorou sentimentos profundos. Ela via na imagem do ex-jogador o pai que nunca conheceu. Um afeto integralmente correspondido. “Gosto de dizer que sou a filha do coração dele. Adorava o meu Neguinho (apelido de Barbosa). Podem rir de mim, mas acho que nos conhecíamos de outras vidas”, ressalta, muito emocionada.

Apesar da morte de Barbosa, Tereza nunca deixou de reverenciar a memória dele. Quando ficou sabendo que a administração do cemitério queria despejar os restos mortais do ex-goleiro, foi ela quem colocou a boca no trombone.

“Não foi fácil, mas, depois que fui aos jornais e denunciei que ele seria despejado da gaveta, a administração se sensibilizou e agora o Barbosa pode descansar em paz em seu jazigo”, ressalta, com alívio.

O SONHO DE UM HERDEIRO

De tanto ouvir a avó contar as histórias sobre Barbosa, o garoto Daniel, de 12 anos, aprendeu a admirar o ex-goleiro, que nem chegou a conhecer. “Desde pequeno, escuto falar que ele era o melhor goleiro do Brasil, que jogava no Vasco, na seleção brasileira. Também ouvia que ele não agarrou aquela bola na Copa, mas não deveria ser injustiçado até hoje”, diz Daniel, que sonha seguir os passos de Barbosa.

“Gosto muito de futebol, quero ser goleiro, acho que levo jeito. Não sei se vou ser o seu herdeiro, mas o Barbosa é uma inspiração a mais para eu jogar futebol. Acho que é um pouco meu bisavô”, afirma.



Fonte: Lancenet