Ele é o único brasileiro com duas Chuteiras de Ouro, prêmio concedido aos maiores artilheiros da Europa. Jogou em dez países: Brasil, Espanha, Inglaterra, Argentina, Turquia, França, Chipre, Austrália, Bulgária e Portugal, onde foi ídolo de duas torcidas, a do Porto e a do Sporting. Herói do Grêmio e um dos cinco maiores goleadores da Libertadores, também vestiu a camisa da Seleção 11 vezes. A história vitoriosa nos gramados poderia ser de fama e fortuna fora dele, mas Mario Jardel Almeida Ribeiro, hoje com 40 anos, segue a carreira na pequena cidade de Ibirubá, no interior do Rio Grande do Sul. Lá ele veste a camisa do clube amador Vila Nova. E reconta para o Esporte Espetacular a trajetória que o levou do auge ao abismo.
Nascido em Fortaleza, Jardel começou no Vasco da Gama. A conquista do carioca de 1993, como reserva, foi seu primeiro título como profissional. Em 1995, foi emprestado ao Grêmio para reforçar o elenco na Libertadores, da qual acabou se tornando artilheiro com 12 gols. Em 1996 transferiu-se para o Porto, depois passou por outros clubes até retornar ao Brasil em 2004, para o Palmeiras. Voltou ao exterior, onde passou por um período de condicionamento físico bastante irregular, o que resultou em uma extensa lista de trocas de clubes.
Em 2008, Jardel abriu o jogo para o Esporte Espetacular e revelou o uso de cocaína podia ser o motivo da perda da forma física. Até hoje, ele tenta se reerguer. A meta é encerrar a carreira em um clube profissional, e aproximar-se do Grêmio e de Porto Alegre faz com que Jardel não se sinta sozinho. Confira a seguir trechos da entrevista com o atacante.
Depressão e drogas
Eu não usava drogas todos os dias, era uma vez ou outra. Conheço muitos jogadores que usam e não assumem. Eu assumi, não tenho vergonha. Em todas as profissões existe essa praga que entra nas famílias e estraga tudo. Graças a Deus eu estou feliz por ter isolado muitas pessoas negativas que me influenciavam. Sem dúvida nenhuma, a depressão me levou para as drogas. Era um momento em que eu precisava, pois achava que podia tudo, que não ia acontecer nada comigo, e depois comecei a me sentir mal comigo mesmo. Agora eu tenho que dar a volta por cima e provar, primeiro para mim mesmo, que eu consigo. Isso é muito importante. É matar um leão todos os dias para dizer: não, não e não.
Amizades no futebol
Não tenho nenhum amigo jogador. Fiquei muito decepcionado com muitas pessoas que estavam por perto de mim porque eu estava jogando, estava no auge e tinha dinheiro. Eu pagava tudo, para mim a coisa material é importante, mas se a gente não tiver caráter, se a gente não tiver a paz, não adianta nada.
Em Porto Alegre, em casa
Me sinto como se os torcedores do Grêmio fossem a minha família. Tenho essa história conquistada que não pode ser apagada. Esse foi o principal motivo de vir para Porto Alegre, pelo carinho que eu precisava, me fortalece, me deixa bem eu sair nas ruas e ouvir: "Poxa, Jardel, quanto tempo a gente não ganha um título". A saída de Fortaleza para Porto Alegre foi muito mais importante para mim, para a minha saúde. Com certeza quero deixar uma nova história como treinador, ou apenas deixar uma imagem de que o Jardel está bem.
Caindo na real
É um mundo diferente o de jogador, é uma paixão mundial. Ainda mais em um país em que somos os melhores do mundo, você se sente o rei onde chega, em qualquer lugar você é conhecido. Eu acho que no Brasil o jogador tem mais moral, é mais conhecido do que presidente. Aí você cai na real, passa por uma depressão e não reage, para de jogar e tem que nascer de novo. Morre, e tem que nascer um novo homem.
Ilusão
Tem uma ilusão interna, e a pessoa se engana. Você tem tudo, mas quando perde, perde a confiança das pessoas, perde no material também, e todo mundo se afasta. Eu quero ver uma pessoa chegar para te ajudar com palavras. Isso é muito complexo. Deus me deu força para ter fé para mudar. Pois estou bem e podendo dar este testemunho para as pessoas, porque no meu nível, aonde eu cheguei e depois dei aquela caída, eu posso te dizer que fui homem para reagir, ser forte para admitir o meu problema.
'Cadê os microfones?'
Existe esse baque, essa morte. Eu acho que nós morremos duas vezes nesse mundo de jogador. Quando você para, cadê as televisões? Cadê os microfones? Cadê o público? Você está sentado na arquibancada, mas quer estar lá dentro. As pessoas já não te olham diferente e você tem que botar o pé no chão e dizer: parei de jogar. Agora eu vou cuidar é de mim.
A queda e a volta por cima
Fica esse testemunho para vocês. Continua prevalecendo a minha fé diária. É o que eu posso dizer do fundo do meu coração. Isso só Deus me passa, essa paz, é só querer. É só querer, a gente consegue tudo. Eu não consegui chegar à Seleção, que era o meu sonho? Consegui ser fraco, mas também não consegui ser forte? Quando a pessoa chega ao fundo do poço financeiramente, emocionalmente, e não tem amigos, a pessoa não reage. Tem que ter fé. Sem dinheiro, sem a fama, as pessoas longe de você, é um caos. É a lei da vida, muitos falam: você vale o que você tem.
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Fonte: GloboEsporte.com (texto), Reprodução internet (fotos)