Superação
Cinco jovens e seus corações campeões
Corações valentes inspiram esperanças, mesmo quando seus corpos não parecem tão saudáveis ou bonitos quanto exigem alguns padrões de beleza. Mentes sãs em corpos aparentemente não tão perfeitos, atletas paralímpicos se especializam em mostrar sua garra a quem desanima diante de quaisquer obstáculos. Caso, por exemplo, do nadador Talisson Glock, de 18 anos, catarinense de Joinville, que compete pelo AP AN, de São Paulo — o mesmo do astro da natação Daniel Dias — e é apoiado pelo Time São Paulo, projeto pelo qual a prefeitura daquela cidade vem apoiando atletas para os Jogos de 2016.
Em 2004, aos 9 anos, ele sofreu um acidente de trem aos 9 anos e perdeu o braço e a perna esquerdos. Seis meses depois, foi convidado pelo Centro Esportivo para Pessoas Especiais (CEPE) e, em 2004, passou a dedicar-se à natação. Em 2008, começou a competir, e em 2010, foi convocado para a seleção brasileira paralímpica de natação. Também este ano, Talisson, que compete nas classes S5 e S6 (natação/amputados), terminou o Mundial de Montreal-2013 com duas medalhas de prata, e nos Jogos Parapan-Americanos Juvenis, em Buenos Aires, foi o destaque do Brasil na natação, com cinco ouros, nos 50m livre, lOOm livre, 400m livre, 50m borboleta e 100 m costas.
— Felizmente, fiz cinco provas e ganhei cinco ouros, isto é, 100% de aproveitamento — diz ele, que em 2016 terá sua primeira experiência paralímpica. — Não entrei na equipe para Londres-2012 por 0s40 do índice nos 100m costas. O Parapan Juvenil de Buenos Aires não foi o primeiro da carreira de Talisson. Sua primeira experiência na competição internacional foi a edição de 2009, em Bogotá, onde ganhou seis ouros e duas pratas. Em 2010, foi ao Mundial Adulto na Holanda, onde obteve um sexto lugar e fez duas finais B (nono ao 16º), e em 2011, foi ao Parapan Absoluto.
— Sou recordista brasileiro nos 100m livres, 50m borboleta, lOOm costas e 200m medley — contou o catarinense, que vem treinando diariamente no Parque Aquático Maria Lenk, na Barra, e ano que vem voltará a treinar em São Paulo. — Espero poder competir nas Paralimpíadas de 2016. Estou treinando para buscar o ouro e o recorde mundial nos 200m medley, a minha prova.
Parceiro de Talisson, de quem ficou amigo nas viagens internacionais, Adriel de Souza Salino, de 16 anos, mora em Nova Iguaçu. Em Buenos Aires, ele obteve duas pratas, no 50m livre e nos 100Om livre, e dois bronzes, nos 400m livre e nos 50m costas. Extrovertido, ele tem um bom humor inversamente proporcional ao seu l,10m de altura. Atleta do Vasco, Adriel sofre de nanismo:
— Este foi meu primeiro Parapan Juvenil e minha primeira competição internacional. É algo diferente porque estamos juntos com atletas de todos os esportes, como o futebol de sete, atletismo, natação, e com vários tipos de deficiência. Vários técnicos apoiam e até dão broncas. Mas isso é bom - Faz parte. Se não tiver bronca, a coisa não anda... (risos).
Brincalhão fora d'água, Adriel parte para decidir quando mergulha na piscina, seja para treinar ou competir.
— Eu me senti honrado porque é muito bom conseguir quatro medalhas na primeira vez em que se participa de uma competição internacional. Só penso em estar na seleção, bater meus recordes e trazer mais medalhas — afirma o atleta, que treina na piscina da Vila Olímpica Professor Manoel Tubino, no Mato Alto, em Jacarepaguá, porque a piscina do Vasco, em São Januário, continua interditada.
Embora sem patrocínio para a modalidade, o clube apoia alguns esportes paralímpicos, como natação, vôlei sentado e futebol de sete, este praticado pelos paralisados cerebrais. No Rio, o Vasco e o Botafogo, este vinculado ao Instituto Superar, são os dois únicos clubes de futebol que procuram dar um incentivo às modalidades paralímpicas. Em âmbito nacional, poucos clubes de futebol vêm incentivando o paralimpismo.
Também atleta do Vasco, mas no futebol de sete, João Marcos Montenegro, parali- sado cerebral, fez parte da seleção brasileira da categoria, que derrotou a Argentina, dona da casa, na final do Parapan Juvenil por 3 a 0. Resultado: ouro no peito.
— Em 2016, espero honrar nossa seleção brasileira e nosso país, e ajudar a ganhar o ouro — disse João Marcos, que na seleção teve dois companheiros vascaínos, Marcos Yuri e Felipe Ribeiro. — No Parapan, acho que nem foi tão difícil quanto nós esperávamos, porque o Brasil foi bem superior no futebol de sete.
No atletismo, Alice Corrêa, de 17 anos, e João Victor Teixeira de Souza Silva, de 19, também fizeram bonito na pista. Ambos são do Instituto Superar/Botafogo e treinam na Vila Olímpica do Mato Alto. Alice, que sofre de baixa visão (classe T12), levou o ouro nos 100m e nos 200m rasos. No currículo, já estão o bronze no salto em distância nos Jogos Escolares Britânicos 2012, o bronze no salto em distância no Meeting de Bilbao 2012. Carioca, nasceu com glaucoma e catarata, tendo conhecido o atletismo aos 13 anos a convite de uma amiga. Participou de Londres-2012 nos 100m, na qual alcançou a semifinal; nos 200m, em que foi eliminada na primeira rodada; e foi décima no salto em distância.
Considerada uma das maiores promessas do aderisrao paralímpico, Alice é uma velocista de destaque nas pistas brasileiras e sul-americanas, apontada por alguns como uma espécie de sucessora de Terezinha Guilhermino, velocista que compete nas classe T11 (cegueira total) e T12 e já tem seis medalhas paralímpicas, sendo três ouros, nas edições de Atenas-2004, Pequim-2008 e Londres-2012.
Modesta fora das pistas, Alice, que cursa o ensino médio, quer, obviamente, estar nas Paralimpíadas do Rio. Mas, ao ser perguntada sobre o assunto, mostra uma cautela oposta à grande coragem que tem nas pistas:
— Acho que os Jogos de 2016 ainda estão muito longe. Prefiro não antecipar nada. Vou vivendo um dia de cada vez.
Paralisado cerebral, João Victor Teixeira de Souza Silva, de 19 anos, é adeta de arremesso de peso e lançamento de disco, modalidade em que obteve o primeiro ouro, logo na estreia nos Jogos Parapan-Americanos Juvenis e num torneio internacional.
— Foi a primeira competição fora do país, e eu estava preparado. Achei até que se ria algo mais difícil. Não foi, mas também não foi fácil. Tive de competir comigo mesmo — comentou ele, admitindo que teve de superar a própria ansiedade. Quanto ao futuro, João Victor esbanja confiança, ao mesmo tempo em que tem priorizado a forte rotina de treinamentos no Mato Alto:
— Tenho a gana de melhorar a cada dia, e estou treinando muito para 2016.
Gigante na água
É nas raias que Adriel se engrandece
Natural de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, e atleta do Vasco, Adriel Salino sofre de nanismo. Mede 1,10m, mas é bem-humorado e não parece ter quaisquer tipos de complexo. Provavelmente, sua personalidade e seu jeito positivo de encarar a vida se devem ao esporte e mais especificamente à natação. Afinal, ele costuma dizer que, se não tivesse conhecido e se tornado praticante de esporte paralímpico, sua vida não teria senado.
— Sem o esporte, a minha vida seria insuportável — gosta de repetir.
No dia a dia, ele sai de Nova Iguaçu e vai até a Vila Olímpica do Mato Alto, em Jacarepaguá, para treinar, já que, há alguns meses, a piscina do Vasco está interditada para treinos e competições. Mesmo assim, ele e demais nadadores paralímpicos do clube mantêm a rotina de treinamentos na vila.
Fora das competições, ele atualmente, está cursando o nono e último ano do primeiro grau. Ano que vem, vai começar a cursar o ensino médio.
— Mais para a frente, quero fazer faculdade de administração de empresas — diz ele que, em sua carreira, tem o apoio do Bolsa Atleta do Governo Federal.
Craque de bola
João Montenegro dribla a dureza da vida
Aos 19 anos, o paralisado cerebral João Marcos Montenegro, atleta do Vasco, participou da seleção brasileira de futebol de sete (modalidade voltada a paralisados cerebrais) que conquistou a medalha de ouro nos Jogos Parapan-Americanos Juvenis, com uma goleada de 3 a 0 diante dos donos da casa, na Argentina.
— Foi a minha primeira participação nos Jogos Parapan-Americanos, e foi a melhor coisa que me aconteceu — declarou João, que sofre de hemiplegia (paralisia num dos lados do corpo) no lado esquerdo. — Eu jogo no Vasco desde 2011 e já tinha sido convocado para a seleção brasileira sub 20.
João faz parte de uma equipe que vem se firmando como a maior força da modalidade nas Américas, embora nas Paralimpíadas de 2012, a seleção verde e amarela não tenha subido ao pódio, mas tenha terminado em quarto lugar.
Como a profissionalização ainda não é ampla no esporte paralímpico, João Montenegro não dispõe do Bolsa Atleta. Mas espera dar entrada no pedido agora, levando em conta os resultados recentes com o uniforme da seleção. Fora dos gramados, ele está cursando o terceiro ano do ensino médio e quer fazer a faculdade de direito.