Foram 39 gols em quase dois anos vestindo a camisa do Vasco. Dois deles nas finais da Copa do Brasil de 2011, título que devolveu o sorriso ao torcedor e que levou o clube à Libertadores após 11 anos. Alecsandro, porém, viveu altos e baixos dentro de campo, que se refletiram num instável relacionamento com os cruz-maltinos. A saída em meio à crise financeira e administrativa na diretoria também não ajudou. Mas na hora do reencontro, às 21h desta quarta-feira, em Volta Redonda, o atacante só espera carinho e reconhecimento, em vez de vaias e hostilidade por ser um rival.
Com a decisão do técnico Cuca de poupar Diego Tardelli, Alecsandro deve formar a dupla de frente do Atlético-MG com Jô. Segundo o camisa 19, o torcedor de verdade guarda os bons momentos na memória. Ele se considera ídolo pela história construída e os gols decisivos. E lamenta não poder voltar a São Januário, onde inclusive vê o Vasco muito mais forte.
- Lembro de um jogo só em que a torcida me vaiou e depois até aplaudiu. Fiquei triste pelo jogo ter mudado de local, mas, por outro lado, para nós é um fato a ser comemorado, porque eles vão perder parte da força. Quanto à reação, a torcida reconhece seus ídolos. Pode até se enganar em alguns momentos de raiva, mas sabe que esse ou aquele jogador fez um gol de título. Para mim, foi muito mais positivo, a passagem toda foi boa. É um clube que me levantou profissionalmente e agradeço muito ao Vasco por isso - afirmou, por telefone.
Nas palavras do atacante não há mágoa pelas promessas não cumpridas e pela dívida acumulada especialmente ao longo do segundo semestre de 2012 que ainda não foi paga. Primeiro titular a deixar o clube com o fim do último Brasileirão, Alecsandro garante que gostaria de ter permanecido e até encerrado a carreira no Rio. Mas as dificuldades internas, somadas à proposta do Galo, único brasileiro vivo na Libertadores, mexeram com ele.
- O Vasco foi um lugar que eu nunca quis sair. Não passava na minha cabeça até um certo momento. Mas aconteceu pelo problema financeiro e pela proposta do Atlético. Teve um amigo que disse: "Graças a Deus você saiu do Vasco". Eu respondi: "Graças a Deus, nada. Se eu pudesse, ficaria o resto da vida, porque sei o que representa o Vasco". Estava adaptado e feliz, com o clube crescendo. Comentaram que eu sairia através da Justiça, mas só faria isso em último caso, não queria mesmo. O René (Simões, diretor de futebol) conversou comigo, é meu amigo pessoal, jantei com o presidente (Roberto Dinamite) várias vezes. O que pesou foi o Atlético ter sido vice-campeão brasileiro, estar na Libertadores. Foi uma escolha profissional necessária, nada diferente disso. Lógico que ninguém gosta de ficar sem receber, mas só fiquei chateado com a maneira como foi falado na imprensa. Confesso até que na hora de assinar a rescisão foi complicado - conta.
Com a iminência do desmanche do elenco cruz-maltino, os medalhões que sobrassem teriam a responsabilidade de comandar esta transição. Mas o jogador não via com bons olhos.
- Fiz duas temporadas no Vasco e conheço a dimensão. Sabia que as contratações iriam acontecer, mesmo com as dificuldades. Ficamos na expectativa sobre quem iria ficar, mas a saída dos outros não me influenciou. O René até falava comigo: "Dentro de campo, não tenho o que falar, porque sei que você será decisivo quando for preciso. Mas precisarei de você fora também. Talvez seja até capitão com o novo treinador". Só que pela minha forma de ver as coisas, não sei se eu conseguiria justificar, reclamar, seria desgastante para mim. Poderia até arrumar briga com diretores. Passado um tempo, se eu estivesse no Vasco, poderia estar ajudando, sim. Mas só me resta desejar boa sorte a todos. Posso abrir a boca e dizer que saí pela porta da frente. Entrei feliz e saí assim também, com amigos. Criei um vínculo eterno e vamos ver como vai ser daqui para frente - ponderou.
Alecsandro explica que não houve "sacanagem" por parte do elenco na reta final, em que o clube chegou a sofrer seis derrotas consecutivas. E acredita que foi prejudicado por ter sido apontado como um dos principais culpados por ter se exposto em algumas opiniões, como quando disse que se sentia desvalorizado por causa do noticiário negativo à época e que treinar no CFZ era melhor para evitar pagar o pedágio da Linha Amarela, que liga o bairro da Barra da Tijuca à Zona Norte, onde fica São Januário, num trajeto mais longo.
- A gente continuou correndo, fazendo tudo, mas fomos pegos de surpresa com algumas coisas que não aconteciam. Não era querer fazer sacanagem. O bloqueio de receitas, as dívidas, isso tudo mexia com o dia a dia. Pela proximidade com o presidente, eu sabia os motivos, o que se passava, e muitos deles (jogadores), não. Fui mal interpretado naquela situação. Reconheço que parte foi na ironia, mas não era para expor nem abrir confronto com a diretoria. Pedi desculpas ao presidente depois. Dei uma boa entrevista, mas dei uma derrapada no final, fiz uma brincadeira infeliz. Todos sabiam das dificuldades, não falei novidade. Eu seria a última pessoa a colocar tudo para fora. Acabou me prejudicando, o torcedor ficou incomodado com as atuações e também pode ter achado que eu falava demais. Mexeu com a minha imagem, mas o verdadeiro torcedor viu que eu não deixava de lutar, de procurar fazer meus gols mesmo quando a fase era ruim - lembra.
Atualmente na reserva, Alecsandro rejeita o rótulo de amuleto. Espera ter mais chances para marcar seu nome no clube e aumentar a média de gols - são três em 18 partidas, mas foi titular apenas cinco vezes, em função da ótima fase de Diego Tardelli e Jô. Ele é o quinto maior artilheiro do Brasileirão após o ínicio da era dos pontos corridos, com 79 gols.
- Nunca quis ser amuleto, sempre pude ser titular por onde passei. Conquistar título jogando, que é o mais importante. É uma situação que tenho de entender, respeitar, mas não posso concordar. Tenho que estar infeliz com a situação. Quando me contentar com a reserva, vou parar. Mesmo o time estando bem, é um pensamento meu. Mas o futebol muda a todo momento. Enquando achar que estou ajudando, vou ficar e me sentir bem. Sei que a diretoria conta comigo, os jogadores e o Cuca, também - encerrou.