A cabeça está toda branca, o tornozelo operado, protegido por uma tala especial, ainda incomoda e uma muleta preta tem sido companheira inseparável. O desgaste físico é evidente, mas não é nada perto da dor que o presidente Roberto Dinamite sentiu no coração ao ser xingado pela mesma torcida que o transformou no maior ídolo da história do Vasco. Aos 59 anos, completados no sábado, Roberto está ferido, mas continua de pé.
— Ser xingado como fui no jogo contra o Botafogo em Volta Redonda me deixou triste, chateado. É duro. Mas o Vasco está acima de tudo. O desafio continua, e vamos pôr o Vasco no seu devido lugar. Não tem esta coisa de cachorro morto — desabafou.
Difícil mesmo tem sido organizar o dia a dia. São tantos compromisso, tantos problemas, que é quase impossível cumprir à risca sua agenda. Na última quarta-feira, por exemplo, estava prevista uma entrevista ao GLOBO às 11h, em São Januário. Como antes tinha um encontro na sede da CBF, na Barra da Tijuca, Roberto só apareceu no clube depois das 13h. O dirigente pediu desculpas pelo atraso e abriu o coração durante duas horas, numa conversa franca na sala da presidência. Nesse período, atendeu a dois telefonemas da filha Tatiana. Como o celular não parava de tocar, achou melhor desligar o aparelho.
Se não tivesse sido reeleito em 2011, provavelmente Roberto estaria com a vida mais tranquila. Mas em 2011, depois de o Vasco ter conquistado a Copa do Brasil e terminar o Campeonato Brasileiro em segundo lugar, entendeu que ainda não era hora de ir embora. Foi quando a base que o levou à presidência começou a ruir.
Roberto tem consciência de que foi escolhido para enfrentar o ex-presidente Eurico Miranda por causa de seu carisma, de sua história no Vasco. A estratégia deu certo e muita gente achou que o ídolo já tinha cumprido seu papel. O grupo político que o conduziu à presidência queria que o empresário Jorge Salgado fosse o candidato em 2011. Só faltou combinar com Dinamite:
— Ninguém me falou que estavam pensando no Jorge Salgado. Quando soube, já era tarde. Tinha convicção de que poderia melhorar a vida do clube — explicou o dirigente, que não sabe ainda se tentará mais uma reeleição em 2014. — Não estou pensando em eleição. Há coisas muito mais urgentes para eu me preocupar.
Como, por exemplo, a enxurrada de ações trabalhistas que tem sufocado o clube. Todo dia surge uma nova. A ex-jogadora de vôlei Márcia Fu, que defendeu o Vasco no fim da década de 90, é uma das credoras. No total, são quase três mil ações de ex-funcionários e ex-atletas.
— Tem ação do Hélio Rubens, da Fernanda Venturini, do Rodrigo Pessoa. Outro dia estava no shopping em uma cara veio falar comigo. Era o Schumacher, do futsal. Ele disse, com toda a educação, que o Vasco ainda devia dinheiro a ele. Só me restou lamentar e falar para ele ir atrás de seus direitos na Justiça. Não é fácil ouvir isso de um ex-atleta do clube.
Um das acusações que os antigos aliados fazem contra Roberto é que o ídolo mudou sua postura e passou a interferir em todos os setores do clube. O presidente se defende e diz que apenas quer participar de todo o processo e não receber a coisa pronta, como, segundo ele, acontecia até o ano passado.
— Discordo. Apenas quero saber o que estão fazendo. Outro dia, vi que estava vazando água num setor do clube e pedi que fosse providenciado o conserto. Começaram a dizer que eu estava me metendo em tudo. O Vasco é uma democracia, e ninguém é obrigado a fazer o que não acha certo. Mas dizer que perderam a autonomia... Quem saiu, saiu porque quis — afirmou o cartola.
Sem a base aliada, Roberto contratou profissionais para áreas estratégicas do clube. Dinamite garante que, mesmo fragilizado politicamente, jamais pensou em se reaproximar do ex-presidente Eurico Miranda, hoje presidente do Conselho de Beneméritos.
— Não tenho acordo com ninguém no clube. O Eurico preside o Conselho e frequenta o clube. Minha relação com ele é formal. É bom dia, boa tarde, boa noite — garante.
Deputado estadual com cinco mandatos, Roberto Dinamite cometeu um erro no Vasco que um político experiente como ele deveria evitar de qualquer maneira: empregar parentes no clube. Nepotismo que ele nega veementemente.
— O Vasco tem 630 funcionário, e apenas três são ligados a mim: Leonardo (cunhado), que é meu assessor, Vitor (sobrinho), que trabalha no futebol da base, e Gérson (genro), que organiza as nossas viagens. Eles sequer são meus parentes. Parente, para mim, é mulher, filho, irmão, pai e mãe. Mas estou pensando se vale a pena continuar com eles. Sei que não tem influência alguma no dia a dia do Vasco, mas gera muito desgaste.
A campanha ridícula do Vasco na Taça Rio — penúltimo colocado no Grupo A e já sem chances de disputar o título — expôs a fragilidade do time, que a boa campanha na Taça Guanabara tinha escamoteado. Agora, a realidade tem se mostrado dura. Roberto reconhece que o time não está à altura das tradições do Vasco.
— O Vasco foi muito bem na Taça Guanabara e depois a coisa desandou. O time não é fraco, mas precisamos de três ou quatro jogadores para a disputa do Brasileiro — disse.
Pressionado por todos os lados, Roberto Dinamite não baixa a guarda. Garante que o Vasco não será mais rebaixado e tem certeza de que em pouco tempo o clube estará no rumo certo. Admite que caminhada será dura, mas confia na sua história para recolocar o Vasco no caminho das vitórias:
— Meu nome é a coisa mais valiosa que possuo.
Fonte: O Globo