É fato notório e indiscutível a todos que acompanham o remo que o Vasco da Gama se consolidou nos últimos anos como a terceira força do esporte no Rio de Janeiro. Enquanto Flamengo e Botafogo brigam de maneira intensa pelo primeiro posto (no momento, após décadas de domínio cruzmaltino e rubro-negro, com uma pequena vantagem para o Alvinegro), o Gigante da Colina tem enormes problemas. Faltam recursos financeiros e estrutura física adequada, e, portanto, houve uma debandada de atletas para dois outros dois clubes supracitados. Entretanto, ironicamente, os maiores atletas em atividade no Rio de Janeiro são vascaínos. Trata-se dos argentinos Ariel Suárez (33 anos) e Cristian Rosso (29), que chegaram ao clube após contato de amigo deles na Argentina com o treinador Marcelo Neves.
Ariel conta quando começou a dupla e sobre perspectivas para Rio-2016:
- Começamos a remar juntos em meados de 2010, e agora pensamos em seguir pelo menos até Rio de Janeiro-2016. Pensamos, como sempre, em medalha, e me sinto feliz em estar remando na cidade esportiva mais importante do mundo atualmente.
O pouco tempo de parceria surpreende por tão bons resultados. Estrearam juntos em uma competição internacional na etapa da Copa do Mundo de Lucerna (SUI), em 2010. Em 2011, conquistaram vaga para Londres 2012, quando chegaram ao ápice da parceria. Entretanto, para assustar mais ainda, Ariel contou um importante detalhe de sua vida à nossa equipe:
- Cristian e eu somos diferentes. Ele começou ainda menino, já eu comecei a remar com vinte anos. Não conhecia esporte, não sabia nadar. Está tudo na cabeça e no coração. Se um não quer, o desempenho não chega.
Os títulos da dupla são muitos. Juntos, foram ouro nos Jogos Pan-Americanos de Guadalajara (MEX), disputados em 2011, no Double Skiff e no Four Skiff. O remo argentino é fortíssimo, e conquista ótimos resultados nos Jogos Pan-Americanos. Ariel ainda tem mais uma medalha pan-americana além da edição mexicana, curiosamente no Rio de Janeiro, em 2007. No Double Skiff, Suárez faturou a prata ao lado de Rodrigo Murillo, ficando atrás da dupla cubana. Ariel ainda faturou o bronze no Oito Com em Guadalajara. Em 2011 conquistaram a primeira medalha internacional da dupla levando a prata na 2ª etapa da Copa do Mundo em Hamburgo. Tudo isso além, é claro, de diversos outros títulos de menor, mas significativa, expressão. O maior feito não se pode dizer que foi um título, porém quase foi uma medalha olímpica. Trata-se do quarto lugar nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, no Double Skiff. O que talvez mais machuque os remadores seja, embora tenham chegado a Londres com o objetivo de chegar à final, que foram a ela classificados da semifinal com o melhor tempo. Entretanto, ficaram muito perto, a dois segundos e um centésimo do bronze. Por outro lado, o balanço feito pelos remadores após os Jogos foi extremamente positivo, já que treinavam com o objetivo de chegar a uma final olímpica, embora com o decorrer das competições a medalha tivesse se tornado bem possível. Entretanto, lamentações de lado, em entrevista logo após o feito ao site oficial do Vasco, Ariel ressaltou um fato importantíssimo: o melhor barco de toda a América Latina era vascaíno:
- Por pouco não conseguimos medalha e lamentamos muito por isso. A boa notícia é que o Vasco é o melhor barco de toda a América Latina e o quarto melhor do mundo. Quero agradecer ao meu clube por fazer parte deste sonho olímpico.
Diante do quadro precário do remo vascaíno, fica a pergunta: como os maiores remadores em atividade no Brasil continuam no Vasco? Diferentemente da maioria dos atletas, eles têm uma boa condição financeira onde moram, na Argentina, e não se balançam com uma ou outra proposta mais vantajosa. Ao ouvir a pergunta, Ariel sorri e conta que já recebeu convites de clubes do Rio de Janeiro com melhor estrutura. Mas também fala que o afeto pelo clube é decisivo para que tenha permanecido. Cristian complementa, exclusivamente ao ‘CRVG – Em Todos Esportes’/SuperVasco, e ressalta que por seu tamanho e tradição o Vasco tem tudo para voltar aos bons tempos:
- Como Ariel falou, nos sentimos parte da família do Vasco. Estamos acostumados na Argentina a ter um afeto muito grande ao clube em que competimos. Na Argentina não se está pensando em mudar de clube, nunca. Se tiver alguma dificuldade, alguma adversidade, trata-se de superá-la, de melhorar, mas nunca mudar de clube. Então esse mesmo sentimento que temos por nosso clube na Argentina começamos a ter aqui no Vasco. E, seguramente, por ser um clube tão antigo e com tanta tradição, superará esse momento de dificuldade e no futuro voltará a ser o melhor clube do Brasil – acredita Rosso.
A importância dos multicampeões como espelho para a base
No momento do remo do Vasco, que diante da escassez dos recursos busca apostar nas categorias de base, ter dois ícones como esses na garagem é, indubitavelmente, um baita exemplo para os jovens. De maneira exclusiva ao ‘CRVG – Em Todos os Esportes’/SuperVasco, o treinador do remo vascaíno, Marcelo Neves, que possui muitos anos de casa, comenta sobre o momento do remo vascaíno e, sobretudo, fala sobre a importância de ter Ariel Suárez e Cristian Rosso, dois finalistas olímpicos, na garagem:
- No momento não estamos participando de todas as categorias, em função das nossas condições - vários atletas saíram nos últimos dois anos. Então nós estamos muito mais voltados para as categorias de base do que ao trabalho em cima. Estamos buscando condições para que no futuro possamos ter atletas nessas categorias para que possamos, talvez não nesse ano, mas nas regatas de 2014, representar o Vasco em todas as categorias. Nós, mesmo não estando disputando o campeonato na categoria aberta, optamos por manter os dois argentinos, que são finalistas olímpicos e têm uma positividade que causam dentro da garagem, pelo exemplo que eles representam na garagem: disciplina, talento deles, para mostrar aos nossos que é possível chegar onde eles estão, que não é nada de outro mundo, que através de muito trabalho e muita disciplina eles vão conseguir chegar lá.
Na primeira regata do Estadual, disputada no último domingo (24/03), o Vasco da Gama ficou em terceiro no geral, e os argentinos estavam na prova de four skiff aberto. Marcelo fala sobre o privilégio exclusivo de jovens vascaínos de remar ao lado de finalistas olímpicos, reiterando a necessidade de mantê-los.
- Eles estão correndo com garotos que saíram da equipe de junior. Pode ser que o resultado deles nessa competição não seja favorável, são dois garotos muito novos. Mas olha a importância dessa possibilidade para esses garotos. Não existe nenhum atleta no Rio de Janeiro e no Brasil tendo esse tipo de possibilidade: competir dentro do mesmo barco com dois finalistas olímpicos. Então isso é muito importante para o desenvolvimento desses garotos. Aí eu já explico a necessidade de mantê-los.
Marcelo falou com nossa equipe antes da regata. O que valoriza ainda mais o feito vascaíno – 3° lugar na prova – no Double Skiff Aberto, vencido pelo Botafogo com atletas como Anderson Nocetti e Diego Nazário, é que, por imprevistos, um atleta master esteve no barco vascaíno. Além dos argentinos, o jovem Marcos Ibiapina e Osvaldo Kuster Neto, o lendário Vaval, compuseram o barco, o que torna totalmente compreensível e até elogiável a terceira colocação.
Em suma, os vascaínos devem se orgulhar de os maiores remadores em atividade no Brasil, quiçá na América Latina, serem atletas do Club de Regatas Vasco da Gama. E, mesmo com as dificuldades do clube, permanecem e servem como espelho aos jovens remadores cruzmaltinos. A permanência dos atletas é importantíssima.