O autógrafo sai sem o capricho de outros tempos, mas é contemplado como o gol plástico de uma vitória. Com a canhota, Ricardo Gomes vai compensando o estrago que o AVC de 2011 lhe causou no lado direito do corpo. Além de ter aprimorado a escrita com a mão esquerda, o diretor-técnico do Vasco já consegue correr na esteira por dois minutos de extrema alegria. Perdeu a fluência no francês, mas arremata as deficiências verbais gastando o melhor de seu português:
— Paralelepípedo. Ah, dessa vez, consegui (risos). Tenho dificuldade em pronunciar palavras grandes — diz.
Tropeçando em algumas palavras sem cair, o diretor-técnico está gastando saliva para formar um time à altura das tradições. O otimismo que lhe sobrou quando estava no hospital sem conseguir pronunciar sílaba alguma é, agora, aplicado na carreira do momento. De reunião em reunião, Ricardo garante que Dedé em breve terá a companhia de um jogador do Vasco na seleção. Ou de dois.
— Temos que encontrar um segundo jogador para a seleção. Se não acharmos aqui, vamos contratá-lo. Não conseguiremos ninguém já pronto, mas podemos formá-lo, como fizemos com o Dedé. E, se bobear, ainda vamos mandar um terceiro jogador para o Felipão. Pouco antes do Brasileiro, você me faz de novo essa pergunta? Acho que vem mais gente aí.
A sensibilidade está voltando e, com ela, o sonho de novamente comandar um rachão no gramado, seu habitat naturalmente preferido.
— Sinto saudade. Fico olhando, só na vontade. Ao mesmo tempo, tenho que fazer o melhor que posso pelo Vasco. Espero voltar (a ser treinador) daqui a um ano, um ano e meio, mas quero muito ter resultado agora. Só que não há a certeza de que vou me recuperar.
Enquanto convive com a saudade imortal das chuteiras, Ricardo sonha carimbar com um título sua passagem como diretor-técnico. Uma boa estreia na Taça Rio, neste domingo, contra o Volta Redonda, pode ser o atestado de saúde do time que ajudou a montar:
— É um jogo complicadíssimo. Teremos a expectativa dos jogadores pela recuperação e, também, a bronca da torcida. Mas estamos em casa. O Botafogo ganhou a Taça Guanabara porque jogou muito melhor. Apenas isso — sintetiza.
Tal diagnóstico, tão simples e direto, aponta para a cura a curto prazo das feridas abertas na decisão do primeiro turno. Neste domingo, será dia de novo exame. E, se tomar Ricardo Gomes como exemplo, o Vasco poderá, quem sabe, se recuperar como um paciente duro na queda.
— Nunca fiquei deprimido. Só tenho a agradecer, depois de ter ficado um tempão na cama, sem conseguir falar. Já reconheço minha voz, que, antes, estava mais esquisita. Recuperei a sensibilidade no ombro e, quase, no cotovelo. Mas falta a sintonia fina. Tenho que estimular os neurônios. Eles têm que se ligar. Se dormirem, já era.
Tal criador, tal criatura. A situação do renovado time do Vasco não é diferente. Se dormir, já era...
Fonte: Extra Online