O sorriso no rosto, os braços abertos e o aperto de mão caloroso são o cartão de visitas de quem passou a semana toda relutando em dar entrevista. Ao contrário do que ocorre normalmente no futebol, em que muita gente não desperdiça a chance de aparecer em momento de decisão, o carioca Ricardo Gomes Raymundo, de 48 anos, por temperamento, humildade, lealdade e educação, faz questão de dizer que o momento é dos jogadores, do técnico Gaúcho, e de toda a comissão técnica do Vasco. “Os verdadeiros artistas do espetáculo”, na sua avaliação. Nem tanto. Do mais modesto funcionário, passando por jogadores, aos companheiros da comissão técnica, todos reconhecem a importância do trabalho do novo diretor-técnico nos bastidores na formação da nova equipe.
As palavras saem com admiração da boca do preparador de goleiros Carlos Germano, um dos grandes ídolos do clube como jogador e que pensa em mudar de função e virar treinador nos próximos cinco anos.
— Ricardo é o nosso ponto de equilíbrio. Todos confiam e acreditam nele. As pessoas não têm ideia do que se aprende num papo com ele — afirma.
Tristeza em 1994
Ricardo surgiu no Fluminense no início dos anos 1980, logo chegou à seleção brasileira e ganhou o futebol europeu, defendendo o Benfica e o Paris Saint-Germain. Nessa trajetória, uma frustração. Era o capitão da seleção brasileira que se preparava para a Copa de 1994. Há poucos dias da estreia contra a Rússia, num jogo treino contra El Salvador, sofreu lesão muscular séria e foi cortado há menos de uma semana da partida.
— Pois é, tive títulos importantes, mas não consegui o tetra pela seleção brasileira em 1994. Vamos ver o que o futuro reserva — diz, sem mágoa, mas revelando a tristeza por não ter vivido em campo aquele momento.
Como treinador, Ricardo andou por vários clubes, tendo como marca principal ideias novas e arejadas, aprendidas tanto na prática como em estudos na Europa. Ele chegou ao Vasco em 2011 e levou o time à conquista da Copa do Brasil.
De origem portuguesa, o técnico vivia um dos seus melhores momentos em São Januário quando, no dia 28 de agosto, sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC), durante o jogo Vasco x Flamengo no Engenhão. Poderia ter morrido. Sofreu um golpe duro. A reação foi ao seu estilo. Não reclamou, suportou o tratamento e algumas sequelas até voltar ao Vasco em 14 de novembro de 2012, como diretor-técnico.
Confiança de Dedé
Chegou em meio a uma grave crise financeira, com saída de jogadores importantes e tateando na nova função. Pois bem. Não só conseguiu impor seu estilo discreto e conciliador, como foi moldando a construção do novo grupo com a ajuda de todos.
— Eu aponto caminhos na parte tática, técnica e disciplinar. Mas não me imponho ao Gaúcho. É dele a decisão no que se refere ao campo. Na Europa, muitos diretores-técnicos passam por cima do treinador. Mas não é este o meu estilo. Gosto de ouvir e trocar ideias para achar a melhor solução — afirma Ricardo Gomes.
A formação do novo time foi um desafio encarado dentro deste espírito aberto, no qual todos podem se manifestar. Como o capitão Dedé.
— A pessoa que eu escuto de verdade é o Ricardo. Já recebi propostas de outros clubes, vários conselhos, mas quem me passa confiança é ele — diz o zagueiro.
Conversando com um e outro jogador, Ricardo passou a semana preparando o time para a semana decisiva. Ele dá a pista do trabalho nesta área.
— Para alguns, é importante passar tranquilidade. Já outros precisam de uma balançada. É direcionar o jogador para fazer o que tem de melhor — ensina.
Fonte: O Globo