E DONIN DISSE NÃO
Wevergton Brito Lima*
Caros amigos, escrevo este pequeno relato a pedido de alguns vascaínos que desejam conhecer com mais detalhes o que de fato aconteceu na reunião do dia 04 de fevereiro, que aprovou as contas de 2011 da diretoria administrativa.
Sempre que escrevo um texto sobre a política interna do Vasco penso no vascaíno que não está acostumado com seus meandros e procuro, portanto, abordar o tema da forma mais didática de que sou capaz. Também nunca é demais lembrar que qualquer relato, por mais imparcial que pretenda ser, é sempre impregnado das opiniões, conceitos e até pré-conceitos de quem escreve, não sendo, portanto, nunca a única visão possível do acontecimento, embora este meu texto pretenda ser o mais objetivo possível.
A reunião do dia 4 de fevereiro tinha dois pontos de pauta: o primeiro seria a deliberação sobre as contas da diretoria administrativa de 2011; o segundo, tratar da reestruturação do plano de sócios. Como se vê, dois temas relevantes.
Infelizmente, o segundo ponto de pauta foi retirado logo no início da reunião, a pedido de um conselheiro da situação. A mesa acatou o pedido e justificou, através do primeiro-secretário, Antônio Carlos Pereira, que não se poderia debater o item 2 pois a Diretoria Administrativa não remeteu para o Conselho de Beneméritos nem para o Conselho Deliberativo qualquer proposta de reajuste do plano de sócios. Ressalte-se que em outubro de 2012 a Diretoria Administrativa se comprometeu a pedir a convocação do Conselho Deliberativo para debater o plano de sócios, passam-se quatro meses e o ponto é simplesmente retirado de pauta sem nenhuma justificativa.
Passou-se então à discussão sobre a aprovação das contas de 2011.
Para que se entenda melhor este ponto da reunião do último dia 4 é necessário fazermos uma rápida retrospectiva.
3 de setembro de 2012 - O Conselho Fiscal, por unanimidade, vota pela reprovação das contas de 2011. Lembrem-se que o Conselho Fiscal do Vasco é constituído por dois membros indicados pela situação, atualmente: Helio Cezar Donin (presidente) e Antonio Barrozo Filho (membro efetivo) e por um membro representando a oposição: João Marcos de Amorim (membro efetivo).
27 de dezembro de 2012 - O Conselho Deliberativo decide, atendendo ao pedido da diretoria administrativa, dar mais 60 (sessenta dias) de prazo para que o balanço fosse corrigido, a partir das indicações do Conselho Fiscal.
23 de janeiro de 2013 - O Conselho Fiscal volta a analisar as correções feitas e decide, de novo por unanimidade, “manter o parecer do dia 3 de setembro de 2012”, ou seja, pela reprovação das contas.
Reproduzo a “Conclusão” do Conselho Fiscal sobre “as correções”, documento este enviado a todos os membros do Conselho Deliberativo e assinado pelos três membros do CF:
“O Conselho Fiscal ressalta que seguiu critérios estritamente técnicos na elaboração dos resultados desta análise sobre as correções do Balanço Patrimonial e das Demonstrações do Exercício de 2011 publicados em 28 de abril de 2012, resguardando-se de emitir qualquer opinião que não estivesse embasada em documentação apresentada (ou na falta desta) ou de fazer qualquer juízo de valor.
Este Conselho mantém a opinião do Parecer de 3 de setembro de 2012 em razão do não atendimento aos apontamentos das não conformidades constantes dos itens 3 e 4. (grifo meu)”
25 de janeiro de 2013 – O presidente em exercício do Conselho Deliberativo, Roberto Monteiro, convoca a reunião do dia 04 de fevereiro.
A partir da decisão do Conselho Fiscal de reiterar a reprovação das contas, desencadeou-se uma operação vergonhosa, que podemos chamar de operação “tergiversação”. Através de toda sorte de sutis pressões, arrancou-se de Donin (que como conselheiro é membro da situação e como presidente do Conselho Fiscal age como magistrado) toda sorte de elogios à diretoria administrativa, elogios estes que eram amplamente divulgados para o mundo vascaíno, visando confundir o que estava realmente em debate: o parecer unânime do Conselho Fiscal, pela rejeição das contas.
“Nós mantemos a opinião do Parecer de 3 de setembro de 2012”, dizem unanimemente os membros do CF. E qual o parecer de 3 de setembro de 2012? Enfaticamente pela reprovação das contas. É possível alguma outra interpretação da conclusão tão clara do Conselho Fiscal?
Pois, pasmem caros vascaínos, mas a operação “tergiversação” seguiu a todo vapor até mesmo na reunião do dia 4, diante de um constrangido Helio Donin, que estava na mesa diretora ao lado do representante da Diretoria Administrativa, Antônio Frutuoso Peralta.
Tentou-se a todo o custo confundir os conselheiros dizendo que o presidente do Conselho Fiscal estava apoiando a aprovação do balanço. Donin, acuado, não dizia claramente sua posição, que no entanto estava registrada e distribuída com sua assinatura aos conselheiros.
Enquanto alguns oradores buscavam confundir, outros tentavam esclarecer. O vice-presidente do Conselho Deliberativo, Roberto Monteiro, fez a melhor fala da noite.
Lembrou ele que as contas do primeiro ano da administração Dinamite tiveram parecer contrário do então presidente do Conselho Fiscal, Hércules Figueiredo e do Jaime Loureiro (representante à época da oposição). Na ocasião Helio Donin, que também era membro do CF representando a situação, divergiu, e apresentou um relatório em separado propondo a aprovação das contas com ressalvas. “Na ocasião, recordou Roberto Monteiro, tínhamos dois pareceres técnicos, os dois assinados por pessoas reconhecidamente honestas e vascaínas, e que divergiam quanto à conclusão. Isto permitiu que eu encaminhasse um voto político de confiança em uma administração que recém iniciava sua gestão. Hoje, por unanimidade, o Conselho Fiscal, presidido pelo mesmo Helio Donin, recomenda a rejeição das contas, enumerando várias irregularidades, falhas e até mesmo suspeita de falsificação de documentos. Quem agora pode acusar o Donin, ou qualquer outro membro do CF de ter má vontade com a diretoria administrativa? O Donin não é o mesmo de 2009, que recomendou naquela oportunidade, aprovar as contas com ressalvas? Hoje, porque o Donin não recomendou sequer que se aprovasse com ressalvas? Porque o que está acontecendo de incompetência e má gestão em nosso clube é tão grave que ele e seus pares do Conselho Fiscal corretamente decidiram não coadunar com uma decisão que pode manchar suas biografias. Os conselheiros que estão aqui presentes e conscientemente votarem pela aprovação, sem dúvida estarão manchado as suas.”
No entanto Peralta, em sua intervenção, repetia, ao lado de Donin, que este estava satisfeito com o balanço enquanto conselheiros da situação frisavam o mesmo no salão acrescentando que o presidente do CF era da opinião de se aprovar o balanço.
A coisa chegou a tal ponto que proporcionou uma cena patética, que resume de forma melancólica o que foi a reunião do dia 4. Quando se procedeu a chamada nominal para que os conselheiros dissessem “sim” ou “não” à aprovação das contas, um veterano conselheiro, membro da situação e pessoa acima de qualquer suspeita em relação a sua honestidade e amor ao Vasco, adiantou-se e bradou “Voto sim de acordo com a orientação do Donin”. O que este conselheiro não esperava é que poucos segundos depois foi chamado o nome do próprio Donin, que teve que declarar o seu voto abertamente e para que todos ouvissem. A atitude de Donin me faz pensar que o ideal é que um homem seja corajoso durante todo o tempo. Mas se isso não for possível, que seja corajoso a maior parte do tempo. Mas se ainda assim isso não acontecer, que seja corajoso pelo menos nos momentos cruciais. Donin, foi corajoso durante a maior parte do tempo, fraquejou diante de uma torrente de pressões e afagos, mas no momento crucial, o presidente do CF pensou em seu nome, em seu passado, em seus colegas de Conselho Fiscal, enfim, em sua dignidade, e Donin disse não!
Peralta fez um gesto de desagrado e imediatamente olhei para o meu amigo conselheiro, que pouco antes votara a aprovação das contas referenciando-se no Donin. Ele tinha abaixado a cabeça e se encaminhava desolado para perto da parede. Deveria estar refletindo sobre o quanto foi ingênuo ao não perceber todo o jogo de cena que se fazia em torno de um parecer tão claro que não admitia qualquer divergência em sua interpretação.
Ao final, vitória da situação, por 76 a 66 (ou 76 a 67, não sei). É o tipo de vitória que desmoraliza qualquer vencedor. Faz-me lembrar o grande Darcy Ribeiro: “Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu".
Quando o placar foi anunciado, membros da situação cantavam “O Vasco é o time da Virada”. Comemoravam não se sabe bem o quê. Alguns, provavelmente a manutenção de suas carteirinhas de diretores e vice-presidentes.
Para quem fica triste com este cenário um recado: Seja sócio. Participe e ajude a mudar os rumos da nossa nau. Eu sei, o programa de sócios está desativado e provavelmente isto é proposital, mas vamos pressionar e quando o programa reabrir vamos dar um jeito de participar pois o Vasco é o verdadeiro time do povo e só o povo vascaíno pode salvar o Vasco.
*Wevergton Brito Lima é jornalista, Sócio do Vasco há 30 anos e membro do atual Conselho Deliberativo
Fonte: O Gigante de Sangue Novo