Quanto (e como) cada clube ganha com fornecedores de material esportivo
Protegidos por cláusulas de confidencialidade, nenhum contrato entre clubes e fornecedoras de materiais esportivos é divulgado ou confirmado oficialmente. Mas o NEGÓCIOS FC buscou contratos, conversou com fontes de clubes e empresas e levantou quanto cada um dos principais times do Brasil ganha.
Em dinheiro, efetivamente, a cada ano.
Quando analisados clube a clube, há diversos fatores que explicam as quantias recebidas. Mas, antes, é razoável entender como funciona um contrato de fornecimento de materiais esportivos, porque todos eles têm diferenças, variáveis, mas em geral são divididos em itens em comum.
E uma comparação, para ser válida, precisa considerar as mesmas bases.
- O patrocínio, também chamado de taxa de licenciamento por alguns dirigentes e descrito como honorários anuais em alguns contratos, representa uma verba que a empresa paga ao clube para que ganhe o direito de ser sua parceira;
- Os royalties são uma porcentagem sobre as vendas de uniformes daquele clube que é repassada em dinheiro. No Brasil, costuma estar entre 8% e 16% da receita líquida ou da bruta, dependendo da negociação, e na maioria dos contratos há uma garantia mínima, um valor que será pago independentemente do desempenho das vendas, mas que pode ser incrementado;
- Os materiais esportivos são as peças que serão utilizadas por todas as equipes do clube. Não apenas a de futebol profissional, mas as categorias de base, outras modalidades esportivas etc;
- O bônus por resultado, como o nome sugere, é uma verba paga ao clube como recompensa por ter vencido certo campeonato, seja estadual, nacional, continental ou internacional;
- A verba de marketing é um dinheiro que é usado pelo clube e pela fornecedora para realizar ações promocionais, eventos, entre outros, com o intuito de promover ambos;
- As luvas, por fim, são um valor pago em dinheiro na assinatura do contrato, uma bonificação que a equipe recebe pelo início da parceria.
A comparação entre os acordos leva em consideração somente patrocínio e royalties, pois são os únicos itens que representam uma receita anual em dinheiro sem nenhuma restrição de uso.
O clube pode utilizá-lo para contratar um jogador, para aumentar o salário do ídolo que pretende manter no elenco ou para investir na finalidade que julgar apropriada.
Os materiais esportivos, para que haja uma dimensão de quanto eles representam no contrato, podem ser multiplicados pelo valor de cada unidade. Mas esta é uma conta que gera confusões.
Em uma negociação hipotética, o clube pode multiplicar o número de peças pelo custo de cada uma delas, em média R$ 40, para que o contrato pareça menor e ele se sinta no direito de exigir um patrocínio maior. A fabricante, do outro lado da mesa, pode multiplicá-lo pelo valor de atacado, em média R$ 70, o preço que lojistas pagam para revendê-las, para que pareça maior.
Não há consenso.
O bônus, por mais que seja dinheiro, só é depositado na conta bancária do clube se o resultado for obtido. Como nenhum dirigente do mundo pode garantir que seu time será campeão estadual, do Campeonato Brasileiro, da Copa Libertadores e do Mundial de Clubes na mesma temporada, usar bônus por resultado para engordar contratos é, no mínimo, bizarro.
A verba de marketing, quando existente, chega a no máximo R$ 1,5 milhão, caso de Corinthians e Flamengo, ou R$ 1 milhão, como no São Paulo e no Santos. Mas é um dinheiro que fica em poder da fornecedora e que tem restrições. Pode ser usado para fazer anúncios em jornais e revistas, mas não pode ser usado para contratar um jogador.
E as luvas não são uma receita anual, pois são recebidas somente após a assinatura do contrato.
Ainda há outros investimentos que tornam acordos mais vantajosos. A Penalty irá reformar a loja do São Paulo no estádio do Morumbi, assim como gastou R$ 3 milhões para construir uma loja para o Vasco em São Januário. A Nike irá gastar R$ 1 milhão para construir uma loja para o Santos na capital paulista. Todos são patrimônios que ficarão para os clubes após o fim das parcerias, mas não representam dinheiro disponível nas contas bancárias das equipes.
E mesmo com as bases iguais a comparação é delicada, pois há variáveis nos contratos que podem fazer um clube ganhar mais do que o previsto.
O acordo de Corinthians e Nike segue um modelo atípico, segundo apurou o NEGÓCIOS FC. Em patrocínio, são R$ 15 milhões anuais. Mas não há uma garantia mínima. Em troca dela, os dirigentes corintianos arriscaram e pediram royalties mais altos, de 13% sobre a receita bruta, antes de descontados impostos como ICMS e Pis/Cofins. Para que fique mais claro, calcular royalties com base na receita bruta gera uma verba maior do que quando a conta é feita sobre a receita líquida.
Com base no ano passado, a projeção é arrecadar R$ 7 milhões em 2013, mas este valor pode variar para cima ou para baixo em função das vendas. Para um time que acabou de vencer Libertadores e Mundial, a tendência é que esse número seja superado, mas uma crise inesperada pode derrubá-lo.
O contrato de Flamengo e Adidas rende R$ 12,5 milhões de patrocínio e R$ 8 milhões de royalties, uma garantia mínima, entre 2013 e 2017. Mas também há uma variação nos royalties de acordo com as vendas.
Se o faturamento líquido da fabricante alemã com as camisas rubro-negras for de até R$ 127 milhões anuais, ela paga 10%. Se ficar entre este valor e R$ 153 milhões, passa para 12%. E se superar vai a 14%.
Como a diferença entre um e outro é pequena, as vendas de Nike e Adidas podem colocar Corinthians ou Flamengo à frente em uma comparação.
O flamenguista ainda pode alegar que o valor de patrocínio pago pelos alemães subirá para R$ 17,5 milhões anuais entre 2018 e 2022. E subirá. Mas em cinco anos muitos contratos serão reajustados, renegociados, rompidos…
Com as duas torcidas mais numerosas do Brasil e, consequentemente, os maiores índices de audiência na TV, Corinthians e Flamengo oferecem às fornecedoras maior capacidade de venda de produtos e mais visibilidade para as marcas. Independentemente de São Paulo e Internacional terem um histórico recente de títulos ou de o Santos ter um garoto-propaganda como Neymar, as imensas torcidas ainda são mais interessantes para as fabricantes.
Não dá para brigar com certas regras do mercado.
E, a partir de ambos, os valores caem pela metade.
O São Paulo foi desfavorecido por algumas condições momentâneas. Durante a negociação mais recente, a Reebok decidiu que não iria continuar, a Nike se absteve por já ter dois clubes em São Paulo e a Adidas guardou seus recursos para o Flamengo. Com apenas Penalty e Mizuno na briga, empresas com menor poder de investimento do que as estrangeiras, os são-paulinos foram prejudicados pela lei da oferta e da demanda.
Curiosamente, foi o único clube a divulgar o valor de seu contrato publicamente. R$ 35 milhões. Uma mescla dos R$ 13 milhões em dinheiro com outros itens. Os materiais esportivos, cerca de 110 mil peças anuais, foram multiplicados pelo valor de varejo das camisas para inflar o acordo e fazê-lo parecer mais rentável do que realmente é.
E, na verdade, dispor de 110 mil peças pode nem ser tão bom quanto parece.
Novamente em uma negociação hipotética, o clube pode abrir mão de 20 mil, 30 mil ou 40 mil peças por ano em troca de um valor de patrocínio mais alto ou taxas de royalties superiores.
Dinheiro de verdade.
A título de comparação, o Palmeiras recebe da Adidas 46 mil peças por ano.
A quantidade necessária varia de acordo com o número de modalidades que fazem uso desses materiais e do controle interno, porque em muitos casos as camisas são distribuídas a conselheiros e amigos de conselheiros sem muito rigor. Mas um time de futebol de primeira divisão, em geral, precisa de 40 mil peças por ano.
O contrato do Santos, por sua vez, é todo peculiar.
Ele não segue o padrão de um patrocínio propriamente dito mais royalties, e sim há três faixas de remuneração que variam de acordo com as vendas.
Caso o clube fique na primeira delas, recebe um valor mínimo de R$ 7 milhões anuais. Caso fique no segundo, passa a receber R$ 10 milhões, valor que conquistou em 2012 e que é tomado como base para 2013, e caso chegue ao terceiro nível, algo bem mais complicado, bate R$ 13 milhões anuais.
Um contrato de risco que pode fazer com que o Santos receba tanto quanto o São Paulo, em caso de sucesso, ou tanto quanto o Grêmio, se as vendas ficarem no primeiro patamar.
Já o Palmeiras preferiu apostar no ano de seu centenário, 2014.
Os royalties pagos pela Adidas são de 12% sobre as vendas líquidas, mas sobem para 15% em 2014. Assim, é possível que a garantia mínima de R$ 3 milhões seja superada no ano do centenário, enquanto o patrocínio se mantém em R$ 6,2 milhões anuais em todos os anos.
Outro detalhe: a verba de marketing, de R$ 700 mil em 2011, 2012 e 2013, sobe para R$ 2 milhões em 2014. Ou seja, o torcedor palmeirense pode esperar que haja pelo menos o dobro de ações promocionais no centenário.
E o Palmeiras, assim como Grêmio e Vasco, negociou seu contrato há mais tempo do que os demais e ainda não aproveitou o ânimo das fornecedoras em gastar, estimuladas pela Copa e amparadas por verba vinda do exterior.
O Vasco também guarda uma característica própria de seu contrato. Como tinha uma dívida de R$ 8 milhões que estava sendo cobrada pela Penalty na Justiça, a gestão do presidente Roberto Dinamite a inseriu no negócio e a dividiu pelos cinco anos de contrato.
Em Minas Gerais, a quantidade de propostas foi determinante.
O Atlético-MG tinha em mãos ofertas da Lupo, que se dispôs a pagar R$ 7 milhões anuais em dinheiro, e da Penalty, cuja oferta era um pouco superior, de R$ 7,5 milhões. Como a primeira oferecia mais materiais esportivos, o presidente Alexandre Kalil optou por ela.
Já o Cruzeiro recebeu uma proposta da Vulcabras/Azaleia para trocar a Reebok, que se retirou do futebol no mundo todo, pela Olympikus, mas por um valor inferior ao que era pago no contrato anterior, pois as vendas do clube não foram suficientemente boas para a fabricante.
Os cruzeirenses tinham também uma oferta da Puma, superior à do grupo, mas a fabricante a retirou e desapareceu subitamente – pouco depois ela acertou com o Botafogo, que lhe pareceu um melhor investimento por estar no Rio de Janeiro. O Cruzeiro não teve saída, senão aceitar a oferta da Vulcabras.
O tamanho da torcida, a audiência na televisão, a quantidade e a qualidade das propostas, a capacidade do dirigente em negociar melhores condições, a existência de algum garoto-propaganda, o período no qual o contrato foi assinado… Todos são fatores que podem fazer com que um clube ganhe mais ou menos em dinheiro de uma fornecedora de materiais esportivos.
Depois, cada um divulga oficialmente ou “vaza” o valor que lhe parecer mais conveniente.
Fonte: Coluna Negócios FC - Revista Época Negócios Online