Ele não bebe uísque nem água de coco. Não tem cargo, não tem pompa, nada. Só um lugar cativo na beira do alambrado – que agora é de vidro e cobre a vista de quem senta na primeira fileira – de São Januário. Este da foto acima é seu Araújo. Seguramente, hoje, a maior figura que frequenta o Vasco.
Seu Araújo é absoluto. Vi de novo – dessa vez de perto – no amistoso Vasco 1 x 0 Ajax, na despedida de Pedrinho. Mas há tempos que observo Lourival.
Aliás, Lourival é o apelido que ele recebeu após uma das muitas tardes em São Januário – ele está em todas elas há uns cinco anos! Acima de onde a imprensa estava sentada nas sociais do Vasco, um homem mais velho, de calça e camisa social, com emblema do Vasco no peito, gritava sem parar. Era estridente, falava e batia palma durante um simples treino-tático. Nesse dia, ele até que estava mais simpático com aqueles que o ouviam. E danava-se a falar:
- Eu falava com o Lourival. “Tem que treinar. Tem que treinar.” Mas ele até fazia direitinho. Agora, esses caras aí (na época o técnico era Cristóvão Borges) só querem fazer rachão, não dá!
Se você não ligou o nome ao técnico, Lourival era Dorival Junior, técnico do Vasco em 2009, ano da campanha na Série B, para acesso à Primeira Divisão.
Contra o Ajax, no último domingo, o jogo começava e eu, trabalhando, fiquei atrás de Lourival, acompanhando suas instruções. A energia é impressionante. Ao lado esquerdo dele, quatro copos de água. Atrás, sentado na cadeira, o filho, que não deve ter completado 10 anos. Com autoridade, ele instrui funcionários para trocar seus copos de água quando a garganta seca e a água esquenta de tantas orientações que passa.
- Boa, Carlinhos (Carlos Alberto), boa, Carlinhos!!! (Palmas) Vamo, Wendel, chega, Dedé. Valeeu, valeeu! (Mais palmas).
E “ai” de quem queira tirá-lo dali. Vi duas ou três pessoas perguntando aos seguranças por que eles não podiam ficar ali se tinha um senhor no local proibido. E ainda debruçado no ferro que tenta afastar o torcedor do parapeito à beira do campo. A resposta é simples como poucas coisas hoje são no Vasco: “esse aí não tem jeito. Deixa ele lá.”
Ainda procuro mais informações sobre Lourival. Em São Januário, todos funcionários ali da beira do campo o conhecem, mas sabem pouco sobre ele. Um amigo contou que seu Araújo é policial federal aposentado. Quando me aproximei dele – e Lourival perdeu menos de 1 minuto e meio comigo -, não consegui muita coisa.
- Faço isso aqui há cinco anos. Todos dias, todos treinos e jogos. Eu já falei para o cara lá que tem que mudar esse jeito de treinar. Os caras correm errado, jogam errado – esbravejou, no intervalo do amistoso.
Quando perguntei sobre “que cara” ele falava, Lourival, com desprezo, disse que se referia ao presidente Roberto Dinamite. Ainda emendou no melhor estilo Fred.
- Porra, o Gaúcho é meu amigo, gosto dele pra caralho, mas onde que é técnico? Porra… – falou, antes de sair andando e me deixar na saudade.
Apesar da crítica ao ex-jogador e ídolo do Vasco, Lourival não quer saber de política nem de imprensa. Até hoje foi arredio a qualquer tentativa que tive de aproximação. Os jogadores reconhecem a voz dele em dia de treinos, se divertem e curtem o incentivo. Lourival até esses dias – quando não sabia seu nome – era apelido, energia e folclore em pessoa. Como no dia que Ricardo Gomes voltou ao Vasco. No ouvido do comandante, ele fez o convite:
- Ricardo, quero te levar na minha casa lá em Caxias, para você conhecer minha família e a gente te dar uma força para você melhorar de vez.
Se fosse Ricardo, ia correndo. Lourival sabe tudo.
por Raphael Zarko (@raphazarko)
Fonte: Blog Yougol - Trivela - UOL