Após quase três horas e depois de muita discussão em torno da denúncia ao lateral Juan, do Santos, por conta de erro no procedimento de coleta em exame antidoping, o jogador acabou absolvido por unanimidade de votos na noite desta quinta-feira, dia 18 de outubro, no Superior Tribunal de Justiça Desportiva, em sessão da Quinta Comissão Disciplinar. Já o clube alvinegro foi apenas advertido em relação ao mesmo caso.
No dia 12 de setembro, quando o Santos venceu o Flamengo por 2 a 0 na Vila Belmiro, Juan foi sorteado para o exame antidoping, tendo sido informado pelas autoridades competentes. Mas segundo ofício encaminhado ao STJD pela Coordenação Local de Controle de Dopagem da partida, antes de seguir para a coleta, o lateral santista passou pelo vestiário, o que fere a chamada “Cadeia de Custódia”.
No julgamento, um clima tenso se instaurou após o voto do relator Vítor Butruce. Diante dele, o procurador Caio Medauar não escondeu a insatisfação: “Absurdo”. Indignado, o relator teceu longo comentário sobre a denúncia e o embasamento que teve para isentar Juan de qualquer culpa e apenas advertir o Santos. No fim do julgamento, o procurador agradeceu as críticas, mas sinalizou com o próximo passo: "A gente não reclama, a gente recorre", disse Caio Medauar.
Confira como foi o depoimento do jogador:
"(A denúncia) Me pegou de surpresa, já que atuo há oito anos no futebol e sempre foi normal a ida ao vestiário antes da coleta do exame antidoping. Em todos os clubes que passei, e com todos os meus companheiros e adversários, isso sempre foi normal. Nunca fomos instruídos por comissão ou pelo próprio clube de que teríamos que ir direto ao exame e qual seria a punição. Tudo o que fiz foi normal, não fiz nada de diferente do que vinha fazendo nesse período", declarou Juan.
"A passagem no vestiário é rápida, geralmente só para cumprimentar os jogadores, pegar as coisas para ir tomar banho. Não urinei, nem ingeri nada. Nesse jogo eu não estava jogando. Fiquei sabendo que iria fazer o exame ao final do jogo. Quando fui avisado, fui para o vestiário pegar meu material e fui para a sala do exame", completou Juan.
Indagado pelo relator Vítor Butruce, auditor do STJD, Juan disse que foi observado pelo oficial da Comissão de Antidopagem durante o período em que fazia a coleta e ressaltou que a ida ao vestiário sempre foi normal antes do exame. "Eu fiz tudo o que estava acostumado. Não me recordo de ter sido avisado que, se não fosse direto para a sala (do exame), seria julgado".
Na denúncia, a Procuradoria chamou a atenção para o fato de que Juan teria se recusado a fazer o exame, o que foi negado pelo atleta: "De maneira alguma eu faria isso. Minha conduta foi normal e fui fazer o exame normalmente".
O auditor Matheus Gregorini pediu que Juan confirmasse que não foi orientado pelo Santos a ir direto à sala de coleta: "Em nenhum clube que eu passei houve esse tipo de instrução. Volto a dizer que sempre foi normal ir ao vestiário antes do exame, para pegar nossas coisas", esclareceu.
Juan ainda foi indagado sobre o momento em que soube que seria julgado e disse: "Em um primeiro momento que soube da notícia, pensei em doping e fiquei tentando imaginar o que eu tinha tomado. Mas, depois de saber do caso, fiquei mais tranquilo. Imagino que um atleta não deve ficar de fora do futebol por dois anos por conta de uma ida ao vestiário".
Confira o depoimento de testemunhas da Procuradoria:
Fábio Duek, coordenador de controle de dopagem pela Fifa, CBF, Federação Paulista de Futebol e Confederação Brasileira de Vôlei foi a primeira testemunha da Procuradoria do STJD. Ele explicou os motivos da necessidade de o atleta ir direto para a sala de controle de dopagem.
"A norma é colocada, primeiramente, para proteger o atleta. Para que a gente evite que alguém possa oferecer algo a ele para beber e, por descuido, ele tome. Então, nesse período em que ele está sob a nossa orientação, tomamos esse cuidado. A partir do momento em que a gente perde ele de vista, existem vários procedimentos que podem atrapalhar o exame. Entre elas é o atleta urinar no vestiário ou tomar algum líquido. Existe a preocupação também com a coleta da urina do atleta, que pode ser trocada", explicou.
Bruno Borges da Fonseca, médico do quadro da CBF, respondeu sobre a necessidade de o atleta ir direto ao local destinado ao exame antidoping: "O motivo principal é para que o atleta não tente manipular a prova, que é a urina. Tem como manipular através da urina ou de algum medicamento. Esse procedimento é adotado em todas as modalidades. É uma norma do Controle Mundial de Dopagem".
O médico contou que, dos casos que tem conhecimento, o Controle de Dopagem enviava uma carta ao clube responsável pelo atleta, o notificando. Nesta nova administração, a orientação é que seja feita a denúncia ao STJD. "Não tenho dúvida alguma que a nova maneira será mais eficaz", declarou Bruno.
Confira as sustentações da Procuradoria e do Santos:
O procurador Caio Medauar fez suas considerações. "A denúncia está bem completa em suas tipificações. Deixo claro que o Código tem princípios em relação ao jogo limpo e permite atenuantes. Qualquer ato que seja feito fora dos procedimentos, se pressupõe que houve a intenção de tentar burlar as regras. Não estamos dizendo que esse atleta não tenha boa índole. Mas houve a conduta antidesportiva, o não cumprimento da regra".
Em seguida, o advogado João Gazolla defendeu Juan. "Tanto o depoimento do atleta como o das testemunhas trazidas pela Procuradoria trouxeram significativas explicações para o caso. A partir de hoje, todos esses fatos trazidos vão servir de subsídio para decisões futuras. Deve sim ser levado em consideração a prática e os costumes. Também deve ser levado em consideração que houve uma mudança na postura por conta da realização da Copa do Mundo no Brasil em 2014. Mas, isso me soa como uma armadilha. Chegar ao final do campeonato e dizer que tudo o que foi feito antes hoje poderá ser visto como doping é algo que pegou a todos de forma inesperada", defendeu.
O advogado seguiu com sua sustentação. "Essa forma de tentar prevenir o doping deveria ter chegado aos clubes de uma forma mais simples. Como podemos imaginar que, através da uretra, o jogador conseguirá manipular o resultado de seu exame? Isso é algo inimaginável".
"Não houve nenhuma notícia oficial no momento adequado. A mínima formalidade deve exigir que tal ação seja noticiada no documento assinado pelos atletas. Houve uma mera irregularidade. Deveria, no mínimo, ficar provado que o atleta tentou se esquivar da realização do exame, mas isso não ocorreu. O que aconteceu entre Santos e Flamengo, na Vila Belmiro, foi o que vem acontecendo há dez anos", encerrou o advogado.
Entenda o caso:
Juan foi denunciado sob a acusação de infringir os artigos 2.3 (recusar-se ou não se apresentar uma justificativa válida a submeter-se a coleta de amostra após notificado de acordo com as regras antidoping, ou de qualquer forma que configure recusa ou fuga da coleta) e 2.5 (adulteração ou tentativa de alteração de qualquer componente de controle) do Código Mundial Antidoping, combinado com artigos do Regulamento de Controle de Dopagem da CBF/2012.
A pena prevista no Código Mundial Antidoping é de dois anos de suspensão para o atleta infrator. Juan ainda foi enquadrado no artigo 258 (assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras deste Código) do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), que prevê suspensão de até seis jogos.
O Santos também foi enquadrado pela Procuradoria, e respondeu ao artigo 191 do CBJD, incisos I e III, acusado de “deixar de cumprir, ou dificultar o cumprimento de obrigação legal; de regulamento, geral ou especial, de competição”, em que a pena pode chegar a multa de R$ 100 mil.
Fonte: Site Justiça Desportiva