Tenorio: 'Buscamos o título, vamos brigar até o fim'

Sexta-feira, 21/09/2012 - 15:23

O Rio de Janeiro e o jeito carioca de ser não eram novidade para Carlos Tenorio até ser contratado pelo Vasco, em fevereiro deste ano. Pelo menos no que diz respeito à cultura, ao idioma e ao futebol. O caminho do equatoriano, no entanto, o levou a se afastar de seu país e do mercado latino, após as participações nas Copas do Mundo de 2002 e 2006, para construir a independência financeira no mundo árabe. Mas alguma coisa lhe dizia que a chance de conferir de perto os campos brasucas iria aparecer. O destino não reservou facilidade quando o contrato de dois anos foi assinado, e o apelido Demolidor custou a ser comprovado em virtude de uma cirurgia no tendão de Aquiles, em março. Mas, agora, a vontade de retribuir o carinho é tão grande que o camisa 11, irreverente ao melhor estilo boleiro, sonha em voltar à condição física de seus 15 anos de idade para dar alegrias à torcida, de quem virou xodó e segue a passos largos para ser ídolo na Colina, como em todos os clubes que passou.

O rótulo é encarado com orgulho, mas ele ressalta que não é seu objetivo mais urgente. A identificação acontece pelo espírito demonstrado quando está em ação, moldado por uma infância sem luxo na cidade de Esmeraldas, no interior do Equador, e seus princípios como atleta.

- Sempre foi assim comigo, no Equador me tratam com muito carinho e no Qatar é impressionante. Nunca deixaram eu ir para a Europa pelo apreço que têm por mim e pelo meu futebol. Faço a minha parte, mas não quero só pensar em ser ídolo. Isso tem que ser natural. Entro em campo para me empenhar muito, vou me matar lá dentro, se for preciso. Aproveito as qualidades que eu tenho para ajudar o time. E o Vasco me ajudou demais, me deu muita moral e nunca virou as costas na recuperação. O torcedor desejando que ficasse bom logo... tudo foi uma lição, não tem preço. É estranho ter começado assim, mas sempre fui direto com as minhas declarações e meu modo de ser. Os vascaínos gostaram e eu gostei deles. Vitórias e derrotas fazem parte, mas o jogador não pode perder a chance, a todo momento, de ser o melhor possível. Eu brinco muito, mas sou profisisonal acima de tudo. É difícil me ver na rua porque gosto de descansar e me concentrar nos jogos. Não pode misturar futebol com diversão - ensina Tenorio.

Tão peculiar quanto a trajetória no Vasco é sua história de vida. Até os 20 anos, a paixão dele era correr. Baseado numa explosão física invejável, marcava 13 segundos nos 100m rasos na adolescência. Bola, só nas peladas de fim de semana. Até que a LDU o encontrou e o transformou num atacante de renome. Tenorio, então, tratou de apurar a técnica para aliá-la à agilidade nos movimentos e ganhou tanta confiança que não tem dúvidas ao afirmar que suas características são indispensáveis. Por isso, mesmo com o cuidado de quem respeita as ordens do departamento médico, avisa que não admite se poupar. Mas brinca com a limitação que a idade lhe impõe.

- A situação não é fácil, estou exposto num fim de temporada depois de um problema grave. Não tenho mais 25 anos (está com 33), mas sei que sou importante para qualquer time do mundo por ser forte, segurar bem a bola, arrancar e chutar muito a gol. Não estou dizendo que o Vasco vai vencer só por minha causa, mas não conheço a palavra segurar. Vou correndo o risco de me machucar mesmo. Faço o possível agora e daqui a pouco já estou normal de novo, iniciando uma temporada 100% com o time e jogando como se tivesse 15 anos (risos) - diverte-se o Demolidor, com um sorriso maroto no rosto.

Fã de filmes de favela, em definição própria, Tenorio sabe muitas falas do sucesso "Cidade de Deus", do diretor Fernando Meireles. No vocabulário, aliás, a gíria local sai sem perceber - apesar de ainda haver confusões com certas letras, como ao falar "Basco" e "vola" no lugar Vasco e bola. O aprendizado, portanto, não aconteceu apenas nos oito meses em que mora no Rio. Vem desde a época em que "fechava" com o meia Felipe e o atacante Emerson Sheik no Al-Sadd, do Qatar, e que teve a companhia de fisioterapeutas e treinadores. Questionado se aproveitaria as férias para conhecer melhor a cidade, além das praias que frequenta eventualmente com a família, saiu-se com essa:

- Não, não. Quando acabar o campeonato, "meto o pé" para o Equador. Temos pouco tempo com a família, preciso dar uma passada lá para relaxar - disse, emendando em seguida sobre a evolução no "carioquês" e seu gosto também pelas novelas brasileiras.

- Estive sempre esperando que aparecesse alguma coisa do Brasil, era uma vontade mesmo. Já até me preparava (risos). No resto, vou caprichar para acertar tudo. Brasil é América do Sul, estou quase em casa. Tem muita coisa igual ao Equador. Vi muitos filmes de favela, sobre a pobreza, gosto quando mostram a realidade, e sou noveleiro também. Essa "Avenida Brasil" é muito boa - opinou.

A transparência do camisa 11 cruz-maltino vai além: se não conseguir o título, o Vasco vai à Libertadores, garante. Ele acredita que os delicados assuntos extracampo, como os salários atrasados e a política conturbada, não mexem com a cabeça do jogador na hora em que a bola rola.

- Buscamos o título, vamos brigar até o fim, mas é um alívio ir à Libertadores. Não perdemos mais isso, esse grupo confia muito em cada um. É diferente. Todo mundo está sabendo da situação do Vasco, mas precisamos de comentários construtivos, temos jovens que precisam de incentivo porque a vida e o futebol não são fáceis. Tem que deixas as coisas de lado e trabalhar mais ainda. A diretoria está fazendo o possível, há esse diálogo e muita sinceridade. Quem fala que joga pensando nisso é mentira. Você quer vencer o jogo, só isso - aponta o equatoriano, um dia depois do também atacante Alecsandro desabafar sobre o cenário atual.

Os gols perdidos recentemente não tiram o sono de Tenorio, que já marcou três vezes em dez partidas desde que retornou à equipe, no início de agosto. Nem a polêmica do impedimento assinalado que anulou seu gol no empate com o Cruzeiro, domingo passado, em Varginha, embora, ao rever a jogada, ainda não se conforme com a interpretação do assistente. O presidente da Comissão de Arbitragem, Aristeu Tavares, consultou a Fifa e foi a público afirmar que o lance era legal.

- Para o centroavante é complicado, mas tem que confiar. Posso perder dez gols, mas vai ter um que eu vou meter. Penso assim. Ninguém faz só golaço, nem o Messi é perfeito. Perde gols também. Se perder a cabeça é que atrapalha. E isso eu não deixo. É importante estar preparado para a jogada seguinte. Contra o Cruzeiro, o cara me deu um presente, o que eu faço? Não tinha ninguém do Vasco, o erro foi deles (zagueiros) - lamentou.

Nesta sexta-feira, o atacante foi poupado do treino específico de bolas paradas, em São Januário, por ainda sentir dores no púbis e pode ser desfalque para o duelo com a Ponte Preta, domingo, em Campinas. Eder Luis entraria em seu lugar, ao lado de Alecsandro.





Fonte: GloboEsporte.com