Carlos Tenorio poderia ter passado boa parte dos seus 33 anos em cima de um barco de pesca, na cidade costeira de Esmeraldas, interior do Equador. Mas começou a reescrever seu destino quando usou a velocidade dos 100 metros rasos para disparar em direção ao gol, em vez de colecionar medalhas no colégio. No Vasco desde janeiro, a prova também não foi nada fácil. O equatoriano de 33 anos chegou por indicação de Ricardo Gomes, que não tem nem mais seu ex-auxiliar Cristóvão no clube. Demorou a estrear, superou lesão grave e voltou com o time em queda, sob pressão.
Nada demais para quem começou aos 21 anos na segunda divisão equatoriana no futebol. Com a LDU, o garoto que marcava 13 segundos nos 100m aos 15 anos sentiu cedo a responsabilidade.
- Nunca havia jogado em nenhum time no Equador. Era só pelada aos fins de semana. De repente, estava na segunda divisão, com estádio lotado, todo mundo te xingando, campos horrorosos... Mas foi bom para aprender a superar dificuldades - disse o equatoriano, que ganhou o apelido de Demolidor na Copa da Alemanha, em 2006. - Fiz o primeiro gol, contra a Costa Rica, e depois um jornalista disse: “Ninguém consegue pegar o Demolidor”. Gostei muito, me identifiquei com o apelido.
Em menos de dois anos de LDU, Tenorio chegou à seleção e logo foi parar no milionário futebol árabe. A ideia era ficar por duas temporadas e seguir para a Europa, mas não foi assim. O dinheiro acumulado naqueles tempos - chegou a ganhar uma Lamborghini para não deixar a Arábia Saudita - o permitiu até pensar em largar o futebol quando sofreu a lesão que o afastou por quase seis meses do Vasco.
- Sabia que, se eu parasse, não ia viver na rua. Mas é difícil parar de fazer o que você gosta - diz ele, que apareceu para Ricardo Gomes num amistoso do Equador contra a França em 2009. - Ele era técnico do Bordeaux e quis me levar dessa e em outras vezes - lembra.
Tenorio lamenta não ter mais Ricardo nem Cristóvão por perto.
- O futebol tem muito dessas coisas. Mas é covardia alguém dizer que porque o Cristóvão saiu a gente venceu. É mentira. Ele foi uma pessoa sensacional, que deu o melhor por todos nós.
A vitória contra o Palmeiras e a chegada do novo técnico não iludem o atacante:
- A torcida é um caso à parte e vai vaiar sempre que achar que deve. Jogador precisa entender isso. Também não me preocupo em agradar treinador. Só quero lutar muito e fazer o meu melhor.
Sem dar bola para “maldição da 11”
O entrosamento com os jogadores em São Januário veio rápido e não só porque no mundo árabe Felipe e Emerson Sheik o ensinaram a falar um razoável português - hoje, ele fala até “fechamento”, “parceiro” e “parada”, embora ainda saia um “Basco” ao se referir ao quinto clube da carreira. Tenorio impressionou quando, dias após a grave lesão, pediu rescisão de contrato no Vasco.
- Eu me machuquei, frustrei a expectativa e o investimento de vocês. Quero devolver o que o Vasco me pagou e voltar ao Equador - disse na época o Demolidor.
O medo de não voltar a jogar passou logo. Junto, foi embora a “maldição da camisa 11” de Romário.
- Ouvi falar de maldição, mas nunca deixei entrar na minha cabeça isso. Romário deu muito ao Vasco, ao Brasil e ao futebol mundial. É um ídolo, eu o respeito muito, mas a vida no futebol não é para sempre. Não tem comparação. Não quero ser o craque que usa a 11, só quero fazer os meus gols - diz o descontraído Tenorio.
O equatoriano já aprendeu também a curtir pagode, funk, de tudo um pouco, mas é craque mesmo em duas coisas.
- Depois de correr 100 metros como eu corria, era só acertar alguma coisa na técnica para arrebentar no futebol. E também deito e rolo na salsa - brinca o Demolidor.