Aos 17 anos, Ana Clara Vale Lopes faz parte de um seleto grupo de meninas que veêm no futebol a chance de se profissionalizar e brilhar mundo afora. As dificuldades pelas quais passa no dia a dia, a força de vontade em superar obstáculos e ignorar o amadorismo da categoria no país e as cobranças prematuras dignas de uma jovem atleta são as mesmas de muitas meninas da sua idade. O que a diferencia do resto é um elo familiar nada comum para suas concorrentes: Ana é da mesma família de ninguém menos que Mario Jorge Lobo Zagallo.
Os laços familiares são por parte da avó de Ana, que é prima de Zagallo. Sempre que pode, a meia do Vasco da Gama pede conselhos para o ex-treinador e dirigente da seleção brasileira.”Ele me incentiva ao máximo”, conta Ana, que se define como uma jogadora versátil:”Meu estilo de jogo é baseado em passes precisos, bons lançamentos e chutes de media distância.Posso jogar também de volante”.
Ainda que, ao menos de sangue, Ana Clara não seja tão próxima de Zagallo, ela é a única descendente do Velho Lobo ligada ao esporte, o que, segundo ela, é motivo de orgulho para Zagallo.
“É muito gratificante para ele me ver crescer no ramo, e ele contribui bastante para que isso aconteça. Sem falar que ele é um exemplo pra mim também.”, analisa Ana.
Exemplos, aliás, não faltam para Ana se consolidar como uma das grandes promessas do futebol feminino no país. A atacante Érika, ex-Santos e da Seleção brasileira, é uma de suas inspirações. “Fora de campo, ela é bem intruída, carismá tica e tem conduta de vida e estilo de jogo exemplares. Dentro das quatro linhas, joga assustadoramente bem em qualquer posição e, para ela, não tem bola perdida”, resume Ana.
O outro atleta em quem Ana Clara se inspira é Juninho Pernambucano. “O seu estilo de jogo com belos lançamentos, belíssimas cobranças de faltas, uma visão de jogo incrível e o seu ímpeto de liderança me fascinam. É um profissional dedicado que segue normas de condutas rígidas e possui um estilo de vida super saudável, coisas que fazem o seu físico aos 37 anos ser invejável.”, conclui ela.
Ana gosta de levar o esporte a sério. “Sou muito competitiva auto-crítica, me cobro muito”. Mas nem sempre foi assim. Quando começou a jogar bola, em São Pedro da Aldeia, região dos lagos do Estado do Rio, era por diversão. E entre os homens. Até os 14 anos, Ana tinha o futebol como uma simples alternativa de lazer.
A situação só foi mudar em maio de 2010, quando uma pessoa ligada ao Vasco viu Ana Clara jogando e se encantou.”Ele logo falou com a minha mãe que estavam precisando de atletas, pois estavam começando um projeto. Minha mãe me levou para fazer os testes e consegui passar. Desde então jogo no Vasco, estou lá há 2 anos e 2 meses.”, conta.
Aos poucos, o esporte foi se tornando mais sério na vida de Ana. Segundo ela, a sua evolução dentro e fora de campo serviu como percepção de quão sério o futebol estava ficando para ela. O apoio da família e dos amigos nessa fase foi fundamental. Mas as maiores dificuldades de sua curta carreira ainda estavam por vir…
No ano de 2010, lesões musculares a deixaram de fora por meses. Acostumada com o society, Ana Clara sofreu com a adaptação para os campos.” Mas eu me superei. Fui campeã da Copa Almirante Sub-15 e, de lá pra cá, foram muitas alegrias”, analisa, bem mais aliviada.
Hoje, Ana Clara tem um currículo invejável para a idade. Com títulos pelo juvenil e profissional do Vasco e pela seleção feminina sub-17, espera-se uma grande jogadora. E, para quem conversa com Ana, uma atleta com uma boa visão do panorama que cerca o esporte fora dos campos.
“O futebol feminino hoje, no Brasil, é muito amador. A falta de campeonatos é visível, muitas não focam somente no futebol de campo, jogam futsal também para não perder o ritmo, já que passam muito tempo sem jogar campo. A modalidade já evoluiu muito, mas as mulheres ainda continuam a começar a carreira muito tarde, e isso dificulta o trabalho e também reduz o numero de atletas ativas. Antes de haver qualquer incentivo financeiro e moral do governo ou privado, eu acho que as próprias instituições e/ou clubes deveriam incentivar mais”, reclama Ana, que também critica a postura de algumas altetas:”Muitas não levam a sério. O esporte também depende delas”.
Sobre possíveis adpatações do futebol masculino para o feminino, como a diminuição das traves, Ana Clara concorda. E ainda acrescenta algumas sugestões:”Uma menina de 15 anos não agüenta correr o mesmo tempo e a mesma distancia que são exigidas de uma atleta profissional, por exemplo. Poderiam surgir mudanças no tamanho e peso da bola, nas traves e no tempo de jogo também.”, explica.
Entre perspectivas e sonhos, Ana Clara não tem dúvidas: entre ser campeã do mundo e medalha de ouro nas Olimpíadas do Rio, a segunda opção é prioridade nos objetivos da carreira. “Eu estaria no meu país, sendo agraciada por toda a nossa torcida , perto da minha família e dos meus amigos que tanto me apoiam. Acho que não haveria sensação melhor.”, finaliza.