Com mochila nas costas e o sonho de ser jogador de futebol, Wendel Junio Venâncio da Silva subiu a ladeira até chegar ao número 26 da Rua Ferreira de Araújo, bairro Vasco da Gama, na primeira semana de fevereiro. Ali, numa casa de três quartos com uma piscina desativada, fica a pensão de atletas que foi o abrigo do jovem por três dias, antes de ele morrer durante uma peneira do Vasco, no dia 9 daquele mesmo mês. Administrada por Elisete Souza e André Amorim, a “Gama Alojamento” é conhecida no clube e cobra diárias para acomodar os meninos.
Há dois anos, o casal criou o local para abrigar jovens que vêm de todos os estados do Brasil. Com uma tabela de preços sempre em mãos, a dupla explica como funciona o esquema que conta até com a colaboração dos funcionários do Vasco, que indicam o local.
(Nota da NETVASCO: Em e-mail enviado à NETVASCO, André Amorim esclarece que Wendel não ficou sob a tutela nem dele nem de Elizete, tendo sido trazido por outra pessoa e ficado na casa de trás, alugada por terceiros. André também esclarece que não é casado com Elizete, ao contrário do que a matéria dá a entender. Ele é casado com outra pessoa e seu relacionamento com Elizete é estritamente profissional.)
– Um dia, eu estava conversando com todo mundo no Vasco, e eles me sugeriram para tomar conta dos garotos. Lá (no clube), todo mundo me conhece e sabe o trabalho que eu faço – diz Elisete, conhecida como “Mãe Loura”, aproveitando para falar da tabela. – Pode ser diária, semanal, quinzenal ou mensal. E também com ou sem alimentação, depende do que a pessoa precisa.
A diária custa R$ 30 sem comida e R$ 45 com alimentação; semanal, o valor passa a ser R$ 120 e R$ 190, respectivamente; quinzenal vale R$ 200 e R$ 350; e mensal, R$ 350 e R$ 500. Ainda há taxa de R$ 50 para lavar roupa e mais R$ 30 se precisar passar. Como o Vasco não disponibiliza comida aos garotos, a pensão fatura mais com isso.
– Eles (Vasco) não dão comida para as crianças que vão fazer peneira. Só dão para federado e quem já estiver no grupo – diz André Amorim.
Promessas de vaga no time
As condições da casa onde o Wendel ficou são similares às das categorias de base do Vasco, que foi alvo de processo do Ministério Público do Rio de Janeiro. O jovem dividiu um quarto apertado com mais três meninos, num espaço com sete camas. Na sala, há dois sofás velhos e televisão. O único banheiro é para mais de 15 pessoas. Nos fundos, há mais três casas que também abrigam garotos. E o plano do casal é comprar mais uma no bairro.
O esquema não para por aí. O casal pede uma procuração a fim de ter autoridade para decidir a respeito de viagens, problemas de saúde ou esportivos dos jovens. As famílias dos meninos, mesmo sem conhecê-los, com frequência concedem tal tutela.
– Precisa fazer essa autorização para que eu possa responder caso alguma coisa aconteça. Você traz isso (autorização) autenticado e os documentos do menino, caso peçam qualquer coisa – afirma Elisete.
Além de cobrar pelo abrigo, o casal faz as vezes de empresário. Se um jovem não dá certo em um clube eles levam para outro. Porém, afirmam que no Vasco e no Botafogo é possível entrar direto, sem peneira.
– Traz um DVD que ele vai colocar direto no Vasco, no grupo de jogadores, sem passar pela peneira. Se ele (jovem) não tem empresário, a gente vê. Ele (Amorim) trabalha com isso – diz a “Mãe Loura”.