Em 1989, Bebeto, astro do Flamengo e conhecido pelo temperamento tranquilo, foi jogar no Vasco. Na primeira partida contra o ex-clube, foi expulso. Quem brilhou foi o desconhecido rubro-negro Bujica, autor de dois gols. Dois anos antes, no mesmo clássico, Geovani, o "Pequeno Príncipe" vascaíno, deu um soco no zagueiro Edinho. No confronto mais recente, cinco cruzmaltinos pararam no TJD após irem para cima do árbitro. O Flamengo x Vasco, que hoje, às 16h, decidirá um finalista da Taça Rio, mexe com a cabeça dos jogadores de um jeito tão diferente que só a ciência explica.
— Em todo clássico o emocional é mais exigido que o físico. Mas os jogadores são pouco preparados nesse sentido. Então é comum ver o aumento da ansiedade e a diminuição do reflexo e da concentração — explicou João Ricardo Cozac, presidente da Associação Paulista de Psicologia do Esporte.
Como sintoma, cada jogador adquire uma mania. Nos dois dias antes do clássico, o atacante Alecsandro só sai de casa para treinar. Já Acácio, goleiro do Vasco bicampeão estadual sobre o rival (1987-88), tinha uma preferência:
— Sempre que o (Roberto) Dinamite ganhava no cara ou coroa, eu pedia a ele para escolher o gol da torcida do Flamengo — disse.
Quem revelou o motivo foi Carlos Germano, herdeiro da camisa 1 do Vasco:
— A história desse clássico mostra que a maioria é decidida no segundo tempo. Começando do lado da torcida do Flamengo, você tem a oportunidade de ficar protegido pela sua na etapa final.
O camisa 1 rubro-negro, Felipe, também muda os hábitos no dia do clássico:
— Acordo mais cedo e acabo comendo pouco — conta o goleiro, que diz não ter como ser indiferente ao duelo. — A gente passa no ônibus com a torcida do Vasco tacando pedra e latinha e acaba entrando no clima.
O poder da mente
E como explicar os craques que "amarelam" no clássico? E os heróis improváveis? Para desvendar esse mistério, é preciso entender o poder da mente. Uma área específica produz enzimas que regulam as emoções. As principais são a adrenalina, que tem um efeito de alerta e exaltação; e a endorfina, que reduz as dores. Graças a elas, o cérebro é capaz de lidar com situações extremas.
— Isso tem a ver com o índice de expectativa. O coadjuvante entra no clássico com este índice inferior ao da estrela. Então nível de tensão e de estresse é diferente — explica Sérgio Novis, professor emérito da UFRJ em Neurologia. — A carga sobre o astro é abafadora. Se em 30 minutos ele não consegue se destacar, se reprime. Já o coadjuvante pode ter um lampejo e, como a torcida não esperava, acaba gerando uma reação estimulante.
Com uma história repleta de heróis e vilões, o Clássico dos Milhões leva jogadores e torcida da euforia ao desespero. Haja preparo mental.