Esporte que deu ao Brasil o primeiro ouro olímpico, em Antuérpia-1920, por meio de Guilherme Paraense, o tiro esportivo ainda sofre uma carga de preconceito no país, porque muitos confundem, erradamente, a modalidade com casos de violência urbana. Nada a ver, até porque as armas de competição servem apenas ao esporte, e principalmente porque os atletas cultivam equilíbrio e tranquilidade, caso de Ana Luiza Ferrão Souza Lima, que vai representar o país em Londres-2012 nas provas de pistola de 25m.
A professora de biologia, temporariamente afastada das aulas para treinar, encontra na leitura a companhia no ir e vir das viagens para treinar e competir.
— O livro é uma companhia de viagem. Quem viaja e gosta de ler nunca está sozinho. É uma maneira de passar o tempo e de estar sempre aprendendo. Gosto de ler desde pequena, e meus pais foram comprando livros —- recorda. — Estou lendo "Histórias Íntimas: Sexualidade e Erotismo na História do Brasil", de Mary del Priore. Narra a sexualidade ao longo da história do país.
Também apreciadora de teatro, gosta de comédias, mas, pelos treinos, não tem tido tempo de ir. Já o último filme que assistiu foi "A Invenção de Hugo Cabret".
— Gosto de vários tipos de filme. De comédias românticas, filmes históricos, filmes brasileiros, como "Tropa de Elite", gosto sim — diz. — Tenho de aproveitar a chance (de ir a Londres-2012). Quero ter feito tudo que deveria e podia pelos Jogos.
No esporte desde 1999
Como a maioria dos brasileiros, aprecia o futebol, embora não vá a estádios, pela violência das torcidas.
—- Sou Vasco, mas não dá para ir aos jogos. Muito tarde. Mas entro no facebook para zoar os rubro-negros — ri.
Nascida a 26 de dezembro de 1973, Ana Luiza entrou para o Exército como primeiro-tenente em 1995. Nas Forças Armadas, além de amor à pátria e respeito à hierarquia, ela acabou por conhecer uma nova paixão, o tiro esportivo, modalidade que pratica desde 1999. No caso de sua arma, a pistola de ar (25 metros), há provas não apenas em competições militares, como também olímpicas. Desde 2009, estava convocada para treinar para os Jogos Mundiais Militares-2011, no Rio, em que ajudou o Brasil a ganhar o bronze. Antes, em 2010, o ouro no Campeonato das Américas lhe valeu a vaga olímpica. Nos Jogos Pan-Americanos de 2011, em Guadalajara (MEX), ganhou o ouro na pistola.
A agenda está cheia até julho. No dia 5 de abril, viaja para treino na França e, entre os dias 17 e 22 de abril, estará em Londres, no evento-teste da sede olímpica do tiro. No dia 23, retorna ao Brasil, e uma semana depois, compete na República Tcheca. Depois, terá treinos e eventos em Milão e em Munique. Em julho, estará na França, indo para Londres, onde chega a 21 de julho.
Embora ela saiba que as Olimpíadas são um grande evento, tenta afastar esse clima do momento em que for atirar, até porque estande, distância e pistola são iguais:
— Deve ser difícil (não pensar que está nas Olimpíadas), mas, olhando friamente, é isso. É uma prova em que eu estou competindo comigo mesma. O alvo está à minha frente, e não tenho como influir no desempenho das adversárias. O tiro obriga a trabalhar a calma, a concentração, a paciência.
A atiradora tem uma terapeuta, para estar bem consigo e saber lidar com a pressão, além de contar com o apoio do treinador e namorado, o major José Carlos Iengo Batista).
— Quero estar concentrada, mas não relaxada, porque quando você relaxa também não consegue fazer nada — adverte ela, que luta para não se deixar dominar pela ansiedade. — No tiro esportivo, em nível olímpico, o aspecto psicológico é 90%, porque a técnica, todos têm. O que vai contar é o estado emocional, a experiência de já ter passado por ali, a capacidade de se manter frio.