Ao se despedir do pai, seu Antônio Carlos, o garoto Wendel Venâncio, de 14 anos, traçou o objetivo para vencer o período de testes no Vasco: "Pai, a gente nunca mais vai pagar aluguel". Ontem, o corpo do jovem sonhador voltou à cidade natal num caixão, envolto numa bandeira do Vasco — vítima fatal num treino no CT de Itaguaí. São João Nepomuceno parou para se despedir do atacante e chorar no último adeus.
— Ele estava muito feliz, disse que ia agarrar a chance com unhas e dentes, que a gente nunca mais ia pagar aluguel na vida — disse Antônio Carlos, de 45 anos, que trabalha numa confecção.
Era uma incredulidade só no Cemitério Municipal São João Nepomuceno. A mãe de Wendel, Rita, internada em estado de choque num hospital logo que soube da morte, não conseguia parar de gritar que amava o filho. O pai chegou a desmaiar e passou o tempo inteiro, amparado por dois amigos, evitando que caísse de novo no chão. Recebiam o filho sem vida, horas depois de saber que ele vivia em êxtase. No breve período que esteve no Vasco, Wendel não conteve a felicidade ao falar, numa ligação, que havia conseguido autógrafos de jogadores profissionais.
— Ele tinha tirado foto com os jogadores do Vasco, estava feliz pela chance. Treinou na terça normal, na quarta não teve treino. Mas nunca teve nada, sempre foi forte, dedicado ao treino — disse Marco Aurélio Ayupe, ex-jogador do Vasco, responsável pela indicação de Wendel e também de Saulo e Cassio para teste.
Ao lado de Ayupe, Cássio, técnico da equipe sub-15 do Vasco, estava inconsolável. O Vasco pagou as despesas funerais e enviou Humberto Rocha, diretor das divisões de base do clube, como representante à cidade mineira.
— Não consigo falar, desculpe, só Deus sabe o sofrimento — lamentou-se o técnico Cássio.
Entre lágrimas e comoção, em São João Nepomuceno todos se perguntavam como morreu o jovem sonhador, cheio de saúde. Por mais que evitasse buscar respostas — ainda à espera do laudo do Instituto Médico Legal — o pai de Wendel contou que a família tem um histórico de cardiopatia, mas o filho jamais apresentou qualquer problema. A mãe de Wendel, Rita de Cássia, fez cirurgia para desentupir uma válvula do coração há dez anos. Já a avó materna morreu de infarto fulminante.
— Minha mulher teve que desentupir uma válvula, mas faz tempo. Toma remédios hoje e nunca mais teve nada. Minha mãe teve infarto, mas o Wendel não, nunca acusou nada. Fizeram os exames todos, ele sempre correu para cá, para lá, era muito forte — disse Antônio Carlos: — É uma coisa que não dá para entender, que ninguém esperava. Abalou todo mundo.
O irmão de Wendel, Washington, de 21 anos, que cumpre pena por tráfico de drogas e porte de armas, foi liberado e compareceu ao velório, onde permaneceu por 20 minutos.
Um sonho acabou.
Fonte: Extra online