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João Havelange é torcedor do Vasco da Gama, revela jornalista


Sexta-feira, 09/12/2011 - 07:15

João Havelange: a força e o poder da Fifa vieram com ele

Grande Monarca.

Esse era o nome com que João Havelange era tratado por seus inúmeros acólitos e seguidores na FIFA.

Um grupo imenso de grandes senhores do futebol mundial que ali baixavam a cabeça para cumprir os desígnios daquele que chegara para vender o produto chamado futebol.

E o vendeu, em todos os sentidos.

Encontrou a FIFA com saldo zero e deixou-a nas mãos de Joseph Blatter com um caixa de 250 bilhões de dólares.

Para tanto usou dos meios possíveis e impossíveis, alguns só imagináveis ao seu cérebro privilegiado, cumprindo o que prometera ao ser eleito.

O romantismo no futebol era para ele algo arcaico e desapareceu depois da passagem de sua presidência, quando se firmaram os princípios de que era de um negócio e não de um esporte que a entidade tratava.

É preciso realçar que encontrou uma FIFA restrita em suas ações e deixou-a depois da mesma organizar e patrocinar campeonatos de futebol entre infantis, juvenis, juniores e de mulheres também.

Uma Copa do Mundo principal com 16 participantes dobrou o número de países alastrando o mundo da bola para todo o planeta.

De atleta olímpico na natação e no polo aquático para cartola no futebol, João Havelange sempre tratou os circunstantes que o rodeavam como elementos inferiores sobre os quais pairava.

Jamais olhava um repórter com o olho no olho.

Isso nas poucas vezes em que era acessível à aproximação de alguém portando um microfone, uma câmera ou um caderno de anotações.

Também nunca o vi sorrir ou chorar tanto após grandes vitórias ou terríveis derrotas do futebol brasileiro.

É verdade que não tive com o mesmo tantos contatos que permitam dizer que nunca sorriu.

Sempre o vi, porém, como um ser gelado em suas decisões e com controle absoluto de seus músculos faciais.

Pairou nas alturas para o resto da humanidade e aí podem ser incluídos os jornalistas, os ministros de Estado, os presidentes e até os monarcas com quem teve de tratar.

Quando vinha a São Paulo suas entrevistas, rápidas e dentro de um espírito de condescendência de sua parte, eram monocórdicas e unilaterais.

Qualquer pergunta além do que se dispunha a responder levava a um terçar de armas e a um final abrupto.

Escrevi “quando vinha a São Paulo”, mas isso se refere a um determinado período, já que embora nascido no Rio (08.05.1916), morou na capital paulista e foi daí que emergiu para o grande mundo empresarial.

Para o futebol, porém, o cartola nasceu no Rio e de lá espalhou seu poder.

Jamais desejou seguir a atividade do pai, um negociante de armas e munições fazendo questão de repetir que abriu sozinho os caminhos de sua fortuna.

Seu gosto pelos esportes vem da infância no Rio e para onde voltou para não mais sair a não ser pelas centenas, talvez milhares de viagens pelo mundo na campanha para a conquista da FIFA e depois como seu comandante.

Foi tricolor pela proximidade de sua moradia familiar com o clube nas Laranjeiras, mas seu clube de coração era e é o Vasco da Gama.

Iniciante nas atividades diretivas pela natação quando morou em São Paulo no retorno ao Rio foi se ligando ao futebol até chegar à presidência da então CBD, onde ficou de 1956 a 1964, quando foi alijado pelos militares que assumiram o comando da nação.

Ultraconservador, homem de direita, a sua queda da CBD só se explica pelo temor que os militares tinham por todos os que eram figuras proeminentes nas atividades populares.

Ser popular, porém, é coisa que na verdade Havelange nunca foi e nunca quis ser.

Apeado do poder no futebol brasileiro, deu a maior volta por cima ao conseguir eleger-se presidente da entidade maior do futebol mundial em 1974 e que até então, embora fundada por europeus continentais, era um feudo dos ingleses.

Joseph Blatter já era um executivo com experiência administrativa, mas seu engajamento com o futebol veio através de Havelange que o fez secretário geral da entidade que presidia.

Parece algo histórico a ação dos gerentes, função específica dos secretários-gerais, nas tentativas, nem sempre com êxito, de passar rasteira nos presidentes.

Os secretários-gerais ficam sabendo acima das necessidades do cargo.

Joseph Blatter chegou, porém, à presidência como um ungido de Havelange e este só se desligou da FIFA por sua idade em 1998 quando já tinha 82 anos.

A luta de Joseph Blatter contra futuros secretários-gerais só aconteceria nas futuras batalhas para reeleição.

E contra aqueles que ambicionaram o cargo e que nem sempre exerciam esse cargo, mas eram sempre poderosos membros do Conselho Executivo da entidade.

Ali se instalaram e construíram fortunas alguns dos maiores tubarões do mundo do futebol.

Certa parte do grupo age à distância e mantém uma posição de aparente fidelidade como o argentino Júlio Grondona, a quem sempre foi delegado o comando do futebol na América Latina.

Aparente fidelidade, como foi até certo ponto a do brasileiro Ricardo Teixeira.

Outra “cria” de Havelange, que em pouco tempo aprendeu as regras do jogo e julgou que a presidência da CBF, herdada do então sogro e que ainda ocupa seria o caminho ideal para subir até onde seu mestre chegou.

Se Havelange deu a volta por cima no governo militar brasileiro, seria a forma de Teixeira deixar pasmos os políticos que já o envolveram numa CPI e melhor, mostrar poder aos que o tiraram das sucessivas enrascadas.

As mais sérias compreendendo ações ainda não de todo reveladas e com ameaça de divulgação pelos ingleses, mordidos por não terem sido escolhidos para a Copa de 2018.

Justamente quando o Brasil se prepara para sediar uma Copa do Mundo e quando Joseph Blatter parece olhar para o país com aqueles mesmos olhos de conquistas que Havelange o ensinou a usar.

Com a diferença que Blatter é todo melífluo.

Criou-se uma situação desagradável e, aparentemente, Blatter procura no momento impedir que sua vingança contra o ex-genro atinja também o ex-sogro.

Aparentemente, repito.

Se Havelange recebeu propinas em seu tempo de presidente, como insinuam os ingleses, é difícil de crer.

Por suas associações com a ISL e pelo passado desta, pareceu sempre estar na condição de oferecê-las e não de recebê-las.

Além disso, quando chegou à FIFA, já era um milionário e como todos nós sabemos, dinheiro atrai dinheiro.

Possíveis implicações maiores estão alojadas no histórico das relações da FIFA com a ISL, que foi à falência em 1995.

Entre as conquistas de Havelange para que a FIFA alcançasse o poderio atual com patrocinadores de alto vulto, sempre pairou como uma sombra a figura do alemão Horst Dassler, herdeiro da ADIDAS e criador da ISL.

Da troca de favores entre ambos, Havelange/Dassler, escondem-se muitos dos intrincados termos que preenchem milhares de páginas dos processos que a justiça suíça faz caminhar sob segredo desde o século passado.

As gordas propinas vindas da fabricante de material esportivo e mais diretamente da então ISL, soberana em tudo o que gerava proventos na entidade, estão arraigadas nas entranhas da FIFA como cracas nas quilhas dos grandes cargueiros.

Até onde as mesmas colaboraram para a falência dessa empresa só a vinda à luz desses processos dará explicação cabal.

O certo é que, igual aos ministros do governo brasileiro, potentados da FIFA vão caindo, um após outro.

Não deixa de ser tristonho olharmos o outrora prepotente e senhor do mundo João Havelange, hoje com 95 anos, renunciando ao seu cargo no Comité Olímpico Internacional e vendo seu título de Presidente de Honra da entidade que fez crescer ser atirado ao chão.

Os brasileiros estão conhecendo agora mais diretamente, com a força e com as exigências da FIFA para o país sediar uma Copa do Mundo, o que significam esses poderes da entidade.

Ávidos poderes hoje executados por Joseph Blatter e seu secretário geral e que não podemos olvidar, foram criados, introduzidos e aprimorados pelo brasileiro João Havelange.

Para o bem e para o mal.

(Flávio Araújo)

Fonte: Coluna Flávio Araújo - Ribeirão Preto Online