Julio Brant e Vitor Roma comentam reunião do CD e possível recuperação judicial da SAF do Vasco
Sábado, 14/12/2024 - 07:39
Bastidores da Colina: entenda tumulto na reunião do Conselho
Bate-boca e indefinição marcam novo capítulo da política vascaína. Nesta quarta-feira (11), a diretoria do Vasco discutiu no Conselho Deliberativo o ajuizamento da ação de recuperação judicial (RJ), apresentado pela empresa Alvarez & Marsal (A&M), contratada pela gestão Pedrinho. Haveria debate e referendo do ajuizamento da RJ para a Associação – ou seja, aprovação ou reprovação. A reunião, entretanto, foi suspensa após desavença entre alguns conselheiros de oposição e de situação. O conselheiro Leven Siano, duas vezes candidato a presidente do Vasco (2020 e 2023), e o Presidente da Assembleia Geral Alan Belaciano quase tiveram um embate físico. A nova data segue indeterminada.
Como a sessão não foi transmitida para a torcida, a Guerreiros da Colina (GDC) entrou em contato com fontes ligadas a múltiplas correntes políticas do clube, que deram sua visão sobre os acontecimentos. Em alguns casos, a identidade foi preservada a pedido dos entrevistados e a reportagem utilizou nomes fictícios.
SPC Brasil: O ajuizamento de dívida é um recurso legal para que credores recuperem valores não pagos após tentativas de acordo sem sucesso. Então, na prática, ajuizar uma ação de cobrança significa iniciar uma ação judicial detalhando a dívida e notificando o devedor, para que ele inicie as tratativas de defesa.
O que aconteceu?
Dois participantes do encontro – de fora da gestão – consultados pela reportagem afirmam que, para a maioria dos presentes, a ação de RJ que a diretoria administrativa apresentou foi ruim, sem previsão de como conseguir pagar, tampouco da origem dos recursos. Em vista disso, muitos conselheiros teriam julgado a proposta como irresponsável, já que, se o plano de RJ não for seguido à risca, a Vasco SAF abre falência. A Alvarez & Marsal é uma das responsáveis pelo estudo da reestruturação.
"A falta de profundidade no tema deixou todo o Conselho muito preocupado, já que o tema é muito delicado por ser a última instância antes de um processo de falência do clube. Em resumo, se o plano não for cumprido, o clube vai à falência. Como confiar e aprovar uma RJ às escuras? Isso poderia decretar o fim do Vasco."
— Conselheiro Vinicius Machado, em seu Instagram
De acordo com Helder Gama (nome fictício), fonte próxima a opositores da Sempre Vasco (grupo de Pedrinho), um conselheiro da situação deixou no ar, antes do encontro, que a RJ é pro Vasco "respirar por dois anos" – o que coincide com o fim do mandato atual. Em seguida, a oposição começou a dizer que o presidente Pedrinho não quer vender a SAF. A ideia seria induzir o mandatário a falar sobre a negociação, mas ele ficou quieto durante quase toda a sessão do Conselho – conforme o relato de pessoas presentes. Paralelo a isso, o conselheiro Leven Siano se disse contrário à RJ e "estava arrumando confusão com muita gente", segundo Gama.
O conselheiro Caio Torres (nome fictício) acredita que a oposição tinha o objetivo de "tumultuar" desde o início. Ele relata que Leven – um dos líderes da oposição – questionou o Vasco ter saído do Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (PROFUT). Segundo Torres, o conselheiro também disse que a RJ é "sentença de morte" no Brasil, porque o número de falências é expressivo.
No entanto, Torres explica que a condução do tema, em um primeiro momento, vinha sendo bem executada pela diretoria. Teceu elogios ao Presidente do Conselho Deliberativo João Riche, que teria evitado o embate com conselheiros exaltados – integrantes da oposição contra a venda, no intuito de "desqualificar a reunião". Autor do livro "Eurico Miranda Todos Contra Ele", o conselheiro Sérgio Frias teria dito que o Vasco deve ficar como está, porque "sempre se resolveu" – ou seja, sem revenda do futebol. Entretanto, Torres considerou a colocação de "bom tom", e admitiu que o ex-presidente Jorge Salgado, contra a recuperação judicial, "fez uma das explanações mais belas desde que assumiu (a presidência) até hoje".
De acordo com Torres, a temperatura subiu quando Paulo Salomão, 1º VP geral do Vasco, entrou de forma "agressiva" na reunião, com críticas às gestões anteriores. O Presidente da Assembleia Geral Alan Belaciano teria adotado a postura do colega, mas em confronto direto com Leven Siano: o conselheiro fez diversos questionamentos, respondidos por Belaciano, e não propôs nenhuma solução. Uma fonte da situação confirma a história e, assim como Torres, diz que o encontro saiu do prumo quando Belaciano ironizou as cartas de intenção de crédito que poderiam chegar a R$ 5 bilhões para o Vasco, prometidas por Leven na campanha eleitoral de 2020: "traz R$ 1 bilhão que a gente resolve". Com isso, os dois quase chegaram às vias de fato, e a reunião foi suspensa.
"Por que (a sessão) foi suspensa? Porque o João Riche, presidente do Conselho Deliberativo, notou que a diretoria ia perder a votação caso rolasse. Pedrinho e seus pares já buscam votos para aprovar, ao invés de melhorar a RJ. Alguns conselheiros ligados ao Leven Siano estão se aproximando da base da diretoria administrativa. Nos próximos meses, nós poderemos ver algumas pessoas retornando ao Vasco para exercer cargos."
— Helder Gama, à GDC
Torres confirmou à reportagem que, de fato, houve oferecimento de cargos a membros da oposição, embora não saiba dizer quais e nem para que grupos políticos. Mas indicou que há vice-presidências em vacância, e que novas poderiam ser criadas para alocar os conselheiros envolvidos. Em contato com a GDC, a Diretoria do Vasco nega a informação: "Mentira".
Afinal, a SAF será vendida?
Não é segredo que, oficialmente, o presidente Pedrinho deseja vender a SAF do Vasco. O mandatário externou sua posição mais de uma vez em entrevistas coletivas. No entanto, alguns conselheiros de oposição temem que o objetivo da diretoria é aprovar a recuperação judicial para tocar o clube até o final do mandato, sem investidor. Um exemplo é o ex-conselheiro Flavio Lopes, presidente da Comlurb e membro da Confraria Vasco, que se pronunciou a respeito do tema em seu X (ex-Twitter). Em contato com a GDC, a Diretoria do Vasco nega a informação: "Mentira".
"A gestão atual do Vasco pretende propor ao Conselho Deliberativo (CD) uma recuperação judicial, visando uma POSTERIOR venda, provavelmente após o término da gestão atual. Essa proposta será aprovada com quórum não qualificado e maioria simples, ignorando, na prática, a Assembleia Geral Extraordinária (AGE) e a decisão dos sócios. Esse desrespeito aos sócios é inaceitável. Fica difícil permanecer silencioso diante dessa situação. Só não podem ficar chateados quando se diz que o objetivo SEMPRE foi ter o controle do futebol."
— Ex-conselheiro Flavio Lopes, em seu X
Helder Gama falou à reportagem que a oposição, de modo geral, não é contra a recuperação judicial, contanto que como e quando os pagamentos seriam efetuados seja bem definido. Segundo ele, muitos desconfiam que uma RJ apressada serviria para "empurrar a venda com a barriga", enquanto o clube corre risco de falência por não honrar os compromissos. Ou seja, uma RJ aprovada após uma eventual revenda da SAF passaria segurança a diversos conselheiros, visto que, em tese, o Vasco teria caixa para quitar os débitos.
A GDC entrou em contato com Edson Gomes (nome fictício), membro da situação, que reforçou a necessidade de vender o futebol: "O Vasco não tem solução de curto-médio prazo". Gomes explicou que o Estatuto do CRVG não exige aprovação do Conselho sobre a recuperação judicial, mas a diretoria optou por apresentar e deferir no Conselho o ajuizamento da RJ. A reunião não seria sobre venda da SAF em momento algum.
Gomes afirma que "a recuperação judicial é um passo para fazer uma venda melhor", e que a ideia tampouco é postergar as tratativas pela Sociedade Anônima. Pelo contrário, foi enfático: "comprometimento é total pela venda (da SAF)". Ele alega que, enquanto não entrar um novo investidor, a diretoria pretende combater a dívidas do clube via mediação com credores, RJ e aumento de receita. "Facilitadores, não dificultadores", disse à reportagem.
Diretoria do Vasco, à GDC
"Enquanto o investidor ou a venda não se concretizam, a responsabilidade de manter as operações continuam. A melhor venda, o dia a dia e a reestruturação do clube andam concomitantemente."
A GDC também questionou Gomes acerca dos rumores de que, dentro da gestão, há pessoas contra a venda do futebol. Ele respondeu que é uma "minoria insignificante". Entretanto, Caio Torres deu uma versão (parcialmente) diferente: a maioria da Sempre Vasco é a favor da venda da SAF, mas os poucos contra figuram entre as lideranças da chapa. Torres complementa que o presidente Pedrinho, provavelmente, de fato deseja realizar o negócio, mas estaria sendo "influenciado" por membros da gestão a retardar o processo. Em contato com a GDC, a Diretoria do Vasco nega a informação: "Mentira".
O ex-jogador Edmundo Souza, integrante da Sempre Vasco, disse em seu canal "Mundo Ed" que quem manda na chapa são o presidente Pedrinho, o diretor técnico Felipe Loureiro, o Presidente da Assembleia Geral Alan Belaciano, o conselheiro Christiano Campos e o VP de Relacionamento com a SAF Marcelo Macedo, mais conhecido como Tangerina.
Voz da política
A GDC entrou em contato com o ex-VP de marketing do Vasco Vitor Roma, da Confraria Vasco, e com o conselheiro Julio Brant (2015-2026), e perguntou sobre os últimos acontecimentos na reunião do Conselho Deliberativo. Brant lamenta o tumulto e Roma, que não esteve presente no encontro, reforça seu apoio à revenda do futebol.
"Lamento que a reunião não tenha chegado até o final, porque ela aborda um tema técnico, de extrema importância para o futuro do Vasco. Que a diretoria administrativa possa, nessa nova reunião, apresentar o plano de recuperação judicial proposto para o Vasco. Com isso, o Conselho Deliberativo teria condições de encaminhar aprovação ou reprovação do plano."
— Conselheiro Julio Brant
"Só espero que o foco esteja na venda logo, um investidor. Não teremos como competir no futebol brasileiro sem um investidor forte. Esse precisa ser o foco."
— Ex-VP de marketing Vitor Roma
A GDC também questionou a dupla sobre ela ser a favor ou contra a transmissão das reuniões para a torcida – canal CRVG TV, do Associativo. Vale destacar que, na gestão Salgado, os encontros eram disponibilizados gratuitamente no YouTube.
As reuniões do Conselho Deliberativo deveriam voltar a ser transmitidas. Só vejo benefícios, é um retrocesso isso acontecer. Se quiser fechar, que seja aberto ao menos para o quadro associativo do clube."
— Conselheiro Julio Brant
"Lamento muito que uma reunião tão importante não tenha sido transmitida para que os vascaínos acompanhassem. Este foi um grande avanço da gestão Jorge (Salgado) que se perdeu nessa gestão. Um assunto tão sério quanto uma possível recuperação judicial, que é o desejo da diretoria administrativa, não pode ser discutida às escuras."
— Ex-VP de marketing Vitor Roma
Perguntado sobre a ausência de transmissões, Edson Gomes explicou que isso se deve ao medo de questões estratégicas vazarem. Porém, o assunto é dividido dentro da Sempre Vasco, na qual boa parte dos integrantes defende a abertura das sessões para a torcida. Gomes também disse que é necessário ter o próximo encontro do Conselho para que a ata da reunião seja aprovada – leia-se o relato oficial de tudo o que ocorreu no evento.
Diretoria do Vasco, à GDC
"Processos em segredo de justiça e informações confidenciais como financeiras não serão abertas ao público, seja por cumprimento de decisão judicial, seja por sigilo das informações estratégicas do clube."
Fonte: Guerreiros da Colina