O técnico do Nova Iguaçu, Carlos Vitor, contou com uma dica improvável para ajudar seu time a superar o Vasco e chegar à final do Campeonato Carioca. Sua filha Letícia, de 20 anos, divide com ele o amor pelo futebol e o sonho de ver o time da Baixada Fluminense conquistar o estadual. No sábado, Nova Iguaçu e Flamengo se enfrentam no primeiro jogo da decisão, às 17h, no Maracanã.
Letícia não gostou nada de ouvir o técnico Ramón Díaz garantir o Vasco na final do Campeonato Carioca, minutos após ver seus jogadores serem encurralados pelo Nova Iguaçu, no Maracanã. Ela achou que o argentino foi soberbo e se queixou com o pai, depois de assistir à entrevista, no início de março. A partida terminou de ida terminou empatada e deu à jovem uma boa perspectiva de ver o Nova Iguaçu se classificar para a decisão dali a uma semana.
O jogo da volta não saia da cabeça nem a declaração do técnico argentino. Letícia passou os dias sondando redes sociais, lendo análises. Quando seu pai retornou da partida contra o Inter, pela Copa do Brasil, recebeu uma foto com a provável escalação do Vasco, em uma formação modificada. Carlos Vitor leu e guardou. No dia seguinte, o analista Rômulo Gomes levou ao técnico informações parecidas, que corroboraram a versão da filha.
- Falei para ele sobre o Piton. Disse: ‘pai, o Piton estava incomodando, estava muito avançado, tem que ter cuidado com o Piton e o Payet". E ele falava: ‘Pode deixar, que o papai tá de olho' - contou Letícia.
- A gente estudou, mexeu na estratégia e comportamento e encaixamos nosso jogo - disse Carlos Vitor.
O Nova Iguaçu venceu por 1 a 0 diante de 60 mil pessoas - a maioria formada por vascaínos - e se classificou para a final contra o Flamengo. A promessa de Ramón Díaz não se cumpriu e, no fim, Letícia desculpou o argentino. "Por outro lado, entendi que ele queria animar o time dele", considerou.
Desde a infância, o futebol foi um elo entre pai e filha. Carlos Vitor fez carreira como jogador e, ao se aposentar, se tornou funcionário do Nova Iguaçu. Somava mais de 10 anos de clube, quando Letícia nasceu. O CT era uma segunda casa, em que acompanhava seu pai nos treinos e jogos. Nas folgas dele, assistiam juntos a partidas da várzea de Cordovil, bairro em que moram, na Zona Norte do Rio. Em dado momento, ela não se contentou em ver e passou a jogar, chegou a ser aprovada em um teste para a base do Vasco, mas não conseguiu prosseguir.
Letícia também conviveu com momentos difíceis do pai, como o rebaixamento do Nova Iguaçu em 2020. Carlos Vitor foi demitido do profissional. Mas a boa relação com o clube permitiu que ele permanecesse atuando na base.
- Ele foi para o sub-20 depois da demissão e falava que tudo fazia parte de um propósito, de tudo que aconteceria na vida dele no futuro - recordou a jovem.
Nos anos seguintes, Carlos Vitor reassumiu o time e fez boas campanhas no Carioca, se mantendo entre os oito melhores. Mas 2024 é diferente. O Nova Iguaçu nunca havia chegado em uma semifinal da primeira divisão, tampouco em uma decisão.
Carlos Vitor não esperava tamanha repercussão de sua equipe e tem encontrado alguma dificuldade com o aumento das interações nas redes sociais. Mais uma vez, precisa recorrer à auxiliar, Letícia, que recebeu a responsabilidade de responder às mensagens de novos admiradores do trabalho e filtrar tudo o que falam sobre ele na internet.
A euforia dos torcedores tem justificativa. O time tem apresentado um futebol competitivo e só perdeu para um grande, o Fluminense, na fase de classificação. Os resultados foram construídos com um futebol propositivo, nos pés de jogadores jovens, com boa técnica, velocidade e disposição para atacar e defender com intensidade. Carlos Vitor tem em quem se inspirar.
- A forma que Flamengo e Nova Iguaçu jogam, em esferas diferentes e com peças diferentes, tem um feitio parecido. Tem um bom controle da bola, boa troca de passe, troca de corredor, procurando sempre a profundidade, sempre o homem na área. As duas equipes sabem os momentos de baixar as linhas e compactar, precisam defender bem. É um perfil que me agrada muito, a experiência que o Tite tem. Não tem como não ser um admirador de tudo o que ele fez - revelou Carlos.
Falando em Tite, Letícia já retomou os trabalhos. Nos últimos dias, tem se debruçado em vídeos que analisam as escolhas táticas rubro-negras, mapeou o posicionamento das linhas e a forma de atacar.
Quando questionada sobre as possibilidades do Nova Iguaçu, ela repetiu o bordão do pai: "a comissão técnica e os jogadores estão todos preparados, física e psicologicamente". Apesar da confiança aparente, um jogador, em específico, tem preocupado mais.
- Falei para ele: "pai e o Arrascaeta?" Tem que ter marcação no Arrascaeta, não pode deixar ele jogar, tem que rodear o tempo todo, sem deixar respirar. Ele respirando é um problema - brincou.
No próximo sábado, ela, o irmão e a mãe estarão no Maracanã para apoiar o pai e, quem sabe, perceber alguma informação que possa contribuir. Carlos Vitor vai tentar mais uma vez surpreender uma equipe grande. Ele tem um propósito.
- Ninguém nasce grande. Deus não nos permitiu chegar à toa. Vamos estudar todas as formas possíveis, com todo respeito. A gente sabe que o Flamengo é muito forte, mas futebol se resolve em campo - concluiu.
Fonte: ge