Questionado desde a indicação como CEO da SAF, Luiz Mello deixa o Vasco acumulando críticas e desafetos
Anunciada na terça-feira, a saída de Luiz Mello do cargo de CEO do Vasco encerrou passagem de dois anos e meio, que teve diversos momentos conturbados nos últimos 12 meses. O dirigente, homem forte da SAF, que assinava documentos do clube como diretor-presidente, esteve à frente das principais decisões desde o início de 2021, participou ativamente da transição para a SAF, ganhou força com a chegada da 777 e, assim, tornou-se alvo de fortes críticas.
Ao mesmo tempo em que acumulou prestígio com executivos do grupo americano, Mello colecionou inimigos no Vasco associativo, do qual era CEO desde janeiro de 2021. Sua nomeação para CEO da SAF, em 8 de agosto de 2022, causou espanto, revolta e teve como consequência uma debandada de vice-presidentes da gestão de Jorge Salgado.
Ligado ao ex-VP de Finanças Adriano Mendes, Mello foi nomeado por Jorge Salgado em janeiro de 2021, mas não teve boa relação com muitos vice-presidentes enquanto CEO do Vasco associativo. Dias antes de os sócios aprovarem a venda de 70% da SAF para a 777, houve uma reunião de avaliação do trabalho do dirigente, e vários VPs se queixaram.
O ge apurou que Jorge Salgado já havia se decidido pela demissão de Mello, mas foi surpreendido com o anúncio da 777 de que o executivo seria o CEO da SAF. Minutos após o comunicado do grupo americano, o Vasco emitiu uma nota na qual anunciava o desligamento imediato de Luiz Mello da função de CEO da associação, em ato mais simbólico do que prático. Mello também não foi informado que o clube divulgaria o comunicado.
Avisado da nomeação de Mello para a SAF horas antes do anúncio, Jorge Salgado se reuniu com seus VPs e procurou a 777 para relatar sua insatisfação. O presidente, segundo aliados, se sentiu traído pelo CEO, considerou antiética a situação e pediu para que a decisão fosse revista.
Há relatos, inclusive, de que Jorge Salgado, por um bom tempo, não aceitava ficar no mesmo ambiente de Mello. O CEO, no entanto, teve respaldo da 777, que tinha o dirigente como homem de confiança no Brasil.
- Eu sei que foi dito que poderia haver um conflito com relação à escolha do Luiz para essa função. Na verdade, na visão da 777, nós pensamos que seria a decisão perfeita. Agora seremos parceiros da associação, seremos uma família. Quem melhor para dar sequência ao progresso que a pessoa que estava trabalhando para isso previamente? - disse Josh Wander, em entrevista ao ge, em 1º de setembro do ano passado.
Com aval e respaldo das lideranças da empresa, Luiz Mello navegou por um período em águas calmas, especialmente após o Vasco garantir, em novembro, o acesso à Série A. Embora ele costumasse dizer que não se envolvia no dia a dia do futebol, o executivo foi importante, por exemplo, na contratação de Orellano, quando foi à Argentina para convencer o jovem a se transferir para o Vasco.
Com as contratações e investimentos realizados no início do ano, além dos salários em dia, Mello teve paz para lidar com questões como Liga e Maracanã. Foi elogiado, inclusive, por uma entrevista ao "Seleção sportv", ao defender o Vasco em polêmica com o Fluminense sobre o uso do estádio.
No entanto, com o início desastroso no Campeonato Brasileiro, as críticas voltaram com força. A pressão que era interna ganhou corpo com a insatisfação de torcedores.
O clube associativo passou a criticar Mello com mais frequência para a 777. Embora o controle seja da empresa americana, o Vasco ainda é um sócio importante, com 30% das ações da SAF. No mês passado, o clube cogitou pedir o desligamento de Mello após uma denúncia de que ele teria assinado o termo de posse como sócio do Flamengo. Mello tinha plano ativo de sócio-torcedor do Rubro-Negro quando assumiu o controle da SAF. A 777, no entanto, minimizou a questão.
Entre os torcedores, a situação piorou e foi inflamada pelo pior início do Vasco na história do Campeonato Brasileiro. Além de críticas, Mello e sua família passaram a ser alvos de ameaças.
- Meu único grande descontentamento neste processo todo é quando as críticas extrapolam o lado profissional. Tenho sido ameaçado de morte, minha família está exposta, meu telefone está circulando em redes sociais. Há, deste lado, uma pessoa que está fazendo o seu melhor, que está aplicando todo o seu esforço e conhecimento em prol do Vasco sete dias por semana – desabafou em entrevista ao ge, no mês passado.
Elogios do mercado, dívidas e críticas internas
Ex-presidente da APFUT (Autoridade Pública de Governança do Futebol), órgão criado em 2016 pelo governo Michel Temer para fiscalizar o futebol, Luiz Mello chegou ao Vasco na condição de profissional elogiado no mercado.
Mello foi indicado neste mês ao Prêmio Confut, como um dos três melhores CEOs do futebol sul-americano. Ele também foi cotado pelo Flamengo, inclusive, para assumir a gestão do Maracanã na gestão de Eduardo Bandeira. E foi a ligação com o ex-presidente rubro-negro que o tirou da disputa para assumir a administração do estádio na gestão de Rodolfo Landim, embora seu nome fosse bem avaliado. No Vasco, no entanto, Mello conviveu com críticas.
Embora desafetos questionem sua competência, o ge ouviu de várias pessoas que trabalharam com Mello no Vasco que ele é um profissional correto, capacitado e teve vitórias importantes, como a inclusão do clube no Regime Centralizado de Execuções (mais de R$ 40 milhões em dívidas trabalhistas foram quitadas), além do aumento com bilheterias e de receitas com o plano de sócio-torcedor. Além disso os funcionários do Vasco estão com salários em dia e passaram a receber benefícios como plano de saúde, em sua gestão. Por outro lado, há relatos de que Mello às vezes peca pela burocracia e pela inflexibilidade.
Também há críticas pelo fato de ele não ter o costume de defender institucionalmente o Vasco, embora tenha ido bem na questão do Maracanã, em polêmica envolvendo o Fluminense. As muitas dívidas com clubes e empresários, contraídas neste ano, também caíram na conta do dirigente. O futebol nunca escondeu que essa era da gestão a responsabilidade de organizar o fluxo de caixa.
O Vasco foi acionado, até o momento, por pelo menos três clubes por falta de pagamento, além de ter sido notificado por empresários devido a atrasos na quitação de comissões. A administração da SAF minimiza a questão e alega que os atrasos acontecem por questões de fluxo de caixa.
Mello não foi a público explicar as questões. Seu silêncio também recebeu críticas dos opositores, que entendem haver distanciamento da SAF com o torcedor. Quando apareceu, após a derrota para o Cruzeiro, no dia 8 de julho, o então CEO também foi muito criticado. Em pronunciamento de 1min35s de duração, o executivo não apresentou soluções, pediu desculpas três vezes e disse que os dirigentes estão mais frustrados do que os torcedores. Os relatos, no entanto, são de que essa é a forma como a 777 trabalha e não permite que seus dirigentes concedam entrevistas com frequência.
Nas últimas semanas, com menos queixas públicas, mas muita conversa nos batidores, a associação intesificou as críticas a Luiz Mello. O CEO foi convidado pela 777 Partners para assumir um cargo do grupo no exterior. O ge ouviu diversos relatos de que a decisão se deu devido aos resultados, à avaliação do trabalho da SAF e à pressão interna e externa pela saída de Mello do principal cargo do Vasco. Não havia clima para a sequência do trabalho. Por enquanto, o executivo seguirá no grupo, mas não terá mais nenhuma relação com o Vasco.
No Vasco SAF, no entanto, a informação oficial é que CEO foi promovido para um cargo no exterior, uma vez que o Vasco seria uma referência administrativa entre os clubes da 777. Mello recebeu o convite e decidiu assumir um novo cargo na empresa para trabalhar ao lado de Don Dransfield, chefe global do grupo de futebol da 777. Embora haja o desencontro de versões, o fato é que Mello encerrou seu ciclo no Vasco nesta terça-feira.
Fonte: ge