Vitor Roma: 'O Vasco busca liderar um processo de discussão para combater qualquer tipo de discriminação no futebol'
Às vésperas do Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAP+, o Vasco se posiciona firmemente no combate à homofobia e à transfobia. O mosaico instalado em São Januário e a publicação de um manifesto, reforçando seu papel histórico de inclusão (leia a íntegra aqui), marcam a mudança que o clube promete fazer também "dentro de seus próprios muros".
É justamente essa a etapa seguinte que muitos clubes brasileiros ainda não alcançaram contra o preconceito. Sobram mensagens nas redes sociais, mas a causa carece de ações concretas em um ambiente que ainda apresenta resistência. Levantamento do jornalista João Abel, autor do livro "BICHA! homofobia estrutural no futebol", realizado em 2020, mostrou que 18 dos 20 maiores clubes do país se manifestaram no Dia Internacional do Orgulho daquele ano — um salto comparado à falta de menções em 2016, mas ainda ainda longe de atos efetivos.
Para o antropólogo Wagner Xavier de Carvalho, que estuda as relações entre esporte e gênero, falta suporte maior da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) na questão. Ele acompanhou reuniões da entidade que comanda o futebol na Alemanha em que foram discutidas ações para combater a homofobia e a transfobia. O grau de engajamento dos alemães diante dos húngaros na pauta sobre gênero na Eurocopa é resultado de trabalho que vem desde 2006, diz ele:
— Só fazer postagens nas redes não vai adiantar. O que eu vi de mais interessante na Alemanha foram oficinas de formação de pensamento nos clubes, trabalhando com todos, do mais básico funcionário até jogadores. E o resultado disso será visto a longo prazo.
Guinada tricolor
O Bahia se tornou referência da defesa da diversidade e da inclusão de minorias. Desde 2019 permite a qualquer pessoa a identificação pelo nome social, demanda antiga de pessoas trans, seja funcionários ou sócios. Em março desse ano, o cruz-maltino também adotou a medida.
— Avançamos na questão da visibilidade, mas não é suficiente. É preciso que clubes levem a pauta para seu público interno — diz Onã Ruda Silva, da torcida Bahia LGBT e membro do Núcleo de Ações Afirmativas do clube.
O Internacional, outro na vanguarda, possui uma diretoria de inclusão social. Em seus contratos, estipula punições que podem chegar à demissão por justa causa para prática de discriminação.
Não era o caso do Vasco em 2019. Na comemoração da vitória sobre o Fluminense, Fellipe Bastos publicou um vídeo onde se referia ao tricolor como "time de veado". Ele recebeu punição do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, mas não do clube. Quem reagiu foi o Flu, que marcou posição.
Através das redes sociais, a hashtag "#TimeDeTodos" foi usada inicialmente como resposta contra a homofobia. Assim, transformou a provocação em símbolo, que segue ativo. Já o Botafogo anuncia na segunda-feira a criação da primeira torcida LGBTQIAP+ do clube.
No Vasco, a luta contra o preconceito é quase centenária, vem desde a Resposta Histórica, como ficou conhecido o posicionamento em 1924, ao se negar a afastar jogadores pretos para ser aceito na nova liga criada no Rio. A atual gestão definiu os direitos da comunidade LGBTQIAP+ como a principal causa a defender.
— O Vasco sempre foi um clube protagonista neste contexto de transformação social. Não podemos, num momento tão importante, se esquivar. O Vasco busca liderar um processo de discussão para combater qualquer tipo de discriminação no futebol — afirmou Vitor Roma, vice-presidente de marketing do Vasco.
Mudanças
O desafio dos clubes é não retroceder diante da reação negativa de parte de seus torcedores e associados. No Sport, um conselheiro viralizou ao reagir com comentários homofóbicos depois que o ex-BBB Gilberto, torcedor do Leão, gravou vídeo dançando na Ilha do Retiro. A diretoria emitiu nota de repúdio e um sócio pediu a abertura de processo para expulsar o conselheiro.
Atitudes mais concretas dos clubes geram esperança de que chegue o dia em que a arquibancada de um jogo de futebol seja um lugar acolhedor para todos.
— Não queremos privilégios. Assim como um casal hétero se beija quando seu time faz um gol, o casal homo quer fazer o mesmo. Estar de mãos dadas no estádio — afirmou William De Lucca, jornalista e ativista pelos direitos humanos.
Fonte: O Globo Online