Como no jogo "cabo de guerra", o treinador do Vasco já viveu os dois lados possíveis em três meses de Colina. Esteve firme no início, consistente e nas graças da torcida. De meados de maio para cá, porém, o time passou a escorregar, perdeu força e veio a contestação.

Desde o primeiro treinamento que comandou no CT do Almirante, em 8 de março, Marcelo Cabo soma 20 jogos à frente da equipe vascaína, com nove vitórias, oito empates e três derrotas. Começou em lua de mel com os torcedores por ter dado padrão de jogo e intensidade ao time rapidamente. A partir das finais da Taça Rio e do início da Série B, a organização já não era mais a mesma, e a falta de atenção dos atletas começou a saltar aos olhos.

Primeiras impressões: time encaixa, mas peca na bola parada

Depois de a torcida do Vasco ter se acostumado a ver o time jogando como um bando em campo a partir da chegada de Ricardo Sá Pinto e da implantação de um esquema com três zagueiros que nunca foi digerido pelos atletas, Marcelo Cabo rapidamente organizou a equipe.

Com contratações e observação de bons valores, foi elegendo seus 11 preferidos. Fez rapidamente dos três primeiros reforços, Ernando, Zeca e Marquinhos Gabriel, titulares absolutos. Os dois últimos logo responderam com boas atuações. Além disso, pinçou o volante Matías Galarza e o atacante Gabriel Pec da equipe de jovens que iniciou o estadual.

O treinador também teve o mérito de recuperar o bom futebol de Andrey, que andava desacreditado dentro do clube e com futuro em São Januário em xeque. Desde o princípio deixou claro ao executivo Alexandre Pássaro que o volante era uma de suas prioridades.

Em meios a esses acertos, um problema ficou escancarado, e Marcelo Cabo não se furtou de declarar em diversas coletivas que a bola aérea era o calcanhar de Aquiles do Vasco. Isso ficou acentuado quando o time sofreu gols desta forma em cinco partidas consecutivas, desde a vitória sobre o Macaé por 3 a 1 até o triunfo por 2 a 1 sobre o Tombense, jogo no qual foi vazado em cabeçada do hoje vascaíno Daniel Amorim.

O jogo: Flamengo 1x3 Vasco

Mesmo que Cabo reconhecesse abertamente o problema no jogo aéreo, o Vasco vinha bem, porém faltava "o jogo", aquela atuação de encher os olhos contra um rival de peso e sem contestação. A equipe tem foi bem contra o Fluminense, quando dominou o clássico no empate por 1 a 1, mas a exibição que encheu os olhos da torcida aconteceu em 15 de abril, contra o milionário Flamengo. O time chegava embalado pela classificação contra o Tombense na segunda fase da Copa do Brasil, conquistada oito dias antes. Após o triunfo sobre os mineiros, o treinador afirmou que encontrara a espinha dorsal.

E a confiança de Cabo em Lucão (que iria para o banco na rodada seguinte após a chegada de Vanderlei) Léo Matos, Ernando, Leandro Castan e Zeca; Andrey, Galarza e Marquinhos Gabriel; Pec, Morato e Cano foi justificada contra o arquirrival.

O Vasco abriu o placar no jogo aéreo, em escanteio batido na medida por Zeca e finalizado com cabeçada certeira de Léo Matos, e em nenhum momento sofreu no que era o calcanhar de Aquiles. Ganhou na intensidade, no combate e na disposição. Fez um jogo praticamente perfeito, e os dois gols posteriores mostraram isso.

No segundo, uma jogada construída de pé em pé terminou com bela finalização de Cano. O terceiro mostrou a execução perfeita de um contra-ataque, com Marquinhos Gabriel colocando Morato em condições de deixar Filipe Luís no chão e finalizar com precisão. O gol adversário no fim foi pura formalidade, mas o espírito do time era tão forte àquela altura que Leandro Castan ficou revoltado ao ver Vitinho balançar a rede de Lucão.

O inimigo agora é outro: sai a bola aérea, entra a desatenção

Em seu discurso oficial, o Vasco tratou a Taça Rio, torneio de consolação aos eliminados na primeira fase do estadual, como uma preparação para a Série B. Portanto não era de se esperar grandes atuações, mas a partir das finais com o Botafogo pôde-se observar um time desatento, que repetiu erros do empate com o Boavista por 2 a 2, na penúltima rodada da Taça Guanabara e partida que pôs fim às chances de classificação às semifinais do Carioca.

O pior jogo foi justamente o que fez do Vasco campeão da Taça Rio. Entrou mal, fez péssimo primeiro tempo, até esboçou reação no segundo, mas foi justamente derrotado por 1 a 0. Como vencera o primeiro jogo pelo mesmo placar - e sem jogar bem -, decidiu nos pênaltis e foi campeão com o brilho de Vanderlei, que defendeu três cobranças.

Uma semana depois, estreou na Série B e mais uma vez entrou desligado em campo. Desta vez, porém, o Operário-PR foi avassalador e atropelou o Vasco no primeiro tempo. Resultado: ficou barato o revés por 2 a 0 em São Januário, e Léo Matos desabafou após o duelo justamente sobre a postura do time:

- Costumo dizer com meus amigos e família que o homem não pode apanhar na mesma esquina duas vezes. Se ele passou por ali, não deu certo e apanhou, ele tem que ir por outro caminho. No Campeonato Estadual, já tivemos situações parecidas com essa, de entrar sem intensidade em campo. Já falamos desde o início: se a gente não igualar na força, não vai ganhar. Equipe muito bem preparada, veio aqui, deu um nó na gente. A gente não conseguiu se livrar. Marcelo vem tentando implementar o sistema de jogo dele há três meses, muitas vezes a gente conseguiu fazer, mas hoje foi um dia infeliz em que não conseguiu aplicar nada do que ele pede.

Após a estreia, o Vasco voltou a campo pela Série B contra a Ponte Preta (1 a 1) no intervalo dos dois jogos com o Boavista (1 a 0 e 1 a 1) pela Copa do Brasil. Foi mal nos três jogos, chamando atenção pela lentidão e desligamento do time.

Alívio vem com virtude comum nos principais feitos

Em seu terceiro jogo na Série B, diante do Brasil, em Pelotas, o Vasco apresentou velhos problemas e jogou mal, mas conseguiu fundamental vitória com virtude que já foi problema defensivo e apareceu nos grandes triunfos com Marcelo Cabo: a bola parada ofensiva.

O gol do desafogo, marcado aos 34 minutos por Daniel Amorim, deu-se em jogada aérea muito bem construída. Pec bateu escanteio com precisão no segundo pau, Ricardo Graça escorou, e o grandalhão Daniel Amorim empurrou para a rede.

Vale lembrar que os principais feitos da equipe em 2021 sempre se deram com gols na bola parada. No empate por 2 a 1 com a Caldense, pela primeira fase da Copa do Brasil e no segundo jogo de Cabo à frente da equipe, o gol vascaíno veio em falta batida por Marquinhos Gabriel. É verdade que o meia contou com a sorte, mas o que vale é bola na rede.

Na mesma Copa do Brasil, mas na segunda fase, o Vasco praticamente garantiu a classificação diante da Tombense quando Andrey, também numa falta - esta muito bem batida -, fez 2 a 0. No fim, Daniel Amorim, hoje vascaíno, diminuiu, mas nada adiantou.

No clássico com o Flamengo, como citado no início, a vitória por 3 a 1 começou a ser desenhada no início do duelo após cobrança de escanteio. Contra o Brasil, a arma da bola parada voltou a dar as caras. E tudo isso sem falar nos pênaltis com o Botafogo, em que o Vasco teve 100% de aproveitamento tanto em relação aos batedores quanto a respeito de Vanderlei, que defendeu três cobranças.



Fonte: ge