Carlos Brazil fala sobre os problemas enfrentados pelas categorias de base com a pandemia
Se a data de retorno do futebol profissional no Brasil ainda é incerta, a pandemia do novo coronavírus tem provocado danos silenciosos e ainda mais profundos nas categorias de base, que ameaçam não retornar às atividades em 2020. Embora representem uma parcela pequena do orçamento das equipes da Série A — na média até 5% — , os primeiros cortes realizados pelos clubes atingiram exatamente este setor mais frágil.
Flamengo, Sport e Vasco são exemplos de equipes que demitiram profissionais das categorias inferiores. O Corinthians reduziu 70% dos salários de seus funcionários. Já o Internacional acabou com o seu time de aspirantes ainda antes da paralisação. O principal motivo para o corte é justamente a falta de perspectiva de retorno do calendário e a dificuldade de se imprimir um protocolo de saúde e segurança como está previsto para os times principais.
Em alguns casos, aproveitou-se a realidade econômica menos animadora para enxugar o excesso de profissionais em determinadas funções, como no Flamengo. Segundo fontes ouvidas pelo GLOBO, há chance de se manterem para este ano apenas os torneios sub-20, conforme indicou a Federação Paulista de Futebol. A CBF suspendeu competições sub-17 e sub-20 em andamento, e ainda não sinalizou quando elas retornam. Os clubes receberam da entidade a indicação de que os jogos, se voltarem, podem até entrar por 2021.
A Federação de Futebol do Rio também suspendeu os torneios da base que estavam previstos. O recado da Ferj é que as competições serão realocadas no tempo que restar do ano, ainda que em outros formatos. O mesmo ocorreu em outros estados, como Pernambuco.
Mais exigências
O drama invisível é que não é possível a base retornar com o protocolo do profissional, pois a quantidade de pessoas envolvidas é muito maior. Ainda há o agravante do alojamento dos jogadores e da necessidade de os garotos estudarem enquanto treinam, condição para a certificação da CBF como clube formador.
Executivo do Internacional, Rodrigo Caetano enumera as dificuldades ainda sem solução:
— Entre as exigências, uma delas é que os atletas alojados têm que estar matriculados. Se as escolas voltam e o futebol não, onde o menino vai morar? Fora esse protocolo de aglomeração nos alojamentos, refeitórios, mais trabalhoso e custoso do que no profissional. Mais atletas, mais rotatividade de pessoas.
Mesmo assim, entrou em cena o Movimento dos Clubes Formadores do Futebol Brasileiro (MCFFB), com um apelo para a retomada das competições, sob o risco de demissões em massa na categoria de base. Um comunicado divulgado ontem reforçou a preocupação.
— Ninguém pode prever o que vai acontecer nos próximos dias e meses. É importante que todos os dirigentes tenham entendimento que qualquer minuto de treino e jogo na base faz enorme diferença na formação dos atletas — reforçou Carlos Brazil, diretor do MCFFB.
Brazil acredita que a base vai ser a solução na crise:
— Acredito que as equipes profissionais terão necessidade de contar com a base, independente de problemas financeiros. Haverá, certamente, um acúmulo de jogos para que seja cumprido o calendário.
Para Rodrigo Caetano, isso acontecerá ano que vem, quando a conta chegar:
— Quando chegar em dezembro, os clubes devem avaliar o déficit e usar mais jovens do que contratar.
Enquanto isso não acontece, o Vasco, clube que tem a base gerenciada por Carlos Brazil e demitiu apenas três profissionais, mantém atletas de sete aos 20 anos em atividade constante, com contatos diretos de toda comissão técnica. O mesmo acontece em outros clubes da Série A. Há consenso entre eles que a base não deverá voltar às atividades junto com o profissional, mas isso dependerá da decisão de cada clube. Entretanto, a ideia é que isso só aconteça quando não houver tanta necessidade de investimentos, o que deve comprometer a formação de jogadores.
— Base é investimento, e seu recurso humano, se houver perda, pode haver dificuldade de reposição com a mesma qualidade nofuturo — alerta Brazil.
Fonte: O Globo Online