Desta vez entrevistamos Marcelo Lages Ramalhete, figura de destaque no futebol de mesa do Estado do Rio de Janeiro como atleta, dirigente do Vasco da Gama e vice-presidente da Federação de Futebol de Mesa do Estado do Rio de Janeiro (FEFUMERJ).
José Carlos – Fale sobre o seu primeiro contato com o futebol de botão.
Marcelo Lages – Foi ainda criança, jogava sempre com meu irmão, o José Antônio Ramalhete. No início em uma mesa de fórmica que era utilizada para refeições. Ele desenhava com lápis o campo, depois a gente apagava. Mais tarde já na juventude ele comprou uma mesa e vários times de botão da Brianezi dando início assim a uma interminável série de competições com os amigos na garagem lá de casa. Era um grupo de aproximadamente 20 pessoas.
José Carlos – Como foi a passagem para o futebol de mesa oficial?
Marcelo Lages – Através da Copa Placar no Shopping Via Parque. Fiz a inscrição e recebi uma regra resumida da 12 Toques. Neste evento conhecemos o Reynaldo Antunes e o Adriano Moutinho, que depois enviaram convites para a Associação Metropolitana (onde joguei 2 torneios) e Associação Rio de Futebol de Mesa, onde fiquei e participei da ata de fundação.
José Carlos – Você é um pioneiro no e grande incentivador do futebol de mesa do Rio de Janeiro. Gostaria que você explicasse a formação do vitorioso Departamento de Futebol de Mesa do Vasco da Gama.
Marcelo Lages – O Vasco da Gama nasceu de uma teimosia. Após a disputa do Estadual de 2002, a Associação Nilopolitana e a Casa de Viseu haviam perdido todos os seus jogos e duelaram para fugir da lanterna. A Nilopolitana venceu o confronto. Naquela época se jogava com 6 (seis) na equipe e ambas tinham no máximo umas 3 linhas que pontuavam. A ideia era fundir e formar uma equipe competitiva. A ANFM tinha patrocinadores e uma melhor campanha, assim sendo, convidamos os atletas da Casa de Viseu para migrarem mas a Casa de Viseu queria exatamente o oposto. Sem consenso, observamos que os 6 jogadores que formariam a equipe titular tinham uma coisa em comum. Todos eram vascaínos. O jeito foi bater na porta do já falecido Dr. Eurico Miranda e pedir autorização para criação do Departamento de Futebol de Mesa do Vasco. Com o pleito aprovado, conseguimos reforçar a equipe com o Dudu (também vascaíno) e junto com ele vieram Ramos, Amon-Rá e Alessandro. Nascia um Vasco poderoso que já no seu primeiro ano venceu o Interestadual, Copa FEFUMERJ e o Estadual de Equipes.
José Carlos – Quais foram seus principais parceiros nesse projeto?
Marcelo Lages – No projeto de formação, inicialmente foi o Raphael Couto, todavia, nas primeiras dificuldades, abandonou a caravela sendo substituído pelo Igor Monteiro, esse sim, remou junto o tempo inteiro. Tive muito apoio do José Antônio e do falecido Miro também, que com o tempo foram substituídos pelo Bad e Dudu. Posterirormente foram surgindo as outras modalidades e cada uma com uma espécie de VP dentro do organograma do Vasco. Guto na Bola 3 Toques, Robson Marfa no Disco e Fernando Lassala no Dadinho estão na história do Departamento.
José Carlos – Você praticou diversas modalidades. Com qual você tem mais afinidade e por que?
Marcelo Lages – Eu vejo a beleza e competitividade de todas elas. Tenho uma maior identificação com a Bola 12 Toques pois foi nela que tudo começou de forma oficial.
José Carlos – Quais as suas principais conquistas?
Marcelo Lages – A principal conquista são as amizades, tenho amigos que vão durar pela vida toda, pessoas que tive a oportunidade de conhecer através do Futebol de Mesa e que juntos vivemos momentos inesquecíveis. Nas mesas vc mesmo me falou uma vez que pareço a Itália, um jogo meio burocrático, mas competitivo e de resultado. No jogo de equipes (minha preferência) ganhei mais do que um dia poderia imaginar com o Vasco e com as Seleções do Brasil e do Rio. Individualmente, venci mais de 10 estaduais, alguns brasileiros, sul-americanos e um mundialito. Fica difícil destacar uma conquista, mas vou citar a Copa do Brasil Máster de 2007 em Blumenau na modalidade Bola 12 Toques, por uma série de fatores, tais como, a dificuldade em manter a liderança durante toda a competição por pontos corridos, a qualidade dos adversários, o evento em si, a cidade, e a premiação, que considero uma das bonitas que vi até hoje, bem como, por ter sido minha primeira grande conquista individual nas mesas.
José Carlos – Qual o adversário mais difícil de enfrentar?
Marcelo Lages – O Carlos Alberto, não sei se ele ainda está jogando no America. De vez em quando eu vencia algumas partidas, mas em regra ele saia vitorioso da mesa. O filme era sempre o mesmo. Ele ganhava a saída de bola, dava 3 toques e acertava um balaço de longa distância, depois acontecia de tudo, minha bola chegava a bater na trave 3 vezes no mesmo chute mas não entrava de forma alguma e as dele vinham sempre certeiras.
José Carlos – Qual seu gol mais bonito e o gol inesquecível?
Marcelo Lages – Foi quando conquistei um dos estaduais de 12 Toques, se não me engano o de 2008. A partida foi contra o Dudu (Vasco). A bola estava na intermediária de ataque e eu chutei com um botão da defesa que estava posicionado próximo a minha grande área defensiva, na trajetória ele passou milimetricamente entre alguns botões adversário, pegou em cheio na bola que depois entrou na gaveta. O jogo estava acabando e eu precisa daquele gol para seguir vivo no mata-mata que me levaria ao título. Foi um gol meio que de desafio. Acredito que acertei devido a estar jogando Disco na época.
José Carlos – E o gol inesquecível?
Marcelo Lages – Foi no Mundial de 2012 pela Seleção Brasileira na semifinal contra a Sérvia (seleção que havia nos eliminado em 2009) na modalidade Sectorball. Foi um gol de extrema dificuldade no último lance do jogo, e que deu a vitória a nossa seleção. A bola estava entre a grande área e a lateral no campo de ataque, com um botão de defesa atrapalhando a trajetória, minha única opção de chute era um botão que estava na lateral do campo de defesa, pois o de ataque não conseguiria tocar a bola sem fazer a falta. Já o de defesa teria que passar tirando um fino do botão adversário e pegar a bola de casquinha para ir cruzada na direção do gol. Sabe aquele chute que você vai tentar cem vezes e vai acertar uma. Então, foi esse! O botão acertou na casquinha da bola que partiu cruzada encobrindo o goleiro e entrando no ângulo oposto. Quando a bola estufou a rede a seleção inteira pulou em cima de mim para comemorar.
José Carlos – Fale um pouco sobre o seu pioneirismo nas regras internacionais.
Marcelo Lages – O primeiro contato que tive com regras internacionais foi em 2009 no Mundial de Sectorball. O Brasil teve 2 anos para se preparar, pois havia disputado o mundial de 2017, todavia, nenhum trabalho tinha sido feito até então, chegamos lá desconhecendo detalhes básicos da regra. Na véspera, um dos atletas da Hungria treinou com a gente e fomos no dia seguinte encarar as feras. Consegui me adaptar bem e de forma surpreendente quando restavam apenas 4 mesas no ginásio e os 8 finalistas eu estava entre eles representando o Brasil. Caí nas quartas de final nos pênaltis, ou seja, estive a uma distância de 3 jogos para o título Mundial e ali percebi que era possível o Brasil fazer um bom papel na modalidade já no próximo mundial. Quando regressamos ao Brasil, fui nomeado pelo José Farah, então presidente da Confederação Brasileira de Futebol de Mesa (CBFM) para ser o responsável pelas Regras Internacionais. Acredito que fizemos um bom trabalho, pois em 2012 o Brasil fez a final com a Hungria (única derrota brasileira no mundial). Nas duplas eu e Igor fomos 3º colocados e no individual nossos atletas mostraram nas mesas uma excelente evolução.
Quanto ao Subbuteo, descobri a modalidade também em 2009, quando no cargo de representante da CBFM para regras internacionais, comecei a aprofundar a pesquisa sobre o Futebol de Mesa fora do Brasil, comecei por Portugal, pois seria mais fácil a comunicação. Fiquei impressionado com a quantidade de países que jogam a modalidade. Aproveitei uma viagem com a família e fui até a Holanda participar do Mundial. Fiquei impressionado com a estrutura, com a quantidade de crianças jogando no Sub 12, Sub 15 e Sub 19, com a categoria feminina, pela fórmula de disputa da competição por equipes, e por fim, por encontrar a ARGENTINA disputando a competição. Lá na Holanda começou a ser rascunhado o primeiro Campeonato Sul-americano que se tornou realidade em 2010.
Quanto ao Chapas, foi um pedido do Chile a sua inclusão no Su-lamericano, é uma modalidade com praticantes em vários países no Mundo, muito forte na Espanha e com praticantes em Portugal. Na América do Sul acredito que a modalidade irá trazer novas nações para o Sul-americano. A Bolívia está muito próxima de participar da próxima edição graças à modalidade.
José Carlos – Outro pioneirismo seu foi a idealização do All Star Games. Conte um pouco dessa história?
Marcelo Lages – O ALL STAR GAMES foi idealizado para ser uma grande festa do Futebol de Mesa do Rio de Janeiro. Em 2015 eu era vice-presidente da FEFUMERJ e levei a proposta para a Diretoria da FEFUMERJ. Ela foi acatada e, desde então, o evento é um sucesso. Eu já disputei competições oficiais em todas as modalidades constantes da FEFUMERJ e não vejo o porquê delas não conviverem de forma pacífica entre si. O evento objetiva colocar todas elas no mesmo espaço, para que ocorra a troca de experiências e para que os atletas de uma modalidade passem a conhecer os atletas e as outras modalidades, ou seja, ter um primeiro contato, observar uma partida de uma modalidade diversa da sua. O objetivo é quebrar qualquer discriminação. o All Star Games ainda pode vir a ser melhorado. Inicialmente era para ser um jogo entre as estrelas de cada modalidade, ou seja, ou melhores de cada, mas isso foi mudando com o passar das edições. Sugiro que sejam criados novos desafios, como por exemplo, premiar o clube que mais filiar atletas novos (atletas que nunca antes foram federados) durante a temporada.
José Carlos – Você agora reside em outro país. Tem algum projeto com o futmesa em Portugal? Faria algo de diferente em relação ao que fez no Brasil?
Marcelo Lages – O Futebol de Mesa em Portugal já existe. Só que a modalidade dominante é o Subbuteo. A semente plantada com o Mundial de 2018 esta dando frutos. Hoje Portugal tem uma estrutura com mesas de 12 Toques e Sectorball devido ao legado do Mundial e estamos estudando uma forma de estruturar as competições e participar da Euro, mas é um trabalho que tem que ser feito com calma, superação e obediência as regras de transferência e empréstimos existentes no Futebol de Mesa. Apesar de residir em Portugal atualmente, mantenho um forte vínculo com a família VASCO DA GAMA. Não me vejo fora do Vasco, mas jogaria um período no Belenenses (pelas amizades) e começaria do zero no FC PORTO (meu time do coração). Quanto a fazer diferente? Creio que algumas coisas sim, pois temos que aprender com os erros cometidos, mas no geral, o objetivo seria levar o clube ao lugar mais alto do pódio, com certeza.
José Carlos – Marcelo Lages. Muito obrigado por aceitar dar essa entrevista para o site da FEFUMERJ.
Fonte: Fefumerj