Campello fala sobre recusa de sócios no Vasco: 'Sabemos a serviço de quem cada um está'
Na efervescente política cruz-maltina, um novo - e complexo - episódio tem ganhado grandes proporções na já corrida para as eleições de 2020. Desde o término do prazo de associação para votar no ano que vem, o presidente Alexandre Campello é alvo de reclamações por decisões que desagradam a diversos lados em relação aos novos sócios.
Aprovações, reprovações, demora... De 1º de julho, quando a diminuição do valor da joia para R$ 750 foi aprovada, até o fim de agosto, quando se encerrou o prazo para que novos sócios votem já em 2020, o Vasco viu o aumento de fichas solicitando a entrada no quadro social do clube.
Todas elas - ou a maioria - passaram ou vão passar pelas mãos de Campello, que aprova ou não os pedidos, sem ter, segundo o artigo 14 do Estatuto Social do Cruz-Maltino, que explicar o motivo de sua decisão.
O que tem sido motivo de polêmica nos bastidores do Vasco é um "detalhe" na ficha de associação: o proponente. Todo torcedor que deseja virar sócio do Cruz-Maltino precisa que um outro sócio assine seu pedido de entrada no quadro, como se fosse um "fiador" de um contrato de aluguel. O primeiro critério para aceitar ou não, segundo Alexandre Campello, é a quantidade de solicitações assinadas pelo mesmo proponente.
- Eu comecei a pensar como avaliar esse ingresso de sócios. Aí, entre outras coisas, como assinatura que não confere, ficha incompleta, ficha com mais de um preenchimento diferente, a gente colocou como linha de corte que aquele proponente que tivesse mais de cinco propostas apresentadas não teria nenhuma aceita - explicou o presidente.
De acordo com levantamento feito pela diretoria, 0,07% da base de sócios ativos foi responsável por 65% das adesões no período de 1º de julho até 31 de agosto. A partir de setembro, houve menos de 30 adesões ao quadro social.
Oposição acusa falta de transparência
Em contrapartida, a oposição do Vasco tem reclamações claras. As chapas que participam da corrida eleitoral de 2020 alegam falta de transparência na recusa de novos sócios e reclamam pela demora para uma decisão. Nas redes sociais, associados admitem terem feito plantão em São Januário em busca de novos sócios, o que, segundo eles, não configura algo ilegal.
Para Campello, porém, a prática pode ser vista como "mensalão". O presidente cita o fato de a última eleição do Vasco ter terminado na Justiça. A briga foi até a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que decidiu, por unanimidade, manter o resultado da eleição do Cruz-Maltino de 2017, vencida pelo atual presidente.
- Obviamente, sabemos a serviço de quem cada um está. Mas não vamos declarar. Estranhamente, muitos daqueles que lá atrás eram contra o mensalão, brigaram contra o mensalão, foram à Justiça, hoje estão minimamente contra quem está tentando evitar o mensalão - alegou Campello.
- Eu não mudei. Por que eles mudaram? O que eles combatiam agora é permitido. Por que os 'princípios' de alguns são tão elásticos? O que todos os grupos estão fazendo são exatamente as mesmas práticas que eram combatidas em 2017 e em eleições anteriores - completou.
Antes disso, em 2013, o "mensalão", como cita Alexandre Campello, já tinha virado assunto em São Januário por causa da denúncia de pagamento de mensalidades por terceiros em troca de votos na futura eleição presidência. Naquela ocasião, 1.730 pessoas se associaram num só dia. Durante todo o mês de abril, foram 3.026 novos pedidos de associação.
- Tem um outro dado também muito importante: até aqui se vê mais reclamação de quem propôs do que de quem tentou se associar. Isso causa muita estranheza para a direção. Um ou outro dos que foram recusados estão reclamando, mas quem propôs está fazendo movimento político, chamando conselho deliberativo e tudo mais. Essas pessoas estão em defesa do clube? Será? - questionou Campello.
As reclamações
O principal motivo de reclamação da oposição é a falta de explicações para a reprovação das propostas e a demora na análise das fichas, já que os propostos (torcedores que pedem associação) pagaram a joia (R$ 750), meses de mensalidade e alegam não ter tido resposta. Em comunicado, o clube tem informado a quem não é aprovado:
"Viemos através deste informá-lo que sua proposta de sócio-geral do Club de Regatas Vasco da Gama, infelizmente, foi indeferida. Referente à justificativa da recusa, segue trecho do artigo 14 do estatuto: 'As importâncias de que trata o presente artigo ficarão em depósito e serão devolvidas, desde que não seja aceita a proposta. A diretoria não é obrigada a dar os motivos da recusa'. Em breve, entraremos em contato para mais informações quanto à devolução do valor despendido no ato da proposta"
Outro ponto levantado pelos críticos da postura da diretoria diz respeito a fevereiro de 2018. Aquele foi o último mês antes de a taxa de adesão do sócio geral subir para R$ 2,5 mil - em agosto daquele, Campello proporia a redução da joia, o que só foi ratificado em junho de 2019 . Nos últimos três dias de fevereiro, 73 pessoas se tornaram sócios proprietários, sem maiores dificuldades.
Leonardo Tupinambá, membro do grupo Confraria, foi um deles. Ele mora em Manaus e relatou que todo o processo foi bastante simples, levando apenas alguns dias para ser confirmado. Na ocasião, sequer precisou indicar um proponente.
- No dia 28 eu liguei pra secretaria, recebi a ficha no email, preenchi, digitalizei, encaminhei para lá, fiz o deposito, encaminhei o comprovante. No dia 2 de março já estava tudo habilitado para mim, entrei no sistema, mandei meus documentos, meus comprovantes, sem dificuldade alguma. Nunca precisou (de proponente). Na época do Dinamite, quando ele lançou o sócio geral, eu também virei. Ele assinava como se fosse proponente, ou então o vice-presidente de comunicação. Não era preciso ter proponente."
O GloboEsporte.com conversou com outras duas pessoas que tentaram entrar como sócio, mas foram recusados por Campello. O processo foi o mesmo: pagaram as mensalidades, a joia, mas foram indeferidos. Veja os depoimentos:
Lucas Ataíde
De Salvador
Foi recusado semana passada.
"Moro na Bahia e no Final de julho resolvi me associar ao Vasco para ter direito de voto. Naquela ocasião, peguei o contato de um sócio que também mora em Salvador, pra ele tentar me ajudar a associar, já que teria que ter um sócio do Rio de Janeiro pra ser meu proponente. Ele me indicou um homem chamado Henrique. Somente isso.
Mandei toda documentação e assim recebi um comunicado de bem vindo ao sociogigante. Deveria cadastrar um cartão de credito e realizar os pagamentos da joia e das mensalidades. Dividi a joia em 5x e iniciei o pagamento das mensalidades.
Nisso, meu cadastro aparecia sempre "em análise" ou em branco. Daí paguei duas joias e duas mensalidades.
Semana retrasada recebi um e-mail dando a negativa de minha associação e assim ficou bloqueado o pagamento da parcela da joia de outubro. Ontem, do nada... voltou a liberar para pagar essa parcela da joia novamente."
Rafael Louzada
Do Rio de Janeiro
"Fiz a inscrição no início de julho. Não sabia originalmente se precisava de um proponente. Um amigo meu se ofereceu porque precisava ir na secretaria resolver um problema. Chegando lá, ele não conseguiu regularizar a situação e não pôde ser meu proponente.
Havia um sócio sentado dentro da secretaria. Eu expliquei a situação, e ele se ofereceu para ser proponente. Eu não peguei o nome dele, não achei que isso seria uma questão. Ele não perguntou nada sobre mim. Se ele estava ali com essa intenção, não estava fazendo filtro algum.
Paguei a joia de forma parcelada e comecei a pagar a mensalidade. O tempo foi passando, e nada acontecia. Liguei para a secretaria, e falaram que a liberação ocorreria na mesma semana. Meu status acabou ficando em branco na página. Voltou como pendente, e depois em branco de novo. E, aí, chegou o e-mail recusando.
Eu já fui a apresentações do Julio Brant para conhecer. Na eleição passada, postava coisas no Facebook sobre isso. Cheguei a botar a imagem da Sempre Vasco como capa do meu perfil.
Estou esperando para ver se algum grupo vai organizar (ação na Justiça). No momento em que tiver, a minha intenção é estar dentro.
Isso está muito arbitrário. Incomoda muito o clube estar num momento em que precisa de ajuda, com tanta dificuldade financeira, e recusar dinheiro."
Futuros candidatos
O GloboEsporte.com também procurou conselheiros do Vasco que estão na corrida eleitoral pela presidência no próximo triênio. Julio Brant diz ter assinado duas fichas e que apenas uma, por enquanto, teria sido aceita. Fred Lopes não comentou quantas assinou, mas sabe que, até agora, nenhuma foi aprovada. Leven Siano alega ter assinado uma, aprovada pela diretoria.
Luis Manuel Fernandes, que está considerando a possibilidade de disputar a presidência, indicou seus dois filhos como sócios proprietários, e ambos foram aceitos. Ele afirmou que foi proponente de cerca de 12 sócios gerais, e dois foram recusados, com o restante ainda em análise.
Questionado pela reportagem, o Vasco informou que os propostos de Julio Brant e Leven Siano, três de cada, foram aceitos.
Em espera
A demora na aprovação de novos sócios afetou até Mauro Galvão, capitão do título do Vasco na Libertadores de 1998 - a informação foi revelada pelo Uol e confirmada pelo GloboEsporte.com. O ídolo cruz-maltino, apoiador declarado de Leven Siano, entrou com o pedido para se associar há cerca de três meses e até a publicação desta reportagem ainda não havia recebido uma resposta.
Sorato, autor do gol do título brasileiro de 1989, também aguarda uma resposta da diretoria a respeito do seu pedido para se associar, feito no meio deste ano.
Muitos outros propostos ainda aguardam a resposta. Eles relatam também uma preocupação: no sistema do Vasco, há quatro status para o sócio: ativo, suspenso administrativamente, proposta em análise e em branco.
Nesta última, há relatos de sócios que foram recusados, mas ainda assim aparecem com a possibilidade de pagar suas mensalidades. Outros ainda não receberam qualquer comunicação e também têm aberta a chance de continuar pagando as mensalidades.
No Conselho
Enquanto a diretoria alega estar analisando fichas de possíveis novos sócios do Vasco, conselheiros se movimentam para pedir uma reunião no Conselho Deliberativo para que Alexandre Campello dê maiores explicações sobre a reprovação dos pedidos. A Sempre Vasco, encabeçada por Julio Brant, iniciou o movimento e teve apoio de integrantes da "Avante, Gigante", do benemérito Fred Lopes.
Fonte: GloboEsporte.com