Na mira do Superior Tribunal de Justiça Desportiva por conta de gritos homofóbicos de sua torcida na vitória sobre o São Paulo por 2 a 0, o Vasco tem idealizado ações de combate à homofobia. Com um histórico de defesa às minorias em seus primórdios, principalmente os negros e operários, o Cruz-maltino tem pela frente hoje, às 11h, em São Januário, o Bahia, clube que atualmente se tornou ícone no engajamento de causas sociais e que, em algumas delas, lutou lado a lado com o adversário carioca.
Ao longo da semana passada, o Vasco divulgou vídeos em que rechaçava qualquer tipo de ato de preconceito. O clube também entrou com uma faixa na partida diante do Cruzeiro em que recriminava atitudes homofóbicas. Ela deverá ser novamente utilizada diante do Bahia.
Ainda para o duelo com os baianos, uma organizada vascaína chegou a sugerir à diretoria ações na arquibancada com o tema, mas o projeto não evoluiu a tempo e os torcedores se mobilizam para conseguir realizá-lo no jogo seguinte que acontecerá em São Januário, dia 22 de setembro, contra o Athletico-PR.
Nas redes sociais, os vascaínos também têm levantado discussões para que alterem algumas letras de músicas ofensivas e de teor preconceituoso contra rivais.
Vasco mencionou tema antes de episódio
O Vasco já havia levantado a bandeira do combate à homofobia antes mesmo do episódio diante do São Paulo. Em junho, o clube postou em suas redes sociais uma imagem comemorativa ao Dia Mundial do Orgulho LGBTI+ e a frase: "viva e deixe viver":
STJD analisa denúncia
Após receber do Vasco explicações sobre o episódio ocorrido na partida contra o São Paulo, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva analisa se oferece ou não uma denúncia contra o Cruz-maltino. Pelo novo regulamento da CBF, os clubes podem até sofrer com a perda de pontos em casos de homofobia, embora segundo os especialistas, este não deva ser o caso do time de São Januário, que cumpriu alguns dos protocolos imediatamente após a arbitragem interromper a partida.
O departamento jurídico vascaíno enfatizou estas ações em sua defesa, principalmente os alertas no placar eletrônico e no sistema de som, além de um pedido da comissão técnica e dos jogadores para que os gritos parassem.
O STJD ainda não se manifestou quando tomará uma decisão sobre o caso.
Bahia e Vasco se manifestaram em data de golpe de 64
Ao lado do Corinthians, Bahia e Vasco se manifestaram este ano na data de aniversário de um momento histórico e polêmico do Brasil: o Golpe de 64.
No dia em que se completavam 55 anos, o Cruz-maltino postou um vídeo com a música "O Bêbado e o Equilibrista", de João Bosco e do vascaíno Aldir Blanc, acompanhado da frase: "Que as lindas linhas do que escreveu o poeta vascaíno Aldir Blanc não sejam mais urgentes, mas só lembranças que nos recordem que a democracia deve ser sempre a nossa verdade e nunca mais uma esperança":
Já o Bahia remeteu à sua história e, também acompanhado de um vídeo, postou como legenda: Na alegria ou na tristeza. Na saúde ou na doença. De Democracia a gente entende. Hoje e sempre: #NuncaMais":
Bahia se torna ícone
Também enraizado como um clube do povo, o Bahia tem se tornado um ícone quando o assunto são causas sociais. Somente em 2019, o Tricolor mergulhou em ações dignas de aplausos e que ganharam destaque na mídia nacional e internacional. Confira alguns:
Abandono paterno
Às vésperas do Dia dos Pais, o Bahia lançou vídeo no qual um torcedor mirim escreve cartas ao pai contando detalhes sobre sua infância em recortes relacionados ao Bahia e ao próprio futebol. Nos textos, o garoto enfatiza a figura "de mãinha". E a história ganha desfecho quando é revelado que as cartas jamais saem rumo ao destinatário: o pequeno torcedor não tem pai registrado.
"5,5 milhões de crianças no Brasil não possuem o nome do pai no registro", alertou o Bahia.
Assédio contra mulheres
No Carnaval, o Bahia, em parceria com o governo do estado, publicou vídeo associando o assédio contra as mulheres nos blocos e micaretas a entradas faltosas violentas no futebol. "Assédio é falta grave nesse Carnaval", "Não é não!" e "Respeita as minas" foram algumas das frases lançadas pela campanha na ocasião.
Pouco mais de um mês depois, o Bahia foi procurado por uma agência de publicidade para criar um site no qual seria possível as torcedoras relatarem casos de assédio pelos quais tenham passado nos estádios. Também houve distribuição de material impresso e virtual para os torcedores visando a conscientização no combate à violência contra a mulher.
Intolerância religiosa
No Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, o Bahia anualmente se posiciona contra a discriminação. Um dos estados mais miscigenados do Brasil, a Bahia tem enaltecidas pelo clube tricolor as mais variadas crenças e até "a crença de não crer". O volante Feijão, adepto do candomblé, jogava na equipe em 2017 e sofreu com preconceito na época, sendo vítima de comentários discriminatórios nas redes sociais.
"Bahia de todos os santos, de todos os orixás, de um único Deus, de todas as crenças - ou de nenhuma. Bahia de todos e de todas", reforça o clube em seus perfis oficiais.
Homofobia
Um dos pioneiros entre clubes de futebol do Brasil a se posicionar nos últimos anos contra a homofobia, o Bahia aproveitou o último mês de maio para reafirmar seu lado na luta contra a discriminação: "O Dia Internacional de Combate à #LGBTfobia marca a extinção do termo 'distúrbios de sexualidade' como doença na OMS", escreveu a agremiação.
Uma camisa com a frase "Não há impedimento" acompanhada de faixa com as cores do movimento LGBT foi lançada pelo clube na ocasião, colocada à venda em modelos masculino e feminino. Foi a primeira peça do que hoje já se tornou uma coleção de camisas com estampas de ações afirmativas.
Lentidão da demarcação de terras indígenas
Na semana do Dia do Índio, o Bahia cobrou das autoridades urgência na demarcação de terras indígenas. Por meio de um vídeo no qual compara a luta dos índios pela sobrevivência a uma partida de futebol, foi mostrado que não há jogo sem a demarcação — seja das linhas de cal, seja dos limites geográficos que dificultariam o avanço de fazendeiros e os consequentes conflitos de terras que penalizam a população indígena do Brasil há séculos.
"Nossa partida é a nossa luta. Nossas vidas estão em disputa. É preciso cumprir a regra. Sem demarcação, não tem jogo", se posicionou o Bahia, seguindo com a hashtag #DemarcaçãoJá.
Movimento contra assédio às mulheres
Antes de toda a polêmica, o Vasco e seus torcedores já haviam abraçado algumas causas. A mais notória se iniciou há mais de um ano através de um grupo de cruz-maltinas que criaram o movimento "Vascaínas contra o Assédio", que visa combater e alertar sobre o assédio às mulheres em São Januário e em outros estádios do Brasil. Ao longo de 2019, o grupo promoveu alguns debates no clube com o apoio do Vasco e, nos dias dos jogos, costuma panfletar no entorno com conteúdos de conscientização aos torcedores.
O movimento tem a chancela da 2ª vice-presidente geral do Vasco, Sônia Andrade, que participou de algumas das reuniões.
"Tenho visto o quanto é importante fortalecer o papel da mulher no esporte, mostrando que podemos, sim, ocupar os mais diversos cargos. O meu maior desejo é deixar um legado e esta reunião faz parte disso. Fizemos uma no mês passado e a troca de experiências foi fantástica. A ideia é que esse movimento se fortaleça cada vez mais", disse Sônia ao site oficial do Vasco após uma das reuniões que aconteceu ano passado.
Vasco abraça causas contra o racismo
Após defender negros e operários no futebol em seus primórdios, o Vasco levantou a bandeira de causas sociais em algumas ocasiões ao longo do tempo. Em 2012, por exemplo, o clube saiu em defesa do zagueiro Dedé, hoje no Cruzeiro, que havia sofrido um preconceito racial contra o Libertad, do Paraguai, em jogo pela Copa Libertadores.
Na partida de volta, no Rio de Janeiro, uma campanha foi feita para que os torcedores pintassem seus rostos de preto e branco e vestissem camisas cruz-maltinas pretas, algo que foi abraçado pela torcida.
Um ano antes, o clube lançou um modelo de camisa que remetia ao passado e que tinha como detalhe uma mão espalmada e a frase "respeito e igualdade".
Já em 2017, após vencer o River Plate no torneio de verão Florida Cup, um torcedor do time argentino proferiu ofensas ao perfil do Vasco, e o clube rebateu enaltecendo sua história:
Copo de combate ao racismo
Na partida de hoje contra o Bahia, os torcedores do Vasco poderão comprar um copo alusivo ao combate à discriminação racial. Ele contém o desenho de uma mão negra e as palavras "respeito" e "igualdade". A lembrança poderá ser adquirida ao preço de R$ 12 nos bares e ambulantes de São Januário:
Veja abaixo outras causas abraçadas pelo clube:
Fonte: UOL