A volta arrasadora do Dinamite
Vasco 5x2 Corinthians (Campeonato Brasileiro 1980)
Compilado da edição extra de Placar de 1983 sobre o Vasco e da edição nº 1085 de Placar "Meu jogo inesquecível", de julho de 1993, e do livro Um ídolo chamado Roberto Dinamite, de Paulo César O. Pinto.
Márcio Braga, o ex-presidente do Flamengo, quase juntou no ataque rubronegro os dois maiores artilheiros da época: Zico e Roberto Dinamite. Vendo que Roberto não se adaptava ao Barcelona, para o qual fora vendido havia menos de três meses, Márcio Braga decidiu contratá-lo. Mas a diretoria do Vasco, ao sentir o escândalo que a torcida estava fazendo, antecipou-se ao clube rival e trouxe seu artilheiro de volta.
O Vasco do técnico Orlando Fantoni não estava bem no Campeonato Brasileiro de 1980. Jogava na base do esforço e do talento pessoais de Guina, Dudu e Carlos Alberto Pintinho. Que falta fazia um líder! Roberto retornava para preencher essa função e para mostrar, a quem não acreditava nele, que podia ser o mesmo artilheiro de sempre e o quanto tinha sido injustiçado na Espanha, em meio às crises do Barcelona e perseguições por parte do técnico Helenio Herrera.
A reestreia foi em Recife, contra o Náutico, em 24 de abril. Roberto teve atuação apagada mas o Vasco venceu por 1 a 0, gol de Guina.
O reencontro do artilheiro com a torcida seria no dia 4 de maio, no Maracanã, contra a forte equipe do Corinthians. Mas a torcida do Vasco não estaria sozinha para recepcionar o ídolo. Estava programada uma rodada dupla, e na preliminar jogariam Flamengo e Bangu. Por isso, rubronegros e corintianos se uniram nas arquibancadas. O público pagante chegou a 107.474 (Ingresso: JPEG, 25k).
A Fla-Fiel - assim dizia uma faixa na arquibancada do lado esquerdo das cabines de rádio - vibrou inicialmente com a vitória do Flamengo por 3 a 0, três gols de Tita, que jogou com a camisa 10 em substituição a Zico, contundido.
Entusiasmados com a vitória, os rubronegros fizeram festa com a entrada do Corinthians em campo, com seu tradicional uniforme, e vaiaram a entrada do Vasco, com camisas pretas e calções e meias brancas. O Vasco formava com Mazaropi; Paulinho Pereira, Juan, Léo e Paulo César; Carlos Alberto Pintinho, Guina e Dudu; Catinha, Roberto e Wilsinho. O Corinthians, dirigido por Jorge Vieira, formava com Jairo, Zé Maria, Mauro, Amaral e Wladimir; Caçapava, Basílio e Sócrates; Píter, Geraldão e Wilsinho. Durante a partida, Ivan e João Luís substituíram a Juan e Wilsinho pelo Vasco, e Djalma e Toninho substituíram a Caçapava e Geraldão pelo Corinthians.
Para delírio da Fla-Fiel, o Corinthians abriu a contagem aos 11 minutos com uma bomba de Caçapava de fora da área. Parecia que ia ganhar tranquilamente. Mas a alegria deles durou pouco. Apenas dois minutos depois, Dudu faz o passe para Roberto, Basílio corta mas Roberto recupera a bola e bate firme, da marca do pênalti. Era o empate e o início da reaproximação de Roberto com a torcida. Só que poucos no estádio podiam imaginar que ele continuaria fazendo gols. Roberto, em depoimento a Placar, disse que "era marcar e vibrar. Foi uma sensação fantástica. É muito difícil de descrever". Os vascaínos também estavam tendo uma sensação fantástica que aumentava a cada gol de Roberto, além de divertir-se com a multiplicação dos claros no lado oposto das arquibancadas.
Os gols foram se sucedendo com uma naturalidade surpreendente, sem que fossem cometidas grandes falhas pela defesa corintiana. Aos 27 minutos, Roberto foi avançando e, sem ninguém para tabelar, arriscou o chute de longe. A bola saiu forte, quicou na risca da pequena área e encobriu a Jairo, que mergulhava para a defesa no canto esquerdo: 2 a 1. Dez minutos depois, Guina faz um lançamento rasteiro e em profundidade para Roberto, que ultrapassa o zagueiro Amaral na corrida e chuta a meia altura, sem defesa (JPEG, 21k): 3 a 1. Tudo isso ia acontecendo no gol à direita das cabines de rádio, lado do reduto habitual da torcida do Vasco na arquibancada do Maracanã. Era felicidade demais. Mas ainda estava faltando. Embalado pela torcida, o Vasco encurralava o Corinthians. Dudu chuta de fora da area, Jairo rebate, Roberto vem com tudo e emenda, estufando a rede: é o quarto, aos 39 minutos. Roberto corre por trás do gol, comemorando com o punho direito erguido, e a galera enlouquece. Os vascaínos nem se importam quando o árbitro Carlos Rosa Martins marca um pênalti aos 42 minutos e Sócrates diminui para 4 a 2.
Os times vão para o vestiário e a torcida rubronegra vai mais cedo para casa, abandonando por completo a coligação com os membros da fiel torcida corintiana, que ainda insistia em permanecer no estádio. Nessa altura, não havia quem não esperasse que a goleada aumentasse na etapa complementar, provavelmente com mais gols de Roberto. O segundo tempo começou em banho-maria, mas a torcida cantava "mais um" e vibrava cada vez que Roberto tocava na bola. Roberto dinamita de fora da área e Jairo manda a corner, espetacularmente. Será que a fonte secou? Nada disso. Aos 27 minutos, quase do mesmo lugar, outra bomba pelo alto, e dessa vez nem Jairo nem goleiro nenhum alcançaria: é o quinto do Vasco e o quinto e mais bonito de Roberto.
Jogo encerrado, Roberto foi até as gerais do Maracanã e, emocionado, jogou a camisa 10 para os torcedores. A torcida que lotou a metade das arquibancadas lá permanecia, de pé, ainda não acreditando no que acabara de presenciar, já rouca de tanto gritar o nome do ídolo.
Naquele dia ficou provado que Roberto tinha nascido para o Vasco e de lá nunca deveria ter saído.