HISTÓRIA DAS COPAS I


A Copa do Mundo de 1958 - Suécia

Vinte e oito anos depois da primeira Copa do Mundo em 1930 no Uruguai, o Brasil justicava em campos da Suécia todo o otimismo que esbanjara em quase tres décadas quanto à sua condição divina de país do futebol. Ao contrário das duas copas anteriores em 1950 e 1954, onde desde o seu início havia uma seleçao considerada favorita (Brasil em 1950 e Hungria em 1954), a Copa do Mundo da Suécia não apresentara um favorito antecipado à competição. Somente após a terceira rodada, quando Brasil e União Soviética defrontaram-se na cidade de Gotemburgo, despontaria aos olhos do mundo um dos melhores times de futebol da história do esporte, o qual tambem veria surgir dois fenomenos do futebol: Pelé e Garrincha.


A Fase Eliminatória

Na Copa da Suíca em 1954, a seleção brasileira sob o comando do técnico Zezé Moreira não ultrapassara as quartas-de-final ao ser derrotada pelo forte time da Hungria por 4 a 2 (naquela que ficou conhecida como a Batalha de Berna onde a briga entre jogadores brasileiros e hungaros havia sido iniciada, segundo o jornal italiano Corriere della Sera, pelo hungaro Puskas). O pessimismo em relação à incapacidade do Brasil vencer uma copa aumentava. Em 1956, o escrete nacional, novamente sob o comando do técnico Flavio Costa, faria uma excursão preparatória à Europa de onde voltaria com tres vitórias (1 x 0 sobre Portugal, 3 x 2 sobre a Áustria e 1 x 0 sobre a Turquia), dois empates (1 x 1 com a Suíca e 0 x 0 com a Tchecolosváquia) e duas derrotas ( 0 x 3 frente a Itália e 2 x 4 frente a Inglaterra). Nos meios da Confederação Brasileira de Desporto (CBD) crescia a certeza que, após as derrotas de 50 e 54, medidas concretas eram necessárias para se alterar tal cenário futebolístico, embora nenhum plano de trabalho tivesse sido proposto após aquela excursão preparatória.

Somente em maio de 1957, um empresário paulista, homem de visão pragmática e progressista, iria encampar a execução de um plano de trabalho sério e destituído da improvisação que marcara os selecionados nacionais passados. Seria ele Paulo Machado de Carvalho que, auxiliados por Vicente Feola, Flavio Iazetti, Paulo Buarque e Art Silva, apresenta à CBD em meados de 1957 as linhas gerais de seu plano. Em 14 de janeiro de 1958 toma posse na presidencia da CBD João Havelange, que ao contrário de seu antecessor Silvio Pacheco, notabiliza-se por impor diversas transformações aaquela entidade de futebol e, em particular, faz aprovar o Plano Paulo Machado de Carvalho, nomeando uma comissão técnica inicialmente composta por Carlos Nascimento, Vicente Feola e José de Almeida. Estaria assim dado o primeiro passo para a conquista do campeonato mundial na Suécia.

A fase eliminatória resumiu-se à disputa da vaga entre o Brasil e o Peru, já que a equipe da Venezuela cancelara sua participação. Em Lima, a equipe brasileira arrancaria um empate de 1 x 1 com a seleção peruana, com gols de Terry para o Peru e Í ndio para o Brasil. Nosso escrete canarinho somente asseguraria a vaga à fase final na Suécia após o jogo no Maracanã, onde Didi, através de mais uma de suas notáveis folhas secas cobraria com perfeição uma falta na entrada da á rea peruana e assinalaria o tento da vitória de 1 x 0 sobre o Peru.

Apesar da organização e planejamento imposto à seleção e comissionado técnico pelo Plano Paulo Machado de Carvalho, os preparativos que precediam o embarque à Sucéia sofreriam ainda da falta de seriedade cronica dos órgaos esportivos brasileiros. Como de costume, nao faltaram surpresas durante a convocação de atletas, acusações de favorecimento pelo técnico Feola, jogadores barrados por motivos obscuros e fatos similares. O próprio Didi esteve sob sréio risco de ser barrado pelo auxiliar Moacir (Flamengo) sob a acusação de não estar se esforcando nos treinamentos. Tornou-se então famosa a frase de Didi, que em desabafo à Manchete Esportiva de 2 de Maio de 1958 diria: Treino é treino, jogo é jogo. A imprensa esportiva do Brasil, como já era tradição, também tratava de minar as bases do Plano Carvalho. O jornalista Mário Filho comentaria em artigo do Jornal dos Sports que através do Plano Carvalho o Brasil pouco faria em um torneio internacional, muito menos em uma copa do mundo.

Entretanto, apesar dos eternos críticos e pessimistas que sempre rondaram o nosso escrete nacional, a organização do selecionado brasileiro prosseguia sob comando da comissão técnica e do proprio Paulo Machado de Carvalho, que após a copa seria consagrado como o Marechal da Vitória. Pela primeira vez na história das copas do Brasil, a CBD faria integrar ao selecionado um psicólogo, que ao lado de um médico e odontlóogo trabalhariam intensamente a saúde física e mental de nossos atletas. Finalmente, às 5 da tarde do dia 24 de maio de 1958 a seleção brasileira embarcaria nas asas da Panair, rumo à Itália, onde faria dois amistosos antes de seguir para a Suécia.

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O Escrete de Ouro na Europa

Em 29 de maio, o Brasil realiza o primeiro amistoso em solo europeu contra a equipe da Fiorentina e em 1o de junho outro amistoso contra a Inter de Milão. O técnico Feola definiria a equipe final a partir do desempenho da seleção durante os amistosos na Itália mas, apesar da vitória fácil por 4 x 0 em ambos os jogos, fatos novos iriam adiar a formação do escrete campeão. Após o jogo frente a Fiorentina, Carlos Nascimento e Feola decidem por barrar Garrincha, substituindo-o por Joel do Flamengo, por considerarem que ele abusara dos dribles naquele jogo. Notório foi o lance em que o nosso Mané, após driblar até o goleiro italiano, preferiu esperar a chegada de um zagueiro para, após um novo drible, chutar ao gol vazio. Embora a torcida local tivesse aplaudido de pé o lance de Garrincha, Feola e Nascimento o encararam como um lance totalmente desnecessário e irresponsável, inadmissível em uma Copa do Mundo.

E foi sem Pelé e Garrincha que a seleção brasileira estrearia na Copa da Suécia em 8 de julho de 1958 contra a Áustria. A formação 4-2-4 de Feola iniciaria a copa com Gilmar, De Sordi, Bellini, Orlando e Nilton Santos, Didi e Dino, Joel, Mazzola, Dida e Zagalo. Sob os olhos de 21000 espectadores, o selecionado canarinho venceria a Áustria por 3 a 0, gols de Mazzola no 1o. tempo e Nilton Santos e Mazzola no 2o. tempo. Para a segunda partida contra a Inglaterra, a substituição de Dida por Vavá no ataque nao impediria um melancólico 0 x 0 perante a 40000 pessoas. Apesar de uma excelente oportunidade perdida por Mazzola e uma bola na trave de Vavá, a seleção brasileira ainda nao havia encontrado a sua vocação de campeã. Faltava-lhe o dinamismo e a habilidade de dois jogadores que permaneciam sentados no banco de reservas.

O terceiro jogo contra a União Soviética era de vital importancia à classficação do grupo. A Inglaterra jogava contra uma seleção austríaca ainda sem vitórias e uma simples vitória inglesa desqualificaria o perdedor do confronto Brasil e URSS. A equipe brasileira, entretanto, entrara em campo decidida a conquistar o campeonato. Para tanto, Feola, pressionado por Nilton Santos, Didi e Bellini, escalaria o time com a presenca de Pelé, Zito e Garrincha. O que se viu então a partir do início da partida dado pelo árbitro frances Guigue foi o nascimento de uma seleção favorita à conquista do torneio. Com a entrada de Pelé e Garrincha juntos a Vavá, o ataque brasileiro ganhou um dinamismo surpreendente e prefeitamente harmonizado com a maestria do seu meio de campo, onde Didi e Zito comandavam as acões. Apesar da vitória de 2 x 0, gols assinalados por Vavá no 1o. e 2o. tempo, o Brasil apresentara um exuberante futebol. A maioria da imprensa européia não media elogios à superioridade, técnica e beleza do futebol da equipe brasileira. Garrincha passaria a ser tratado pela imprensa como o semeador de terror nas defesas adversárias com seus dribles rápidos e desconcertantes.

Com a vitória sobre a URSS, o Brasil chegara às quartas-de-final para enfrentar no dia 19 de junho na cidade de Gotemburgo a equipe do Pais de Gales. A forte retranca galesa havia conseguido parar o ataque brasileiro por quase 75 min, quando Pelé faz o tento solitário da vitória de 1 x 0. Apesar de não ter sido nenhum gol clássico, o próprio Pelé viria a contar anos depois que aquele gol talvez tivesse sido um dos mais importantes de sua carreira, pois deu-lhe a confianca necessária para firmar-se como titular da seleção.

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A Reta Final: Brasil Campeão

O jogo semifinal em 24 de junho na cidade de Estocolmo viria ser contra a seleção da Franca, a qual terminaria a copa com o melhor ataque da competição e teria tambem o artilheiro da Copa: Just Fontaine com 13 gols. Logo aos 2 minutos, Vavá abre o marcador mas Fontaine empata aos 9 min , nesta que seria a primeira vez que o goleiro Gilmar seria vencido na competição. Didi desconta novamente para o Brasil com o primeiro tempo encerrando com a vitória parcial de 2 a 1 sobre a Franca. No segundo tempo, com tres gols de Pelé e um de Piantoni para a Franca o Brasil finalmente consolida a chance de se tornar campeão mundial. Apesar da discutivel arbitragem do gaules Griffiths, quando os jornais brasileiros estamparam: Mesmo roubados, vencemos de goleda: 5 x 2 , o selecionado brasileiro estaria agora a um passo do título máximo.

Finalmente, no domingo de 29 de junho de 1958, as equipes do Brasil e Suécia entram em campo para a decisão da copa do mundo. Na véspera do jogo havia chovido muito sobre a capital sueca, o que causara certa apreensão aos brasileiros mais acostumados ao toque de bola e jogo elegante. Apesar do gramado ter sido colocado em estado satisfatório antes da partida, os suecos ja' contavam com o campo mais pesado como forma de neutralizar as jogadas dos brasileiros. O estado do gramado, entretanto, não impediu que o próprio rei Gustavo da Suécia entrasse em campo e cumprimentasse cada um dos jogadores.

A bola é posta no centro do gramado e o árbitro frances Guigue autoriza o início da partida. A Suécia emprega um sistema 4-3-3 enquanto o Brasil perfila o seu 4-2-4 de ouro: Gilmar, Djalma Santos, Bellini, Orlando e Nilton Santos, Zito e Didi, Garrincha, Pelé, Vavá e Zagalo. Eram decorridos somente 5 min de jogo quando a Suécia abre o marcador para o delírio da torcida presente. As previsões de muitos jornalistas europeus quanto ao Brasil não saber vencer jogos finais pareciam estar se concretizando. Entretanto, nossos craques não se deixaram abater pelo súbito gol sueco. Apos nova saída de bola dada por Didi, o Brasil iria rapidamente construir o domínio da partida at é que aos 9 min é Garrincha que passa como um raio por dois defensores adversários e cruza rasteiro para Vavá tocar e empatar a partida. Novamente aos 32 min de partida, como numa reprise do lance anterior, Garrincha dribla a defesa sueca e cruza rasteiro para Vavá tocar e ampliar o marcador para 2 x 1. O Brasil mostrava que queria ser o campeão do torneio. A Suécia volta ao ataque e tenta equalizar o marcador através de seus dois ponteiros, o ponto forte de sua equipe. A defesa brasileira, entretanto, fora bem armada por Feola e não permitia espacos ao adversário, principalmente aos pontas suecos que foram totalmente anulados por Djalma Santos e Nilton Santos, enquanto Bellini e Orlando impediam as movimentações suecas na entrada da área brasileira.

Já logo no início do segundo tempo, o Brasil volta a pressionar os suecos e liquidar definitivamente a partida. Aos dez minutos, Pelé recebe a bola dentro da área, livra-se da marcação de dois zagueiros suecos com um lindo lencol e chuta para dentro do gol adversário, naquele que seria o gol mais bonito da partida e talvez da própria copa. A esmorecida equipe sueca j á quase nada pode fazer para conter a nossa seleção canarinho e aos 32 min, Zagalo, em um lance de raca e personalidade, faz 4 x 1 para o Brasil. Quase ao final da partida, a Suécia ainda faz o seu segundo gol, o qual pouco é comemorado pela torcida local, já consciente de que nada mais há a fazer diante da superioridade brasileira. E finalmente, a menos de 30 segundos para o apito final, Pelé escora de cabeca um cruzamento da esquerda fazendo 5 x 2. O Brasil era finalmente campeão do mundo!

O mundo curvara-se naquele momento a uma das melhores seleções que já havia se visto jogar até entao. Pedro Escartin, famoso escritor esportivo espanhol, homenageia aquele time em seu livro Suecia: Apoteosis de Brasil ao se referir ao futebol brasileiro como algo novo e maravilhoso, onde não faltam arte, eficiencia e conjunto. Pelé havia sido eleito a revelação daquele torneio e recebido uma medalha ofertada pela delegação russa. A genialidade daquele garoto de 17 anos assombrara a tantos que o proprio Raymond Kopa da seleção francesa viria dizer aos jornalistas internacionais: Pelé vai fazer com que os brasileiros esquecam outros í dolos, pois vai superar a todos eles..... O rei sueco Gustavo Adolfo, que antes da partida havia cumprimentado a todos os jogadores, voltara ao gramado novamente para felicitar os campeoes do mundo. Em campo, fora recebido de forma nada protocolar pelo dentista da selecao que lhe deu um tapinha nas costas. Garrincha foi mais natural ainda, pois ao ser cumprimentado por Sua Majestade, Maneé responderia: Ol á meu chapa! Tudo bem?.

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Delegação Brasileira na Copa de 1958

Comissão Técnica

Jogadores

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Referências


Sugestões

Documento em construção. Versão atualizada em 16/Jan/95
Sugestões e correções são apreciadas.

Claudio Ruggieri
Email: ruggieri@cern.ce.uiuc.edu