Não é apenas no time do Vasco que Carlos Alberto se encaixou a ponto de virar referência. Ele se incorporou à vida de um clube que passou a viver intensamente. Numa tarde, mergulho no universo de São Januário. Na Escola Vasco da Gama, encontrou candidatos a futuros jogadores, ou apenas crianças aprendendo a conviver e a ser Vasco. Na sala de troféus, espantou-se com o tamanho da história de um gigante clube do futebol brasileiro. Percorrendo do passado ao futuro, percebeu a responsabilidade que é resgatar o Vasco para a elite. Teve a dimensão extata de que, a partir de hoje, a história do Vasco ganha nova página.
Seria cômodo para Carlos Alberto ser apenas jogador. Mas ele se tornou mais. Enquanto caminha pelo clube, a funcionária Xuxa, da limpeza, o abraça e canta a música que fez para ele. Carlos Alberto ouve com paciência e sorriso no rosto. Mais tarde, Paulo Roberto, sapateiro do departamento de futebol e também mestre-sala no Carnaval, o leva para ver um troféu que ganhou na Avenida e doou ao clube. Um faxineiro pede uma foto, um torcedor um autógrafo, um aceno. Todos são atendidos.
- Às vezes passo o dia no Vasco. Aqui me sinto bem. Poderia até ir em casa entre uma sessão de tratamento e outra. Mas amoço aqui, curto o clube. E não me permito ser mal-humorado com o torcedor. Quem está mal-humorado é melhor não sair de casa - diz o meia, que evita até falar numa eventual volta para a Alemanha no meio do ano.
- Vou ficar. Não tenho dívida com eles. só comigo mesmo. A Série B é um desafigo, muita gente não quis assumir e isso me despertou. Que monstro é esse? Aqui é Vasco. É grande. Tenho coragem para encarar. Se colocar o tamanho da minha motivação. me chamariam de louco. Se o Vasco subir, vou festejar tanto quanto o Mundial que ganhei.
Troféus reforçam vontade de fazer história no clube
Quando entra na escola que funciona em São Januário, passado e presente se misturam na cabeça do jogador, que ensaia uma palestra a um grupo de futuros jogadores:
- Aproveitem a chance de estudar no clube. Eu treinava nas Laranjeiras e pegava um ônibus que só cumpria parte do caminho até minha escola, em Xerém. É difícil conciliar. É importante aprender, ganhar postura, ser educado, saber falar sobre outras coisas. O jogador precisa mostrar à sociedade que não é burro, que pode ser um ser humano completo, mostrar que a classe mudou.
O meia parece solto falando aos jovens. Há uma explicação. Carlos Alberto passou a ser requisitado, ainda que esporadicamente, para palestrar motivacionais em empresas:
- Recorro à minha história e adapto às necessidades daqueles profissionais.
Na escola, ele vê o jovem lateral Valton, de 14 anos, que aos 12 deixou o interior do Maranhão para morar em São Januário. Por uma semana, chorou de saudade. A história toca Carlos Alberto. O contato com o ídolo deixa Valton paralisado.
Seguindo a caminhada, o destino é a sala de troféus.
- Este é o único que não tenho. A final foi contra o Barcelona de Guayaquil, né? - fala, ao ver a Libertadores de 98.
- Estes dois eu vi - diz, diante das taças dos Brasileiros de 1997 e 2000.
Ele olha para o fundo da sala e vê um enorme corredor repleto de medalhas e taças. Ali se conta uma história gloriosa.
- Sempre que passou na porta, dou uma olhada. Mas achava que isso era espelho. É muita conquista. Este clube é muito grande - diz, admirado.
- Todo jogador deveria conhecer a história doclube. Istro mostra o tamanho da nossa empreitada, a responsabilidade. Crianças, torcedores, ex-jogadores, muita gente está envolvida. Se a gnete colocar o Vasco na Série A, vou poder pisar aqui, no futuro, e saber que fui importante em um momento da história do Vasco.
Para quem duvida da forma como Carlos Alberto encara a missão de liderar a Série B, basta dizer que a competição entrou para uma lista muito especial.
- Tenho um caderninho de objetivos. O que consigo, vou riscando: subir para o profissional, ajudar minha família, ser pai. Não parece, mas casar na igreja também era um sonho. Queria ver meus pais acompanhando minhas realizações e consegui. E tinha conquistas no futebol também no meu caderno. Agora, tive que colocar a Série B, claro. Quando euganhar um desse aqui (aponta para a taça da Libertadores) ou uma Copa do Mundo, estará bom - diz.
Saindo da sala de troféus, Carlos Alberto vê o busto do navegador Vasco da Gama:
- Esse é o Vasco da Gama? - pergunta, querendo saber por que o clube tem o nome do navegador.
Carlos Alberto sabe das origens lusitanas do clube e ouve que, em 1898, ano da fundação, comemorava-se o quarto centenário da descoberta do caminho marítimo para as Índias, obra do navegador. E observa:
- O Vasco não é mais somente da colònia portuguesa. É nacional, popular. É bom fazer parte disso. Temos que manter esta grandeza, ter compromisso e sentimento por quem faz sacrifício para comprar um ingresso.
Fonte: O Globo