|
NETVASCO - 29/11/2008 - SÁB - 01:53 - Em entrevista, Eurico não poupa críticas à administração Dinamite O escritório de Eurico Miranda é bem diferente do seu gabinete no Vasco, mas o escudo cruzmaltino ainda está ao seu lado. Há quase cinco meses afastado do poder, pouca coisa mudou no ex-presidente. Ele ainda mantém seu carinho pelo clube do coração e sua língua afiada, sempre pronta para defender os interesses cruzmaltinos. Nitidamente magoado com todos os problemas que o Gigante da Colina tem enfrentado no Campeonato Brasileiro, Eurico conversou com a reportagem do JORNAL DOS SPORTS. Num desabafo, ele confessou que vem tentando aproveitar a família desde que deixou a presidência, mas os vascaínos não deixam.
"Se estou lhe dando esta entrevista, é porque não consigo deixar o Vasco para trás, é porque me preocupo com tudo que está acontecendo com o clube", garantiu Eurico Miranda. Na entrevista, ele reforçou a promessa de "acabar com a vida política de Roberto Dinamite" caso o Vasco seja mais rebaixado, além de alertar aos vascaínos que protestem contra a atual situação do Gigante da Colina.
JORNAL DOS SPORTS: Eurico Miranda, qual é o seu sentimento ao ver tudo que vem acontecendo ao Vasco nas últimas semanas?
Eu acho que isso tudo é uma crônica anunciada. Tudo que está acontecendo estava previsto por todas as trapalhadas cometidas. Eu acho que há uma seqüência de erros que podem ser fruto da inexperiência, ou da incompetência, ou da negligência. Especificamente em relação ao meu sentimento, essa humilhação pela qual o Vasco está passando me atinge diretamente, principalmente o que me assola agora é uma sensação de impotência. Quando você vê aquilo pelo qual eu lutei a minha vida toda, que é um Vasco independente, que sempre teve uma posição de vanguarda, e agora vejo o Vasco se tornar subserviente. Dói muito.
O senhor se refere ao episódio da partida contra o São Paulo, em São Januário?
Sim. Uma pessoa vai à sua casa, mete os pés em cima da mesa, e você diz que não é uma atitude correta. E isso fica por isso mesmo, a pessoa continua com os pés em cima da mesa? O Dinamite diz que houve um acordo, mas eles arrombaram o vestiário e foram para o campo! E ninguém impediu isso? O técnico do São Paulo disse tinha muita gente no campo de São Januário, e, por isso, impedem as crianças de entrarem no campo porque alguém de fora falou? Será que não lembram do que acontece no Morumbi, a quantidade de crianças que entram lá? Eles proíbem a torcida do Vasco de entrar com uma faixa, com uma bandeira. Quantas vezes isso já aconteceu? E qual foi a reação dele? Isso faz com que você entre em campo perdendo, porque isso tudo, parece que não, mas passa para os jogadores adversários e para os seus próprios atletas. Você começa a perder dentro de campo. O jogador pensa que "lá no Morumbi eu não posso aquecer dentro de campo, mas aqui eles podem". Se eu estivesse naquele jogo contra o São Paulo, você não tenha dúvida que eu tinha invadido o campo e aquele pessoal iria voltar. Porque eu achei uma humilhação o que fizeram com o Vasco. É doloroso, humilhante ver isso.
Desde que as eleições se concretizaram, o senhor tem dito que o que vem ocorrendo ao Vasco é uma série de ofensas ao estatuto do clube. De que forma eles têm desrespeitado essas regras?
Eles atropelaram o estatuto do Vasco o tempo todo, tanto nas eleições quanto agora. A verdade é que não houve qualquer eleição no Vasco. O Conselho de Beneméritos já tinha decidido que não aceitaríamos um processo eleitoral através de influência externa. O Vasco teria que resolver qualquer problema internamente. Foi uma decisão externa, nós não a aceitamos e aquilo se tornou uma eleição de uma chapa só. Nem quem apoiava a chapa rival (Chapa Azul) apareceu lá. Ainda tem o caso do Luiz Américo, que se diz transparente! Não há um escritório de advocacia no Rio de Janeiro que tenha um partido de R$55 mil por mês. Aquele é um escritório particular do próprio vice-jurídico do clube, isso não pode, vai contra as regras do estatuto. Ele diz que é um cargo de confiança, que não integra poderes no clube. Como o vice-presidente jurídico não integra poderes? Ele está na diretoria administrativa, está na diretoria do clube. Agora ele quer mascarar isso qualificando como cargo de confiança. Que cargo de confiança? Ele ainda deu uma desculpa esfarrapada de que se demitiu do conselho. Não existe demissão do conselho, existe renúncia. Ele não poderia estar recebendo pelos serviços ao clube. Nas eleições, fizeram o Benjamim Nazário votar como benemérito sem ele ser, e ainda lhe deram posse de vice-presidente de finanças. Ele não poderia estar ali. Então ele tomou posse e quando descobriram, ele desapareceu do Vasco. O que mais me revolta é que isso tudo está acontecendo e os vascaínos de responsabilidade, os grandes vascaínos, não estão fazendo nada.
Estes desrespeitos ao estatuto do clube também têm relação com uma falta de respeito com a história e a imagem do próprio clube?
Essa mudança da camisa é algo criminoso, o estatuto é claro. Não é só criminoso, é uma verdadeira sacanagem! Há um custo para colocar as estrelas na camisa, é um custo elevado. Eles mudaram de lugar para baixar o custo. A faixa do Vasco também tem um custo. É muito mais fácil você ter um tecido todo desenhado em duas cores do que você fazer uma faixa. Começa pelo custo quando eles querem mudar, e ninguém vê isso. Também é um desrespeito à história do Vasco. O clube recebeu esse nome em homenagem aos 400 anos da descoberta do caminho para as Índias, feita pelo navegador Vasco da Gama. O uniforme oficial original, o preto com faixa branca, não tem relação alguma com o River Plate, como andam dizendo. A cor preta representa a ignorância do oriente em relação a Cristo, a faixa branca é a sabedoria que as caravelas, que tinham a cruz de malta nas velas, levaram para lá. O raio de luz do conhecimento cortando o escuro da ignorância, é isso que quer dizer. Se tirarem a nossa faixa, será apagar parte da nossa história! E ainda tem a questão da religião. O Vasco é um clube aberto a todas as crenças, a todas as raças. O Vasco nunca teve discriminação alguma, mas tem a sua tradição, que é a de um clube católico, tanto que há uma igreja católica dentro de São Januário. Isso é claro, não impede que você tenha evangélicos, judeus, budistas, mas que o Vasco é católico, ele é! Se tiver qualquer tipo de manifestação, até evangélica, não tem problema. Mas por que agredir a tradição do Vasco? Porque logo de cara levar pastores evangélicos para benzer o gol do Vasco. Por que isso? Para que esse tipo de agressão? Por que essa demonstração de querer mudar tudo?
Somado a estes desrespeitos ao estatuto, o senhor acredita que houve despreparo por parte da diretoria ao assumir o cargo?
O Roberto Dinamite não tem qualquer experiência administrativa, nunca passou pelo departamento de futebol de clube algum. A experiência administrativa dele era nenhuma no Vasco, e nenhuma fora do Vasco. Aqueles que tinham alguma experiência fora do Vasco e para lá foram não conheciam nada do clube. E eles assumiram com alguns que só foram para lá para resolver seus problemas de ordem pessoal, que foram buscar um emprego no clube. Conheço aquelas pessoas que chegaram ao poder com o Roberto. Muitos dos que falaram que dariam apoio a ele não são de trabalhar, de estar à frente. São pessoas que gostam de mandar por fora, de palpitar. A verdade é a seguinte: ninguém pode tentar assumir o poder de uma instituição sem preparo. Estão fazendo oposição há oito anos e chegaram sem nada! O objetivo deles não era transformar nada, e sim tirar o Eurico de lá, o que ia acontecer naturalmente. Agora eles querem apagar qualquer coisa que tenha ligação com o Eurico.
Esse tipo de atitude também se estendeu aos funcionários que eram ligados ao senhor, tanto que alguns deles foram demitidos sem explicação. Qual é a sua opinião sobre isso e de que forma isso afetou diretamente o futebol do Vasco?
Demitiram todo mundo da estrutura administrativa do Vasco, e sem pagar um centavo a funcionários que tinham décadas de serviços prestados! E fizeram isso para contratar funcionários sem conhecimento do Vasco num custo muito mais elevado do que aquele que é representado pelo estrutura administrativa que o clube tinha. Roberto colocou gente ligada a ele, num nepotismo brutal. São pessoas que trabalham com ele na assembléia, genros, namorados de filhas, parentes e tudo mais, só gente dele. Ele está transformando o Vasco no gabinete dele, no qual ele nomeava. Como ele não pode nomear ninguém no gabinete porque acabou essa história de nepotismo, ele nomeia no Vasco. Então, não suficiente, acabaram com a estrutura administrativa do futebol. Demitiram todos, começando pelo Paulo Angioni. Mandaram o departamento médico todo embora. Trouxeram novos profissionais, colocaram um vice-presidente que não tinha a mínima condição de assumir o futebol. Não satisfeitos, contrataram o Tita, um treinador que, além de técnico, era empresário de jogador, e trouxe aqueles jogadores com ele. Daí para frente, foi uma derrocada geral. Se instalou uma instabilidade enorme do Vasco, ninguém sabia o que aconteceria no dia seguinte, se iriam receber ou não. Futebol não é só um jogador, é todo a infra-estrutura, o apoio. Quando o pessoal do apoio começa a ter dificuldade até de alimentar a sua própria família, o reflexo é imediato. Eles conversam com os jogadores, que também recebem atrasado. Aí um conta a história para o outro sobre a situação e aí se cria uma insegurança absoluta, que é refletida dentro de campo.
Quando Dinamite assumiu, alguns treinadores da base confessaram que temiam pelo futuro dentro do clube. Alguns deles não sabiam se continuariam ou não no cargo e, no final, todos foram demitidos. Como o senhor vê o que tem acontecido nas categorias de base do Vasco?
O juvenil do Vasco foi campeão brasileiro esse ano, mas na decisão do Carioca não ganhou uma partida das sete que disputou. Eles mandaram todos os treinadores embora. Por que isso?
Todas essas atitudes, na sua opinião, tiram a credibilidade do Vasco como clube?
Eles sempre disseram que iriam trazer a credibilidade de volta para o Vasco, mas o que mais tínhamos era credibilidade no futebol. Eles atrasaram o salário dos jogadores e disseram para eles que não tinham dinheiro. Não se pode fazer isso, os jogadores têm contrato. Você pode falar para eles que não tem o dinheiro no momento, mas vai arranjar. Agora, falar que não tem dinheiro para pagar? Isso é um absurdo! Outro exemplo é o da Rebook, o que fizeram com a empresa. Quando recebi a proposta da Champs, eu fui correto e mandei eles procurarem a Rebook. Caso ela não tivesse interesse em renovar, aí sim eu analisaria a Champs. Há uma multa contratual, o direito de preferência. Tudo isso está assegurado no contrato. Não posso falar uma linha do meu relacionamento com a Rebook, só posso elogiá-los. Hoje você vai em Nova Iorque e vê uma camisa do Vasco, em Londres também. É uma empresa internacional, mas essa agora não tem condição de fazer isso. E eles não pensam em nada na hora de fazer esse contrato. Estão querendo fazer um modelo popular do uniforme, de R$40, mas esquecem que, assim, você precisaria vender quatro camisas para conseguir os royalties equivalentes aos que recebemos pelo oficial, que custa R$150. Só divulguei a proposta de dinheiro da Champs porque sei que alguém está levando por fora, não tenha dúvida disso!
Quais são as perspectivas do senhor quando o assunto é o rebaixamento do Vasco?
No futebol, tudo pode acontecer. Mas a maneira como eles estão levando as coisas me deixa desacreditado. O time foi deixado em nono lugar, empatado com o oitavo, e, ao assumir, disseram o seguinte: é um time fraco, é um time medíocre. Tiraram a auto-estima dos jogadores e contrataram nove atletas que não valiam um. E ainda mandaram embora o Morais, o Pablo, o Jean. Se você comparar os três que eles mandaram embora e esses nova que eles contrataram, você pode ver a enorme diferença em termos de futebol. Depois, tentaram consertar e trouxeram o Renato já para isso, para recuperar a auto-estima dos jogadores. Ainda demonstraram o que já se dizia antes: o Brasileiro é um campeonato nivelado. O time do Vasco, mesmo com essa campanha fraca, tem um elenco tão qualificado quanto vários rivais que estão bem acima da tabela. O Dinamite e sua diretoria acharam que, mesmo com toda a incompetência deles, que tudo se resolveria sozinho, que o Vasco se salvaria sozinho.
Muito se fala que uma queda para a Série B não seria o fim do mundo para o Vasco, e que outros clubes grandes já passaram por isso e voltaram. No caso do rebaixamento, que conseqüências teríamos para o clube?
Eles não fazem conta, eles iludem o torcedor falando que vão trazer os patrocinadores, mas se esquecem que todo patrocínio que possa haver é infinitamente inferior ao efeito de ir para a Segunda Divisão. De imediato, o Vasco perderia 50% das cotas para TV, o que representa mais de R$15 milhões! E fora o que você tem de desvalorização da marca. Nenhum clube tem a história do Vasco. Nós viemos da segunda divisão, mas para lá nunca mais voltamos. Os outros clubes nasceram na primeira divisão, mas já transitaram para a segunda. Nós nunca fomos para lá! E como fica o torcedor? O torcedor vive em função da rivalidade. Rivalidade no bom sentido, nada a ver com violência, é algo que sempre estimulei. A rivalidade é algo que você tem no dia-a-dia do torcedor, no trabalho, no lazer, em casa. É você poder dizer que o meu time ganhou, o meu é melhor. Todos os rivais torcem para que nós sejamos rebaixados, o que é natural. E os flamenguistas vão poder jogar na cara do Vasco que nunca caíram, que são os únicos do Rio que não foram rebaixados. Não existe nada que possa ser comparado ao rebaixamento. Digo e reafirmo: vou acabar com a vida política dele. Mas ela vai se acabar sozinha, naturalmente, mas eu vou ajudar. Farei de tudo para isso.
Durante anos o senhor se entregou ao Vasco, dedicando a vida ao clube. Qual é a sua sensação de ver essa nova gestão falando de um "novo Vasco", criticando a gestão anterior?
Eles não chegaram ao poder para reestruturar o Vasco, e sim para tirar o Eurico de lá, como eu já disse. Mas eles nunca vão me apagar do clube, e a história vai registrar isso. Tenho inúmeros títulos de benemerência isolados, todos por serviços prestados ao clube. E eles mentem ao tentar justificar a incompetência associando seus erros à gestão anterior. Eles dizem que chegaram ao clube com o caixa zerado. Eles mentem! Fisicamente, qualquer caixa é zerado. Ninguém em sã consciência poderia assumir um caixa cheio com inúmeras obrigações a pagar. É lógico que você não vai encontrar isso em lugar nenhum do futebol. E eu ainda deixei a venda do Phillipe Coutinho concretizada, por R$10 milhões reais, mais um contrato de TV de três anos que permitia a negociação dos recebíveis. E eles não têm qualquer justificativa, porque utilizaram o dinheiro da venda do Phillipe para fazer operações, receberam o suficiente para manter a vida normal do clube. Antes de chegar, ainda deram a garantia de que chegariam com vários investidores e, na verdade, não colocaram um centavo no clube. Eles se utilizaram, até agora, do que tinha antes, do que eu deixei. E o pior, no que tinha, começaram a saquear. Saquearam a principal coisa do patrimônio, que é a marca do Vasco! Eles também falam num suposto mandato de três anos, mas eles estão cumprindo um mandato complementar. No ano que vem, teremos eleições novamente, e o quadro social do Vasco decidirá o seu futuro.
Nessas eleições, o senhor pretende retornar ao Vasco com algum cargo ligado ao futebol?
Na verdade, eu dei muito de mim ao Vasco. Não é intenção minha voltar, mas sim apoiar qualquer tipo de movimento. Eu na linha de frente, nunca me furtaria a ser chamado para exercer alguma função ou ajudar o Vasco. Mas, sinceramente, acho que dei, como presidente, o que eu podia dar. Eu hoje vivo um dilema. Eu não convivi com meus filhos, mas Deus me deu a oportunidade de conviver com os meus netos. Eu não tenho aquilo que muito avô tem, que é o trato direto com o neto. Isso me levou a muitas reflexões, e agora quero curtir um pouco com os meus netos, quero ver eles crescerem, fazer alguma coisa. Mas, ao mesmo tempo, eu fiquei com essa doença, esse vício que é não me desligar do Vasco. É difícil para mim ser abordado na rua, as pessoas olham para mim e dizem “faça alguma coisa, não permita que isso aconteça”. É difícil conviver com esse tipo de coisa. Não consigo tirar isso da minha cabeça. É por isso que estou dando essa entrevista, é por isso que venho essas manifestações. Mas daí para voltar à presidência não.
Como sua família vê esse seu vínculo com o Vasco?
A maioria das pessoas que me cerca são torcedores do Vasco, até na minha família. Meu neto de cinco anos, se escuta gol de qualquer time, sai gritando que foi gol do Vasco (risos). Minha mulher, acho até que por falta de opção, também é Vasco. Eles cobram de mim uma atenção maior a eles, o que não fiz em função da minha dedicação ao clube. Mas acho que eles compreendem, mesmo assim. Eles sabem do meu amor ao clube, e o que ele representa para mim. Talvez com o tempo isso melhore, talvez os anos consigam me desligar mais do Vasco e fazer me dedicar mais a eles, mas no momento está muito difícil.
Como consideração final, o que o senhor vê o futuro do Vasco?
Olha, construir um clube com a estrutura do Vasco é difícil, mas destruir é muito fácil. Agora, reconstruir é mais difícil ainda. Temo muito pelo futuro do Vasco, e espero que os vascaínos façam a coisa certa. Que continuem apoiando o time, como não pode deixar de ser. Mas que protestem, protestem e protestem contra tudo que vem sendo feito lá dentro.
Fonte: Jornal dos Sports
índice | envie por e-mail Anterior: 01:28 - Em nota ao Jornal dos Sports, Vasco nega 'mala branca' ao Botafogo Próxima: 03:46 - Vice-jurídico Luiz Américo pode deixar cargo nos próximo dias |
|