. |
|
NETVASCO - 14/03/2008 - SEX - 13:44 - Friaça, único titular de 1948 ainda vivo, mora em Porciúncula (RJ) (Nota da NETVASCO: Matéria publicada em 17/10/2007) O homem que fez o único gol do Brasil em uma final de Copa do Mundo no Maracanã - e que quase virou herói nacional por causa disso - mal sabe que a seleção voltará ao estádio nesta quarta-feira para enfrentar o Equador, pelas eliminatórias, ou que a decisão de 2014 poderá ser novamente lá. Aos 83 anos, Albino Friaça Cardoso, titular na derrota por 2 a 1 para o Uruguai em 1950, tem o pensamento distante, abatido por um recente AVC (acidente vascular cerebral). Ele repousa na pacata Porciúncula, divisa do Rio de Janeiro com Minas Gerais, sob uma redoma familiar. Na cidade onde nasceu, é uma celebridade: dá nome ao estádio e à maior loja, foi enredo de escola de samba e é personagem de “causos” de cada um dos cerca de 20 mil moradores. Do time do Maracanazo, apenas ele e Juvenal estão vivos. Como toda aquela geração, virou vilão, foi criticado, escorraçado. Hoje, 57 anos depois, seus olhos funcionam mal, a mão se ergue devagar. Quase sem lucidez, Friaça não se recorda mais das histórias que costumava contar aos amigos na praça. Mas nas histórias deles... é sempre protagonista. - Ele sempre aparecia com um relógio diferente, comprado em algum lugar do mundo. A gente perguntava por que não mostrava todos logo, mas ele respondia: “Tem que ser um de cada vez!” – diz, às gargalhadas, o jovem Samir Soares, nascido na cidade e acostumado a ver o ídolo conversando nos bares. - Friaça trazia sempre os jogadores daquela época aqui para Porciúncula. Jair (da Rosa Pinto), Ademir (Menezes), Ipojucan... Joguei com eles todos. O Biguá (ex-Flamengo) e o Lafaiete (ex-Fluminense) chegaram a casar com moças daqui – lembra Osman de Lacerda, o Maninho, amigo de infância e ex-companheiro de peladas no Fluminense de Porciúncula. - Quando alguém pergunta o que é Porciúncula, eu respondo: é a primeira cidade do Rio de Janeiro, a terra do Friaça – diz Jorge Lima, professor de educação física e principal responsável por manter um acervo com fotos históricas do ex-ponta-direita. Ao conversar com o GLOBOESPORTE.COM na casa rosa, número 111 da rua Carlos Pinto Filho, o ex-jogador de Vasco, São Paulo, Ponte Preta e Guarani falou pouco. Sob os cuidados da atenciosa esposa Maria Helena, com quem casou pouco antes da convocação para a Copa de 50, Friaça tomava remédios. Demorou a engolir o comprimido e precisou de um copo d’água, providenciado rapidamente pela companheira. Enquanto isso, ele contava, pausadamente, que havia passado o final de semana em um sítio com a família. Abriu um sorriso quando Lima lhe contou que o Vasco havia vencido o Botafogo por 2 a 1 na véspera, e manteve o bom humor ao ser provocado pelo amigo. Fria, o cara não veio fazer sua barba não? – perguntou Lima. - Não, ele deve ser Flamengo – brincou ao responder, sem esconder seu amor pela Cruz de Malta. - Viu o Vasco ontem? E a seleção (empate em 0 a 0 com a Colômbia)? - Não, estava muito tarde... - Na quarta o Brasil joga de novo no Maracanã. - Ô diacho! – termina, com o sorriso no rosto. Em um bolsa de material esportivo, com o símbolo da CBF, Maria Helena guarda algumas relíquias que poderiam valer milhares de dólares em leilões especializados na Europa. As principais: o casaco da seleção usado na Copa de 50 repleto de medalhas penduradas, o short que Friaça vestiu na final no Maracanã e a faixa de campeão sul-americano invicto de 1948 pelo Vasco. Apesar da derrota para o Uruguai, a casa é decorada com fotos daquela partida e até com um livro de depoimentos dos jogadores que viveram o Maracanazo. Meu pai conversava pouco sobre 50. Ele diz que passou uma semana em choque após a final. Foi um trauma – diz Ronaldo, o filho mais novo. Nascido no dia 20 de outubro de 1924 em Porciúncula, Friaça saiu pela primeira vez da cidade na década de 30 para estudar em Carangola (MG). Ao defender o Ipiranga contra o Vasco em um amistoso no município, em 1937, chamou a atenção do time carioca e foi contratado pelo técnico Ondino Vieira. Ficou um tempo emprestado ao Botafogo e voltou à equipe cruzmaltina em 1945 para formar o “Expresso da Vitória” com craques como Ademir, Danilo, Ipojucan, Eli e Maneca. Quatro anos depois, foi negociado com o São Paulo, pelo qual acabou campeão estadual e artilheiro (24 gols) de 1949 ao lado de Leônidas da Silva. Com bom desempenho por times do Rio e de São Paulo, foi convocado para a seleção brasileira sem entrar na polêmica entre cariocas e paulistas. - Seu melhor amigo no futebol foi Jair da Rosa Pinto. Friaça conta que aprendeu a chutar com ele – diz Maninho. Após pendurar as chuteiras, Friaça voltou a morar em Porciúncula. Na cidade, abriu uma pequena loja de material de construção. - Mas ele nunca teve tino para os negócios. Se chegasse alguém lá para conversar de futebol, ele ficava o dia inteiro nisso – conta o filho caçula, que transformou a lojinha na maior da cidade: a "Friaça Center", localizada quase em frente à casa do ex-ponta-direita e que já tem filiais em Campos e Itaperuna. O futebol nunca saiu de sua vida. Depois de levar craques do passado para jogar em Porciúncula, Friaça virou técnico do Porciunculense (ex-Fluminense) nos anos 70 e 80. - Ele era a atração do time. O pessoal ia aos jogos para vê-lo – lembra Lima, que era meio-campista da equipe. Até hoje, Friaça é a atração de Porciúncula. Pois ela é a “terra do Friaça”, que nunca deixou de tratar um dos “vilões de 50” como herói. - Para os brasileiros, o jogo com o Uruguai seria fácil demais. Todos davam como certo o título. O Friaça teve a sorte de fazer o gol, mas depois o time não soube segurar. Ele contava que os uruguaios cuspiam nos brasileiros, xingavam. A derrota o atingiu sim, a quem não atingiria? A gente costumava implicar com ele, provocá-lo sobre 50, mas ele nem ligava mais - recorda o velho amigo Maninho. Para Friaça, Porciúncula ainda liga. E muito. Durante a passagem do GLOBOESPORTE.COM pela cidade, uma pergunta era freqüente à equipe: - Viu o Friaça? Ele está bem? Em Porciúncula, ele sempre está bem. Pelo Vasco, Friaça coleciona conquistas Ao lado de craques como Jair e Ademir, ponta-direita formou o Expresso da Vitória A torcida cruzmaltina canta a plenos pulmões em São Januário: "Vasco, tua glória é tua história, é relembrar o Expresso da Vitória". Um dos ídolos quase caiu no esquecimento por causa da derrota do Brasil para o Uruguai em 1950: Friaça. Ao lado de Maneca, Jair, Rosa e Chico, o ponta-direita fez sucesso pela equipe carioca e conquistou o título invicto do Sul-Americano de 1948. A história de Friaça no Vasco começou em 1943. O ex-jogador defendeu o Ipiranga, de Carangola (MG), em um amistoso com os vascaínos e se destacou, sendo contratado pelo técnico Ondino Vieira. Após empréstimo ao Botafogo, voltou ao Vasco para integrar o Expresso da Vitória e começar uma seqüência de conquistas: campeão carioca invicto de 1945, do Torneio Municipal de 1946, carioca invicto e do Torneio Municipal de 1947, e sul-americano invicto de 1948. Em 1949, o atacante trocou o Vasco pelo São Paulo. E já chegou arrebentando: campeão invicto paulista e artilheiro do Estadual (24 gols), em um time que ainda contava com Leônidas da Silva. Ele era habilidoso, rápido e bom chutador. Chutava muito bem mesmo. Não chamava atenção pela técnica, mas era um jogador interessante. Eu gostava muito dele - analisa Evaristo de Macedo, que, pelo Flamengo, chegou a enfrentar Friaça nos anos 50. Na Copa do Mundo de 1950, a rivalidade entre cariocas e paulistas afetou pouco Friaça. Por ter feito parte do Expresso da Vitória - base da seleção - e artilheiro pelo São Paulo, o ponta não gerava reclamações de nenhum lado. Mas não era titular. O jogador só conseguiu vaga na equipe para disputar a final com o Uruguai porque Maneca se machucou. Friaça entrou contra a Espanha (vitória por 6 a 1) e contra o Uruguai, fazendo o único gol do Brasil em uma final de Mundial no Maracanã (derrota de 2 a 1). - Friaça virou ponta na seleção, com o Flávio Costa. Ele jogava também de centroavante. Mas era um ponta clássico, ia bem ao fundo, cruzava e arriscava chutes a gol, pois batia bem na bola - conclui Evaristo. Em 1953, o ex-ponta foi um dos primeiros jogadores a encarar a rivalidade de Campinas e trocou a Ponte Preta pelo Guarani, no qual trabalhou também como técnico das categorias de base. 'Estátua no Maracanã poderia ser do Friaça' Filho conta como pai superou trauma de 1950 e revela outro drama: a morte de um irmão “Se o Brasil tivesse sido campeão, a estátua no Maracanã poderia ser do meu pai”. A declaração de Ronaldo, filho mais novo de Friaça, autor do gol da seleção na derrota por 2 a 1 para o Uruguai na final da Copa do Mundo de 1950, é um bom exemplo de como a história do futebol brasileiro poderia ter sido diferente caso o resultado fosse o inverso. Mas o time não venceu no Maracanã. E os jogadores daquela geração ficaram marcados para sempre. - Sei que meu pai ficou esquecido. Aquilo marcou demais. O futebol naquela época era diferente, não tem o que vemos hoje. O jogador vivia só do esporte e era até malvisto. Mas meu pai sempre teve uma família forte, um apoio incondicional da minha mãe (Maria Helena). Demos total cobertura a ele – diz. Perto do que aconteceu em 1992, o Maracanazo não é nada na vida de Friaça. Quarenta e dois anos depois da derrota para o Uruguai, o ex-jogador perdeu um filho prematuramente. Aos 33 anos, Ricardo sofreu um acidente enquanto praticava vôo-livre em Porciúncula, cidade natal do ex-jogador e sua família. - Aquilo o abalou muito. O Ricardo era jovem, tinha muita vida e era o xodó do Friaça – conta Jorge Lima, um dos amigos mais próximos do ex-ponta. Amigo ajuda a preservar história de Friaça Em Porciúncula, Lima guarda fotos raras e 'causos' do ponta-direita da seleção de 1950 Jorge Lima é uma pessoa humilde. Mora numa pequena casa em Porciúncula, no interior do Rio de Janeiro. Dá valor a fotos com personalidades como Cazuza, Artur da Távola ou Nunes (ex-atacante do Flamengo), que estão penduradas pelas paredes ao lado de pôsteres de esporte. Mas nada tem mais valor na vida deste professor de educação física do que a amizade com Friaça. De cabeça, Lima guarda boas histórias que lhe foram contadas pelo ponta-direita da seleção brasileira na Copa do Mundo de 1950 - algumas delas já foram até escritas por ele no jornal da cidade. Em um acervo no Centro Cultural da Prefeitura, guarda as preciosidades: fotos raras de vários momentos da carreira de Friaça. - Eu não sou muito organizado, mas prometeram me dar um computador para arquivar tudo isso – diz Lima, enquanto procura em pastas espalhadas por sua casa uma imagem de Friaça e Leônidas juntos com a camisa do São Paulo. Em seu arquivo, Lima guarda foto rara de Friaça jogando pelo Vasco em 1947O acervo no Centro Cultural é quase um museu de Friaça. Tem fotos dele em concentrações e jogos da seleção, do Vasco, da Ponte Preta e até do Ituano. Também há o registro da homenagem da escola de samba Unidos da Penha ao ex-jogador no carnaval de 1998: Friaça, com casaco e calça usados na Copa de 50, desfila em cima de um carro alegórico na companhia de duas mulatas. - Friaça fez Porciúncula entrar no circuito do futebol. Ele trouxe muitos jogadores aqui. Tanto que tem até dois irmãos batizados como Eli e Ipojucan, que eram dois companheiros dele de Vasco que vinham sempre na cidade – conta. Em sua casa, Lima guarda com orgulho um quadro com a formação de uma equipe do Fluminense de Porciúncula nos anos 50. Nela estão Friaça, Biguá, Modesto Bria e Cléber (ex-Flamengo) ao lado do seu pai, Alvarino, para uma partida na cidade. Enquanto aguarda a promessa de ganhar um computador, Lima se desdobra em várias atividades. Dá aula de educação física, tem um programa de rádio e já foi secretário municipal de Turismo. Como “guia” do GLOBOESPORTE.COM, aproveitou para homenagear Friaça, chamado carinhosamente por ele por “Fria”, ao vivo na rádio com uma entrevista sobre o porquê da presença da equipe do site em Porciúncula. Na pequena cidade, onde tudo pode ser feito a pé, Lima vai andando e acenando para quase todos que passam. Cobra alguns meninos que faltaram a treinos, indica um restaurante. O amor por Friaça se confunde com o amor por Porciúncula. - Dizem que somos a última cidade do estado. Mas penso o contrário: somos a primeira – diz, como se virasse um mapa ao avesso. FICHA TÉCNICA Nome: Albino Friaça Cardoso Posição: atacante Nascimento: 20/10/1924 Local: Porciúncula (RJ) Clubes: 1943 a 1949 - VASCO 1949 a 1950 - São Paulo-SP 1950 - Ponte Preta-SP 1951 a 1952 - VASCO 1953 - Guarani-SP 1953 a 1954 - VASCO Títulos: 1945 - Torneio Municipal - VASCO 1945 - Campeonato Carioca (Invicto) - VASCO 1946 - Torneio Relâmpago - VASCO 1946 - Torneio Municipal - VASCO 1947 - Torneio Municipal - VASCO 1947 - Campeonato Carioca (Invicto) - VASCO 1948 - Campeonato Sul-Americano - VASCO 1949 - Campeonato Paulista - São Paulo 1952 - Campeonato Carioca - VASCO Desempenho no Vasco (números ainda em verificação): Jogos: 164 Vitórias: 105 Empates: 26 Derrotas: 33 Gols: 108 Média de gols: 0,66 Desempenho na Seleção: 13 jogos, 8 vitórias, 3 empates, 2 derrotas - 1 gol Títulos: Copa Rio Branco (1947, 1950), Taça Oswaldo Cruz (1950) e Campeonato Pan-Americano (1952). Vice-campeão da Copa do Mundo de 1950. GALERIA VÍDEO Pouco antes da Copa do Mundo de 2006, Friaça concedeu uma entrevista ao jornalista Geneton Moraes Neto sobre a Copa do Mundo de 1950. A matéria foi ao ar no programa "Fantástico", da TV Globo. Clique aqui para assisti-la e aqui para ler o que Friaça falou. Fonte: GloboEsporte.com (texto, fotos, vídeo), NETVASCO (ficha) |
NetVasco
| Clube
| Notícias
| Futebol
| Esporte
Amador | História
| Torcidas
Mídia | Interativo | Multimídia | Download | Miscelânea | Especial | Boutique |