Polícia vê indício de fraude em 4 jogos organizados por Roni; 2 deles foram do Vasco
A Polícia Civil do Distrito Federal tem indícios de fraude em ao menos quatro jogos que tiveram os mandos de campo adquiridos pela empresa do ex-jogador Roni, que foi preso no sábado no estádio Mané Garrincha, em Brasília. Os documentos apreendidos ainda vão ser analisados para poder calcular o valor da fraude. O grupo é acusado de informar uma arrecadação menor do que a verdadeira para pagar menos taxas e impostos. Neste momento, a Polícia Civil está tratando os clubes e federações dos times que venderam o mando de campo como vítimas, uma vez que tiveram a arrecadação prejudicada, mas nenhuma linha de investigação está descartada.
Ao todo, sete pessoas tiveram a prisão decretada por 48 horas durante a operação deflagrada enquanto Botafogo e Palmeiras se enfrentavam no Mané Garrincha . Além dessa partida, outras três estão sob suspeita: Vasco x Fluminense, pelo Campeonato Carioca, em 2 de fevereiro, no mesmo estádio; Corinthians x Ferroviário (CE), pela Copa do Brasil, em 7 de fevereiro, no Estádio do Café, em Londrina (PR); e Serra x Vasco, pela Copa do Brasil, em 20 de fevereiro, no Kleber Andrade, em Cariacica (ES). Cerca de outras 20 partidas realizadas desde 2015 também podem ter sido fraudadas.
— Pelo modo como eles atuaram, pelo menos nos quatro jogos realizados este ano há indicativo de fraude — disse o delegado Ricardo Fernandes Gurgel, diretor da Divisão de Repressão aos Crimes contra a Ordem Tributária da Polícia Civil do Distrito Federal.
Havia duas formas de fraude. Uma, divulgando um público menor do que o presente. Outra, comunicando um número maior de ingressos de cortesia do que de fato havia, o que permitia reduzir o valor da arrecadação. Com isso, eram pagas taxas e impostos menores, uma vez que eles são calculados com base na renda do jogo. É o caso de impostos locais, como o ISS, e federais, como o INSS e o imposto de renda de prestadores de serviço - caso, por exemplo, do árbitro.
As empresas de Roni organizavam o jogo e a venda de ingressos, tendo total controle sobre as informações de arrecadação, o que facilitava a fraude.Quanto ao envolvimento de clubes e federações dos times que venderam os jogos, eles são tratados como vítimas por enquanto, mas as investigações ainda estão em andamento.
Em relação às federações das cidades que receberam as partidas, a apuração também prossegue para saber seu real envolvimento. Entre os presos ontem está o presidente da Federação Brasiliense de Futebol (FBF), Daniel Vasconcelos. A própria FBF pode ter sido vítima de seu dirigente, por exemplo. A praxe no Mané Garrincha é que 5% da receita vá para a FBF e 5% para a federação do clube que levou o jogo para o estádio.
— É uma primeira fase. Vamos continuar investigando. Esse é o primeiro cenário. Não analisamos ainda os objetos, foram apreendidas muitas coisas. E vamos ter que analisar para chegar a uma conclusão — disse Ricardo Gurgel, concluindo: — Ainda é muito cedo, muito incipiente para saber quem é vítima. Nenhuma linha de investigação está descartada. Não está descartada a possibilidade de pedir à Justiça a prorrogação das prisões.
Caso isso não ocorra, o prazo de 48 horas para serem soltos termina no fim da tarde de segunda-feira. Além de Roni e Daniel Vasconcelos, foram detidos dois funcionários da empresa do ex-jogador. Entre os sete detidos, seis estavam no estádio e um em casa. Alguns já prestaram depoimento, outros não.
O cartola do DF também foi alvo de prisão em flagrante, porque, mesmo não tendo posse, foi encontrada uma arma na casa dele. Mas o dirigente já pagou a fiança de R$ 10 mil e, assim que acabar o prazo da prisão temporária, poderá ser solto.Também foram cumpridos 19 mandados de busca e apreensão, sendo seis em Brasília, dois em Luziânia (GO), cidade próxima ao Distrito Federal, e 11 em Goiânia.
Computadores e ingressos de papel foram apreendidos. Em alguns casos, a apreensão nem foi necessária, porque a polícia fez o espelhamento dos equipamentos eletrônicos dos investigados. A investigação começou no segundo semestre de 2017, a partir de uma notícia crime feira ao Ministério Público, que a compartilhou com a Polícia Civil.
— No estádio foram apreendidos computadores e HDs com o material da venda de ingresso do estádio, inclusive o banco de dados com as contas do borderô do jogo — disse o delegado Leonardo de Castro, coordenador especial de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado, aos Crimes contra a Administração Pública e aos Crimes contra a Ordem Tributária.
No sábado, foram empregados 150 policiais na operação, chamada "Episkiros", dos quais 50 apenas no Mané Garrincha. O nome é uma referência a um jogo de bola na Grécia antiga que guarda semelhanças com o futebol. A ação da polícia no estádio ocorreu sem chamar a atenção do público, o que foi destacado pelo delegado.
— Desde o início, a intenção da Polícia Civil seria que o sucesso da operação seria não só a prisão de todos os envolvidos e a busca do material de prova, mas também uma operação em que ninguém que estivesse no estádio para assistir ao jogo notasse alguma ação da polícia. Acreditamos que, na medida do possível, conseguimos. Todos os suspeitos foram presos, todas as buscas foram realizadas, e a Polícia Civil não apareceu para quem foi ao estádio ver o jogo — disse Leonardo de Castro.
De acordo com a Polícia Civil, há indícios mais concretos de crimes de estelionato, associação criminosa, falsidade ideológica e sonegação fiscal. Também há possibilidade de ocorrência de lavagem de dinheiro.
— Há indícios (de lavagem de dinheiro), mas está sendo melhor apurado. Há indícios desses quatro (crimes), faltando delinear alguma prova — afirmou o delegado Ricardo Gurgel.
Há dois jogos programados no Mané Garrincha em junho com potencial para atrair grande público. Um deles é o amistoso entre Brasil e Qatar, no dia 5, mas a Polícia Civil informou que a empresa de Roni não está envolvida na organização. A outra partida é entre CSA e Flamengo pelo Campeonato Brasileiro no dia 12. Segundo a Secretaria de Esporte do DF, essa partida não teve seu mando de campo comprado por Roni. O GLOBO não conseguiu entrar em contato com funcionários da empresa do ex-jogador. Já a FBF informou que, por enquanto, não vai se manifestar.
Fonte: O Globo Online