Vasco e Bangu têm história de pioneirismo na inclusão de negros e pobres no futebol
Uma importante luta histórica une os adversários desta quinta-feira, no Maracanã, na semifinal da Taça Rio. Vasco e Bangu, que completam 100 anos de partida em 2019 - a primeira ocorreu em 15 de junho de 1919, com vitória por 4 a 1 do Bangu -, vão se enfrentar por vaga na final, mas no início de suas caminhadas compartilharam a resistência ao racismo no futebol brasileiro.
O Vasco é o caso mais famoso. Com uma equipe com sete negros e pobres, foi campeão carioca em 1923, causando espanto nos rivais. No ano seguinte, foi criada uma nova federação no Rio de Janeiro, a Amea (Associação Metropolitana de Esportes Athleticos), que convidou o clube para participar da liga, com uma condição: excluir 12 jogadores que foram investigados e acabaram não aprovados, baseando-se no critério do analfabetismo e das condições e natureza de suas profissões.
A resposta do Vasco tornou-se histórica. O clube se recusou a participar da liga e foi jogar outra, com times menores, da qual se sagrou campeão, a Liga Metropolitana de Desportos Terrestres. Em 1925, retornou à disputa com os principais clubes.
- O Vasco foi o primeiro campeão a ter negros no time. Era um clube que não tinha a menor objeção em relação a etnia, religião, condição econômica. Bastava defender a camisa com a intensidade que se espera de um atleta. (Quando veio o convite da Amea), os dirigentes encararam aquilo com ultraje. Os atletas sequer tiveram representação na defesa da investigação – contou João Ernesto Ferreira, vice-presidente de Relações Especializadas do Vasco.
O curioso é que o Bangu fez parte da Amea – e muito provavelmente escalou jogadores negros. Tinha em seu elenco o zagueiro Luiz Antônio, irmão de Domingos da Guia. Mas o clube era um dos fundadores da nova liga e não teve que cumprir qualquer condição para disputá-la, ao contrário do Vasco.
O primeiro jogador negro do futebol brasileiro
O Bangu foi fundado no dia 17 de abril de 1904 por ingleses que trabalhavam na Companhia Progresso Industrial do Brasil, uma fábrica de tecidos do bairro. Logo no ano seguinte, o clube teve o seu primeiro atleta negro: Francisco Carregal, um operário brasileiro.
- Francisco Carregal era brasileiro, filho de pai português e mãe negra brasileira. Ele começou a jogar futebol nas dependências dos jardins da fábrica. Até chegar a fazer parte da equipe principal do Bangu foi um processo natural - contou Clécio Regis, torcedor fanático do Bangu e pesquisador da história do clube.
Muitas referências apontam Francisco Carregal como o primeiro jogador negro do futebol brasileiro. A Ponte Preta também reivindica esse posto, para Miguel do Carmo. Poucos meses depois da entrada de Carregal no time, o Bangu trouxe sem restrições mais jogadores negros.
O clube também aboliu a distinção entre torcedores no estádio - naquela época, o futebol era considerado um esporte da elite, em que pobres e negros não podiam assistir aos jogos nas arquibancadas.
Só que entre 1907 e 1909 o Bangu se afastou da Liga Metropolitana de Football, entidade que na época organizava o Campeonato Carioca, por causa da divergência com os outros clubes em relação ao tratamento com atletas negros. A Liga chegou a publicar uma nota de proibição a "pessoas de cor" de participarem de seus torneios.
- A dificuldade foi grande. A Liga Metropolitana não aceitava jogadores negros em suas competições. O Bangu decidiu então se desfiliar e organizar competições com outras equipes locais, menores. Em solidariedade ao Carregal e outros atletas negros, o Bangu ficou fora da Liga por dois anos - explicou Clécio.
Carregal foi o primeiro de uma série de grandes jogadores negros que defenderam o Bangu, como Zizinho, Marinho, Zozimo e os integrantes da família da Guia (Luiz, Domingos, Ladislau, Médio e Ademir). O Bangu foi campeão carioca da Segunda Divisão em 1911 com quatro negros no time. O primeiro título do Estadual na Primeira Divisão foi em 1933.
Fonte: GloboEsporte.com