Ídolo do Vasco, Geovani vendeu parte de sua coleção de camisas e comprou carro para o filho
Os tempos em que jogadores e roupeiros eram responsáveis pelas vendas de camisas acabaram. Eles até ganham um número bem maior de produtos do que no passado, mas a maioria delas é destinada a presentear amigos e familiares, e não mais obter lucro.
"Era difícil o torcedor ter uma camisa do time. Tinha que ir lá no clube, era um processo muito chato. Como jogador, você só tinha direito a uma camisa por jogo: a do intervalo podia levar, mas a do segundo tempo ficava com os roupeiros. Se você quisesse levar para dar de presente ou trocar com algum adversário tinha que comprar e era descontado do salário", relembra o ex-meia Geovani, que vestiu as cores do Vasco pelo período de 12 temporadas.
Na época da matéria de "Placar", Geovani era dono da camisa mais vendida do Vasco: de sete itens que eram comercializados por mês, cinco eram do "Pequeno Príncipe". Isso significa, em números consolidados, cerca de cem entre 140 camisas que terminavam nas mãos dos torcedores. A quantidade de camisas vendidas do clube aumentou em quase 600 vezes, e o modo de comercialização também.
Quando tudo começou a mudar
Na visão de especialistas em marketing esportivo ouvidos pelo UOL Esporte, o processo começou a mudar a partir da Copa União de 1987, primeiro evento esportivo brasileiro patrocinado pela iniciativa privada, e não mais pelo Governo, por meio da criação do Clube dos 13. Na época, a entidade encabeçada pelos clubes sentou-se à mesa com emissoras de televisão e empresas para poder bancar o Campeonato Brasileiro daquele ano, pois a CBF não tinha recursos em razão de grave crise financeira e institucional que vivia.
Um dos relatos sobre este momento histórico é de uma empresa que procurou o Clube dos 13 para obter liberação dos clubes e fabricar produtos de plástico e adesivos dos mascotes. A empresa ganharia sua parte e ainda repartiria royalties com os clubes. Ao consultar as diretorias, a entidade descobriu duas coisas: a maioria dos clubes não tinha marca registrada, então não havia como licenciar produtos, e muitos usavam personagens como mascotes, como Popeye (Flamengo), Pato Donald (Botafogo) e Super Homem (Bahia), mas sem os direitos de uso. O Clube dos 13 partiu do zero para viabilizar a iniciativa, encomendou desenhos do cartunista Ziraldo dos mascotes de cada clube e por fim conseguiu lançar os produtos no mercado.
Caixinha valiosa
Nos anos 80, as empresas de material esportivo faziam contratos anuais de fornecimento e enviavam remessas periódicas aos clubes. Em alguns clubes era enviada uma cota exclusiva para os jogadores – no Cruzeiro eram seis e no Atlético-MG eram dez camisas por ano, por exemplo. Era o único material oficial não destinado ao uso em partidas. Todo o restante das camisas usadas por torcedores, portanto, era fruto de pirataria.
Essa cota exclusiva aos jogadores por muitas vezes integrava uma "caixinha" organizada pelo elenco: material de jogo, principalmente essas camisas recebidas das empresas, eram reunidas e vendidas a quem se interessasse. Alguns clubes já tinham lojas oficiais em suas sedes, mas o contato direto era a maior fonte de negócio.
As antigas ainda têm seu valor
Apesar do valor exorbitante, hoje é muito mais acessível comprar uma camisa do seu time do coração. A quantidade em abundância dos novos modelos fez os artigos dos anos 80 e 70 se valorizarem ainda mais. O sentimento de saudosismo e paixão pelo símbolo do clube leva torcedores a uma verdadeira garimpagem para achar esses objetos antigos.
Geovani, aquele citado no começo da reportagem como o que mais vendia camisas do Vasco, aproveitou esse fanatismo para fazer a alegria de alguns sortudos torcedores e, de quebra, conseguiu realizar um sonho do filho.
"Meu filho estava precisando comprar um carro em certo momento. Eu recebia muita proposta de colecionador para comprar minhas camisas antigas, que na verdade estavam guardadas, mofando, começando a dar traças. Então eu decidi vender boa parte dessa coleção, paguei o carro e ainda sobrou dinheiro. Foi um bom uso, não?".
Fonte: UOL