Eurico explica onde ficam contabilizadas as mensalidades dos sócios no balanço do Vasco
Eram quase 18h de sexta-feira quando a reportagem do Globo encontrou Eurico Miranda na ante-sala da presidência, sentado à cabeceira, com o tradicional charuto na mão direita, o que dificultou o primeiro aperto de mão. Apesar de ser centralizador confesso, ele não estava sozinho.
Entre dirigentes e assessores que entraram e saíram do local, outras dez pessoas acompanharam e participaram da entrevista, de quase uma hora. Entre eles, nomes como o vice-presidente geral Silvio Godói, o vice-presidente de marketing Marco Antônio Monteiro e o advogado Leonardo Rodrigues.
O motivo imediato do encontro foi o de dar o direito de resposta do presidente a respeito da reportagem do Globo que mostrou que a probabilidade de a urna 7 das eleições ter uma vantagem de mais de 90% dos votos para um candidato em relação ao outro, quando as seis primeiras tiveram resultados muito parelhos, era menor do que ganhar na Mega Sena. A posição dele foi direta, bem ao estilo de Eurico Miranda.
- Esse matemático não entende nada disso. Não foi contratado por mim, deve ter sido contratado por você (respondo que não), ou então por alguém para fazer uma estatística daquela, uma das coisas mais ridículas que eu posso ver.
Respeitada a posição do presidente do Vasco, surgem depois as outras questões. Eurico se mostra muito solícito para responder todas entre uma baforada e outra, que fez com que a sala logo ficasse impregnada pelo cheiro da fumaça do charuto. Desde terça-feira, quando a eleição para presidente do clube foi para a Justiça por causa da lista de sócios suspeitos de irregularidade, que ele vem sendo bombardeado por questionamentos.
Até que, com 34 minutos de entrevista, ele é perguntado a respeito de como aparece a receita de sócios no balanço do Vasco - é justamente a suposta não contabilização financeira da entrada dos novos sócios entre novembro e dezembro de 2015 que a oposição alega ser a prova de que os votos desses associados foram irregulares.
- Eles aparecem no "quadro social", doutor. É só você fazer a conta. São "x" sócios, que pagaram tanto e você vai ver qual é a receita.
As palavras do presidente deram a impressão de que a questão seria mais simples do que foi. Logo em seguida, ao ser perguntado se estariam nesse item "Quadro Social" o dinheiro proveniente tanto dos sócios votantes quanto do sócio torcedor Gigante, o vice de marketing confessou não saber. No Botafogo, por exemplo, o programa movimentou no ano de 2016 inteiro R$ 2,3 milhões e, em 2017, conferindo os valores divulgados mensalmente no site do clube, a receita já passa de R$ 14 milhões.
Em todos os outros grandes clubes do Rio, a receita vem descrita no balanço em rubricas separadas, de fácil identificação, e movimentam receitas da ordem de milhões.
Foi quando a seguinte dúvida foi levantada pela reportagem: se chegou aos cofres do clube o dinheiro dos sócios que entraram em massa em novembro e dezembro de 2015 e em abril de 2016 o Vasco lançou o programa sócio torcedor Gigante, como essas duas novas receitas somadas gerariam um aumento de apenas R$ 1,14 milhão na rubrica "Quadro Social", do balanço de 2015 para o de 2016? Será que, mesmo tendo sido reiniciado apenas em abril de 2016, o programa de sócios havia arrecadado tão pouco assim?
- O Gigante deve estar lançado em outro lugar no balanço, não está no "Quadro Social" - afirma Monteiro, para em seguida ser complementado por Eurico: - O sócio paga à Futebolcard (empresa que gerencia o programa de sócios), que repassa para o clube. Mas isso entra no balanço.
Leonardo Rodrigues ainda comenta que o número "deve estar em alguma conta de fornecedores", mas ainda assim fica combinado que Marco Antônio Monteiro informaria onde está o sócio torcedor do Vasco no balanço do clube. A entrevista acabou 23 minutos depois e, na despedida, já com o charuto na mão esquerda, Eurico Miranda pode apertar a mão na despedida com mais firmeza.
Com o passar do tempo, apesar das tentativas de contato da reportagem, a resposta não veio, e o fato de dez pessoas, entre dirigentes e assessores ,que acompanharam a entrevista, não saberem onde estava o valor do sócio torcedor no balanço do Vasco, incluindo o presidente Eurico Miranda, se transformou em pauta.
Foi quando, quase às 22h, em meio ao ritmo acelerado do fechamento já atrasado da primeira edição do Globo, o telefone tocou. Era Eurico Miranda.
- Olha só, estou ligando não é porque você colocou nenhuma casca de banana não. É para te ajudar.
E então o presidente Eurico Miranda voltou atrás e disse que sim, que o dinheiro referente ao programa de sócio torcedor do Vasco está no item "Quadro Social", junto à receita dos sócios pagantes que tem direito a voto. Didático, foi preciso nos números: dos R$ 5.594.851,00 que constam no balanço de 2016, R$ 2.110.948,50 são referentes ao programa Gigante e R$ 3.483.903,30 são referentes aos sócios pagantes votantes.
Surgiu então a questão: como pode o valor arrecadado com sócios pagantes votantes em 2016, em que já constava os 663 novos associados investigados pela Justiça, ser menor do que o valor declarado em 2015, de R$ 4.459.693,00? Vale lembrar que dois anos atrás não havia arrecadação via programa de sócio torcedor.
Depois de algumas digressões, o presidente Eurico Miranda foi retirado da linha e no lugar dele estava Eurico Brandão, seu filho e vice-presidente de futebol do Vasco, já com o viva-voz ligado, cujas vozes ao fundo foram difíceis de reconhecer.
Já com o fechamento da edição completamente prejudicado, a reportagem foi informada de que, entre 2014 e 2017, houve uma diminuição de três mil sócios votantes pagantes no quadro do clube. De acordo com Euriquinho, apesar dos 663 novos sócios que entraram no clube entre novembro e dezembro de 2015, e que estão sob suspeita, o exercício inteiro de 2015 sofreu uma diminuição no número de associados pagantes votantes em relação a 2016.
Fonte: O Globo Online